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Plenário da Câmara dos Deputados
Plenário da Câmara dos Deputados| Foto: Bruno Spada / Câmara dos Deputados

Antes de completar metade do primeiro ano de governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assistirá nesta semana à abertura da temporada de comissões parlamentares de inquérito (CPIs), cada qual capaz de provocar desgastes em diferentes níveis de intensidade para a imagem dele e prejuízos para a evolução de seus projetos.

Para esta quarta-feira (17) estão previstos o início dos trabalhos de três CPIs na Câmara dos Deputados: manipulação de jogos de futebol por apostas eletrônicas, fraude nas Lojas Americanas e atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Também se espera a instalação em paralelo da comissão mista de senadores e deputados (CPMI) para investigar os atos de vandalismo de 8 de janeiro. Confira abaixo mais informações sobre cada uma das CPIs.

Análises de especialistas e políticos consultados pela Gazeta do Povo, aliadas às observações dos líderes parlamentares e ministros responsáveis pela articulação do Planalto no Congresso, indicam a necessidade de esforço considerável para evitar com que as CPI acarretem perda de popularidade e de apoio na base congressual, bem como evitar atrasos ou mesmo derrotas em votações cruciais para o governo.

Durante a reunião do núcleo político do Planalto na segunda-feira (15), Lula mostrou compreender o quadro desfavorável ao governo no Congresso. Ele tomou medidas para conter tumultos causados pela bancada de seu próprio partido na Câmara nas negociações do novo marco fiscal, que é essencial para a continuidade das políticas sociais. O relator do projeto, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), também tem deixado claro que a aprovação da proposta requer o apoio incondicional de toda base governista.

A votação do mecanismo de controle de gastos do governo, agendada para esta semana, é importante para a estabilidade governamental. A reforma tributária também é relevante, embora o seu impacto não seja imediato. A simples menção de avanço na proposta do arcabouço já teve um efeito positivo nesta semana sobre o câmbio e as bolsas.

Maior risco para o Planalto está no atraso de projetos centrais

Luiz Filipe Freitas, analista político da consultoria Consillium, ressalta que as CPIs são sempre prejudiciais para qualquer governo. Quando várias funcionam ao mesmo tempo, o desafio se torna ainda maior. “Além do impacto na reputação, essas comissões consomem tempo precioso, especialmente quando estamos no meio do ano e começam as discussões sobre o Orçamento de 2024”, afirma.

Segundo ele, mesmo a CPMI de 8 de janeiro, que tende a ser mais favorável ao Executivo devido à maioria governista entre seus membros, exigirá energia e articulação, recursos que também estão sendo solicitados em outras frentes no Congresso. Formalmente criada em 26 de abril com a leitura do seu pedido de abertura em sessão do Congresso, a comissão mista não tem prazo para ser instalada, mas deve avançar até o fim de maio.

O senador Espiridião Amin (PP-SC), 75 anos, provável decano entre os membros da CPMI do 8 de janeiro, deverá ser, portanto, o responsável por presidir a primeira sessão do colegiado, na qual serão eleitos o presidente e o relator. Para ele, a tônica das investigações virá de informações prestadas por órgãos federais de inteligência a membros da CPMI. Os esclarecimentos deverão, ressalta ele, jogar luz sobre “omissões criminosas” que resultaram no vandalismo e, assim, identificar “todos os responsáveis”.

Para o cientista político Marcos Deois, a CPMI do dia 8 de janeiro ainda é a maior incógnita das comissões de inquérito a caminho. “Ninguém garante certa previsibilidade. Hás fatos que serão relembrados, novos agentes serão responsabilizados e são esperados desdobramentos contrários e favoráveis ao governo”, avaliou.

Quanto à CPI do MST, ele compartilha da impressão geral de que o colegiado tende a servir de palco para os parlamentares da oposição, “pois irá potencializar narrativas mais extremistas”.

Deois também entende que a CPI das Apostas Esportivas tende a proporcionar uma investigação mais bem escorada em fatos e revelações já feitas. Essa investigação ganhou ainda mais relevância após vir a público um esquema de apostas envolvendo jogadores de futebol, o qual é investigado pelo Ministério Público de Goiás na operação Penalidade Máxima. Atletas de diversos clubes e divisões do futebol brasileiro teriam recebido dinheiro para forçar cartões e cometer pênaltis. “Cada dia que passa, percebemos novo jogador envolvido. Se a CPI fizer bom trabalho, pode até desarticular provável esquema complexo de corrupção no esporte que é paixão nacional, [o futebol]”, destacou.

Desagravo a invasores de terra amplia ruptura com agronegócio

O cientista político José Amorim acredita que as CPIs serão mais um teste para a governabilidade de Lula, sobretudo a do MST, a mais esperada pela oposição no momento, além da CPMI do 8 de janeiro. “Para um governo que está com a popularidade abaixo do esperado, ter que enfrentar CPIs logo no início do mandato é um risco bastante alto”, observa.

Na avaliação dele, um dos indicativos que o governo petista não queria correr esses riscos foi ter acelerado a liberação de recursos represados para emendas parlamentares. Essa reação pode ter sido tardia ou insuficiente. “Ainda que o governo tenha maioria na CPMI e a oposição corra riscos de amargar perdas nela, a chance de haver desgaste para o Planalto segue alta pela simples exposição favorecida pelo colegiado”, disse.

Para a CPI do MST, colegiado dominado pela oposição, Amorim concorda que o grande esforço dos seus membros será mesmo o de constranger o governo. Em resposta prévia, Lula e os seus ministros deram seguidas mostras nos últimos dias de apoio ao movimento de invasores de terras, ampliando o desgaste com o agronegócio. “Além dos riscos à imagem do governo, é possível que as CPIs atrapalhem a agenda legislativa, incluindo o marco fiscal e a reforma tributária”, complementa.

O governo, contudo, tem usado a estratégia de desdenhar de todas as CPIs, inclusive a dos sem-terra. “Os que imaginam que essa CPI vai ser um espaço para atingir o MST vão dar um tiro no pé", disse o ministro de Comunicação Social, Paulo Pimenta, no último domingo (14), em feira de integrantes do movimento.

As negociações na Câmara, sob a articulação de Arthur Lira (PP-AL), são um teste importante para as novas relações de poder entre o Executivo e o Legislativo, enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) continua tendo papel relevante na resolução de impasses entre os poderes.

Lira reiterou em entrevistas na segunda-feira (15) que o governo Lula “precisa descentralizar, confiar e delegar poder para melhorar sua articulação política”. No entanto, analistas ressaltam que a gestão ainda é fortemente influenciado pelo PT, que detém os principais cargos de articulação, e parece relutante em ceder posições a outros partidos.

O que deve ser investigado em cada CPI?

CPI das Lojas Americanas

A CPI das Lojas Americanas foi solicitada pelo líder do PP na Câmara, André Fufuca (MA), com o objetivo de investigar as discrepâncias contábeis registradas pela varejista, que resultaram em um rombo bilionário.

O autor do requerimento, que aspira a presidência da comissão, enfatiza a necessidade de esclarecer as circunstâncias das chamadas inconsistências fiscais e informar a população sobre a real situação da empresa, especialmente os investidores do mercado acionário.

Como ocorre com outras CPIs, espera-se que os dois maiores blocos partidários da Casa ocupem a maioria das 34 vagas no colegiado.

CPI das Apostas Esportivas

Autorizada em 26 de abril, a CPI das Apostas Esportivas foi iniciada por meio do requerimento do deputado Felipe Carreras (PSB-PE), membro da base governista. Composta por 34 membros titulares, a comissão tem como objetivo investigar a manipulação de resultados no futebol brasileiro, conforme denúncias surgidas a partir das investigações conduzidas pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO) no âmbito da operação Penalidade Máxima.

Inicialmente, o MP-GO investigou a manipulação de três jogos da última rodada da Série B em 2022, mas as revelações da segunda fase da operação já chegaram a atletas da Série A do futebol brasileiro. Além disso, a CPI também buscará pressionar pela regulamentação do setor.

O deputado Felipe Carreras, autor do requerimento, será o relator da comissão, e a presidência ficará a cargo de André Figueiredo (PDT-CE). Entre os membros esperados, destacam-se parlamentares ligados ao esporte, como Bandeira de Mello (PSB-RJ), ex-presidente do Flamengo, e o ex-jogador de vôlei Maurício de Souza (PL-MG).

CPI do MST

Proposta em março pelo deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS), a CPI do MST tem como objetivo investigar as atividades do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nos primeiros meses de 2023, visando identificar seu verdadeiro propósito e seus financiadores.

A comissão será composta por 27 membros titulares, incluindo parlamentares ligados ao agronegócio, como Alceu Moreira (MDB-RS) e Júlia Zanatta (PL-SC). Zucco, como autor da proposta, espera ocupar a presidência dos trabalhos, enquanto a relatoria deverá ficar a cargo do deputado Ricardo Salles (PL-SP).

CPMI do 8 de janeiro

Além das CPIs na Câmara, foi proposta uma CPMI composta por deputados e senadores para investigar os atos de vandalismo ocorridos em 8 de janeiro. Essa iniciativa foi proposta pelo deputado de oposição André Fernandes (PL-CE) e enfrentou forte resistência do governo e do presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para ser instalada.

No entanto, após a divulgação de imagens da invasão do Planalto, que contaram com a presença do então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Marco Gonçalves Dias, os parlamentares da base do governo passaram a apoiar a CPMI. O requerimento foi aprovado em 26 de abril durante uma sessão do Congresso.

A oposição, que é minoria, indicou nomes como os senadores Eduardo Girão (Novo-CE) e Magno Malta (PL-ES), além do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ). Já os representantes do governo são liderados pelos deputados Rogério Correia (PT-MG) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ), bem como pelos senadores Fabiano Contarato (PT-ES) e Rogério Carvalho (PT-SE).

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