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Brasília

10 perguntas sem respostas sobre as falhas de segurança na invasão aos prédios dos Três Poderes

Janelas danificadas no Palácio do Planalto após invasão no domingo (8) (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil)

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Uma sucessão de erros por parte de várias autoridades de segurança, no mínimo, permitiu que manifestantes invadissem e vandalizassem, no último domingo (8), as sedes dos Três Poderes, em Brasília, e causassem destruição. Desde então, ante a iminência da repressão por parte do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), vários órgãos, no âmbito federal e também distrital, têm se mobilizado para elucidar os motivos das falhas – se foram acidentais ou intencionais, se causadas por imprudência, imperícia, negligência ou mesmo de propósito.

Para entender esses fatores, a reportagem listou uma série de perguntas ainda não respondidas totalmente pelos responsáveis por proteger o centro do poder na capital federal, acrescentando as explicações dadas até o momento.

Quem definiu o efetivo de segurança no governo do Distrito Federal?

Um dos motivos mais claros, até o momento, para a inefetividade da contenção era a baixa presença de policiais militares na Esplanada dos Ministérios, para conter a invasão. Barreiras foram colocadas para impedir a chegada de manifestantes à Praça dos Três Poderes, mas em protestos semelhantes no passado, havia um batalhão maior de homens armados e grandes veículos, agrupados nas duas pistas que dão acesso aos edifícios, para confrontar invasores.

Durante o fim de semana, os responsáveis diretos pela gestão de pessoal mobilizado para a proteção eram o delegado Fernando de Sousa Oliveira, então secretário de Segurança Pública interino do Distrito Federal; e o coronel Fábio Augusto Vieira, que era comandante-geral da Polícia Militar do Distrito Federal. Ambos foram afastados dos cargos por Ricardo Capelli, secretário-executivo do Ministério da Justiça, que foi nomeado interventor federal na área de segurança. A suspeita de má alocação de pessoal recai também sobre Anderson Torres, que era o secretário titular, mas estava de férias nos Estados Unidos, embora tivesse assumido o cargo poucos dias antes.

Quem autorizou o então secretário de segurança do DF a viajar aos EUA?

Delegado da Polícia Federal, Anderson Torres assumiu a Secretaria de Segurança do DF no dia 2, mas logo depois tirou férias e viajou para Orlando, nos Estados Unidos – é a mesma cidade onde está desde dezembro o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), do qual era ministro da Justiça. Ao portal UOL, Torres disse que domingo era seu primeiro dia de férias. “Estou com minha família de férias. Primeiro dia de férias. Não encontrei Bolsonaro.”

Durante a tarde, quando invasores já haviam depredado o Congresso, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal, ele informou no Twitter que havia determinado a atuação de “todo efetivo da PM e da Polícia Civil”, “para que se restabeleça a ordem com a máxima urgência”. Pouco depois, ele foi exonerado pelo governador Ibaneis Rocha. Não se sabe se as férias foram concedidas pelo governo distrital ou pela própria PF.

Qual a responsabilidade de Anderson Torres no caso?

Ricardo Capelli, que assumiu o cargo de secretário como interventor, afirmou que “houve uma operação estruturada de sabotagem comandada pelo ex-ministro bolsonarista Anderson Torres”. O interventor informou que, logo após assumir a secretaria, o delegado exonerou todo o comando da área e deixou o país. Foram demitidos o secretário-executivo da pasta, Milton Rodrigues Neves, e o subsecretário de Inteligência, George do Couto.

Com isso, a segurança do DF ficou a cargo do secretário interino Fernando de Sousa Oliveira, que também foi exonerado após a invasão. Nesta terça-feira (10), Alexandre de Moraes mandou a PF prender Anderson Torres e o ex-comandante da PM Fábio Augusto Vieira. Torres disse que vai voltar ao Brasil e se apresentar à Justiça. E Vieira já foi preso pela Polícia Federal.

Por que o governo do DF mudou o esquema de segurança no domingo?

Até o momento, não foram dadas explicações convincentes para a mudança no esquema de segurança, no dia da invasão, que permitiu que os manifestantes entrassem a pé na Esplanada dos Ministérios, acompanhados da própria Polícia Militar do DF, que escoltou o grupo até o local.

Inicialmente, o plano era manter a área isolada com barreiras, já que era sabido que manifestantes iriam ao local e risco de invasão por radicais.

“Infelizmente, houve uma avaliação das autoridades locais de que seria possível na última hora mudar esse planejamento. E esse planejamento foi modificado. E isso ensejou para que essas pessoas descessem a Esplanada e, em seguida, teve o descontrole”, disse o ministro da Justiça, Flávio Dino.

O que o governo federal fez com os alertas de que poderia haver violência?

O ministro da Justiça, Flávio Dino, disse que se reuniu no sábado (7), véspera da invasão, com dirigentes da PF e da Polícia Rodoviária Federal, que o informou que mais de 100 ônibus, com quase 4 mil pessoas, estavam a caminho de Brasília para engrossar o acampamento em frente ao QG do Exército. Nenhuma providência para conter o movimento foi definida.

No mesmo dia, véspera do ato na Esplanada, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que tinha agentes infiltrados no acampamento, disparou alertas para vários órgãos do governo informando sobre o risco iminente de ataques aos prédios públicos da Esplanada.

“Mantêm-se convocações para ações violentas e tentativas de ocupações de prédios públicos, principalmente na Esplanada dos Ministérios”, dizia o documento, revelado pela Folha de S. Paulo. Flávio Dino disse que não poderia ter agido antes das forças locais de segurança. “Fizemos o possível. A esfera federal só age quando a esfera local falha. Cada um tem o seu papel”, disse o ministro em entrevista à imprensa.

O que houve com a tropa do Exército que protege Palácio do Planalto?

A proteção do Palácio do Planalto é feita pelo Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e existe um efetivo próprio de militares designados para a tarefa, do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP). Nenhum deles informou o contingente mobilizado no domingo.

Conhecido como Batalhão Duque de Caxias, o grupo do Exército responsável pela proteção do palácio conta com cerca de mil soldados de infantaria. Geralmente, uma tropa fica posicionada no subsolo do Palácio do Planalto. No domingo, no entanto, parte dela foi vista caminhando em direção à sede da Presidência depois que Lula anunciou a intervenção na segurança do Distrito Federal, no fim da tarde.

O empenho do Exército vem sendo questionado no episódio, especialmente a partir de um vídeo em que um coronel foi flagrado em vídeo tentando impedir a prisão de invasores pela polícia. Dentro do governo, há desconfiança sobre o GSI, pelo temor de que ainda abrigue muitos militares apoiadores de Bolsonaro. Por isso, Lula tirou do órgão a função de sua segurança pessoal, a do vice-presidente, Geraldo Alckmin, e de seus familiares, transferindo-a para uma nova estrutura, chamada Secretaria Extraordinária de Segurança Imediata e comandada por delegados da PF de confiança do presidente e que já o protegiam durante a campanha.

Quem definiu o número de policiais da Força Nacional de Segurança?

Composta por policiais de vários estados requisitados pelo governo federal para situações de emergência, a Força Nacional de Segurança conta com 640 homens. No sábado, véspera da invasão, apenas 140 foram designados pelo ministro Flávio Dino, para reforçar a segurança da Esplanada dos Ministérios; o restante estava em missões em outros estados.

Na segunda (9), Dino admitiu que o número em Brasília era insuficiente, em razão da mudança no esquema de segurança montado pelo governo do Distrito Federal. “Obviamente, era uma atuação insuficiente pela revisão do planejamento do DF. Nós montamos a nossa atuação a partir de uma premissa. Essa premissa foi revista e não havia condições de mobilizar outros contingentes. Esse é o meu limite constitucional”, afirmou. “Se eu soubesse três dias antes que o planejamento era outro, eu teria tomado outras decisões possíveis”.

Por que não houve reforço da Polícia Legislativa do Congresso?

A Polícia Legislativa, subordinada à Presidência do Senado, informou que todo seu efetivo estava a postos dentro do Congresso. Já a Polícia da Câmara diz que tinha 100 agentes no local.

Presidente do Senado em exercício, o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), afirmou que foi procurado, ainda na manhã de domingo, e antes da invasão, por integrantes da Polícia Legislativa, que manifestaram preocupação com manifestantes que chegavam à Esplanada.

Veneziano disse que entrou em contato com o secretário da Casa Civil do Distrito Federal, Gustavo Rocha, que o teria tranquilizado. “Recebi a informação de que não deveríamos nos preocupar, porque a situação estava plenamente sob controle.”

Houve conivência do comando das polícias ou falta de efetivo?

As decisões do ministro Alexandre de Moraes, baseadas em relatórios ainda sigilosos da Polícia Federal, indicam que houve omissão dolosa das autoridades do Distrito Federal, que não teriam mobilizado mais homens diante de um risco anunciado de invasão e vandalismo.

Na tarde de domingo, enquanto manifestantes desciam a Esplanada, em direção à praça dos Três Poderes, guiados e escoltados por policiais militares, o então secretário de Segurança interino, o delegado da PF Fernando Oliveira, mandou um áudio ao então governador Ibaneis Rocha (MDB) para tranquilizá-lo sobre a movimentação na capital.

Pelo WhatsApp, às 13h23, cerca de uma hora antes das invasões, ele enviou a seguinte mensagem a Ibaneis: “Governador, passar um último informe aqui, do meio-dia, para o senhor. Tudo tranquilo, os manifestantes estão descendo lá do SMU [Setor Militar Urbano, onde fica o QG do Exército, em frente ao qual estavam acampados], controlados, escoltados pela polícia. Tivemos uma negociação para eles descerem de forma pacífica, organizada, acompanhada. Toparam, não precisou conter lá em cima”, afirmou.

“Está um clima bem tranquilo, bem ameno, com uma movimentação bem suave e uma manifestação totalmente pacífica. Até agora, nossa inteligência está monitorando e não há nenhum informe de questão de agressividade, ligada a esse tipo de comportamento”, completou, acrescentando que havia mais 150 ônibus no Distrito Federal, “mas todo mundo de forma ordeira e pacífica”.

Logo depois, Ibaneis respondeu escrevendo: “Maravilha”. Às 15h39, quando invasores já quebravam as sedes dos poderes, ele enviou outra mensagem: “Coloca tudo na rua”. Mais tarde, o agora governador afastado pediu desculpas a Lula, e aos presidentes do STF, da Câmara e Senado. “Nós vínhamos monitorando desde a tarde de ontem, juntamente com o ministro Flávio Dino, todos esses movimentos que estavam chegando ao Distrito Federal. Conversamos de ontem para hoje por várias vezes e não acreditávamos em momento nenhum que essas manifestações tomariam as proporções que tomaram”, disse ele, em vídeo divulgado nas redes.

Havia infiltrados que desencadearam os atos de vandalismo?

Diversos vídeos feitos pelos próprios manifestantes apontam supostos intrusos no ato que teriam iniciado as invasões, depredação e violência. Alguns foram denunciados para os policiais no local e foram detidos. A investigação e os depoimentos poderão esclarecer a mando de quem foram ao local e por que agiram de forma criminosa.

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