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Bolsonaro - 7 de setembro - Alexandre de Moraes
Presidente Jair Bolsonaro em discurso em Brasília, na Esplanada dos Ministérios, durante as comemorações pelo Dia da Independência| Foto: Alan Santos/PR

O presidente Jair Bolsonaro entende que a "fotografia" das manifestações pró-governo de 7 de setembro são uma demonstração de força política e eleitoral em uma disputa entre poderes da qual ele foi o vencedor. É a análise que faz o próprio presidente da República, interlocutores do Palácio do Planalto e aliados pró-Bolsonaro do Congresso.

"A avaliação é de que fomos vitoriosos, porque foi um público recorde em todos os lugares", afirma à Gazeta do Povo o deputado federal Márcio Labre (PSL-RJ), que esteve com Bolsonaro na Avenida Paulista no palanque do movimento Nas Ruas, o principal organizador dos atos de 7 de setembro no país.

A despeito das críticas e ameaças de abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro, a leitura feita pelo governo é de que as ruas deram ao presidente da República a musculatura política para se blindar de um impeachment e força eleitoral para cravar um dos lugares no segundo turno das eleições de 2022.

Das manifestações de 7 de setembro, Bolsonaro traça como próximo passo a convocação do Conselho da República, que ele citou em seu discurso em Brasília, mas foi interpretado pela maioria na política e em seu governo como uma convocação do Conselho de Governo, que é feito junto com ministros de Estado e tem caráter consultivo para o debate de ações do governo federal. A reunião ocorreu nesta quarta-feira (8).

A reunião do Conselho de Governo entre Bolsonaro e seus ministros, que não consta na agenda oficial desta quarta, começou por volta das 10h e encerrou em torno das 14h, segundo relataram interlocutores palacianos à reportagem. No encontro, foram discutidos projetos prioritários como o Auxílio Brasil, o novo Bolsa Família, e a PEC dos Precatórios, que pode ser contaminada após os atos de 7 de setembro. As manifestações entraram em discussão, mas não o Conselho da República, que será alvo de conversas futuras.

Qual é a estratégia de Bolsonaro em convocar o Conselho da República

A aposta de Bolsonaro na convocação do Conselho da República como "próximo passo" às manifestações é uma estratégia traçada pelo presidente da República e alguns poucos conselheiros do Planalto. A ideia do governo é propor a convocação como um gesto político ao Congresso e ao STF em busca de uma solução para a crise entre os poderes.

A ideia de convocação do Conselho da República foi dita pelo próprio Bolsonaro a apoiadores e aliados na terça-feira. "Eu ouvi isso ontem do próprio presidente", afirma o deputado Márcio Labre à reportagem. A informação foi confirmada por interlocutores do Planalto.

"O Conselho da República vai, de forma consistente, não deixar dúvidas sobre o cumprimento e esgotamento de todas as etapas e tentativas republicanas constitucionais de solucionar o problema [da crise entre poderes]", destaca Labre. "Se não cumprir essa liturgia, corre o risco de ter uma alegação lá na frente que houve um atropelo", acrescenta o parlamentar.

No ato de 7 de setembro organizado em Brasília, Bolsonaro disse que, na quarta-feira, estaria "no Conselho da República juntamente com ministros" e os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e do STF, ministro Luiz Fux — que, por lei, não poderia integrar —, para mostrar "para onde nós devemos ir".

O atual clima político sugere que, se convocada por Bolsonaro, a reunião nem ocorrerá. Mas Labre sustenta que o presidente insistirá. "Tem toda uma liturgia institucional, que é a convocação e aclamação do Conselho da República. Que façamos ele e, na sequência, como não terá isso, provavelmente, nem a adesão dos outros poderes, aí passaríamos para uma próxima etapa", diz o deputado.

A leitura particular de Labre é que uma "próxima etapa" seria a evocação do artigo 142 da Constituição por Bolsonaro para que as Forças Armadas atuem como um "Poder Moderador", o que deflagraria um cenário de intervenção militar. "Isso é uma opinião pessoal minha, o presidente não disse, nem vai deixar escapar isso. Vivemos uma crise institucional em que alguém vai ganhar e alguém vai perder, não vejo mais como sair dessa situação, nem algo diferente dessa liturgia institucional [Conselho da República]", analisa.

Manifestações, crise, artigo 142 e Conselho da República: qual é a leitura do Planalto

O Conselho da República está na "pauta" do Planalto e a aposta feita pelo deputado Márcio Labre é que Bolsonaro e seus ministros "respirarão" o assunto nos próximos dias. "De alguma forma, isso está sendo tratado o tempo inteiro, a cada minuto, e talvez com alguns acertos de detalhes finais", destaca.

Interlocutores palacianos admitem que as conversas ocorrem, embora evitem cravar quando a convocação poderia ser feita por Bolsonaro. Mas analisam que a ideia mostra que o presidente da República quer dialogar e discutir com o Congresso os "excessos" dos ministros do STF.

As fontes procuradas pela reportagem negam, contudo, que, em caso de fracasso na tentativa de convocar o Conselho da República, Bolsonaro evoque o artigo 142 da Constituição a fim de usar as Forças Armadas para restaurar a harmonia entre os poderes, como sugeriu Labre.

Uma fonte do governo acredita que "somente em uma situação extrema" Bolsonaro cogitaria isso. Outras não apostam nessa hipótese. Unanimemente, todos acreditam que, na hipótese de fracasso do Conselho da República, o governo buscará outras vias para apaziguar o clima político.

"Após o posicionamento oficial dos presidentes de poderes [sobre o Conselho da República], serão feitos os contatos informais para arrefecer os ânimos", analisa um interlocutor palaciano. A expectativa é que, nesse cenário, atue diplomaticamente não apenas o ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, mas também os demais ministros e aliados políticos. "Todos devem tentar contribuir para evitar problemas mais graves para o país", avalia um segundo assessor.

A leitura feita no Planalto é de que as manifestações de 7 de setembro deram as "cartas" para Bolsonaro propor o conselho. "O balanço é altamente positivo. Mostra que os apoiadores do presidente e do governo têm grande persistência no apoio pela crença nas pautas conservadoras e em não querer o retorno da corrupção", diz um interlocutor.

"O discurso do presidente foi direto e marcou um limite para as extrapolações de ingerência de um poder sobre as atividades dos outros, particularizando a conduta de um ou dois ministros do STF", analisa um segundo. "O que tem motivado os ruídos é a ingerência de um poder no outro", complementa a fonte.

O que é o Conselho da República e como ele funcionaria

O Conselho da República foi instituído durante o governo do ex-presidente Fernando Collor pela Lei nº 8.041/1990 e tem em sua composição os presidentes da República, Câmara e Senado, o vice-presidente da República, os líderes da maioria e minoria no Congresso, o ministro da Justiça e outros seis indicados pela presidência e pelas casas do Parlamento.

O Conselho da República é um órgão superior consultivo da Presidência que deve se manifestar sobre intervenções federais, estado de defesa e estado de sítio e sobre questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas. Foi convocado pela última vez na gestão de Michel Temer, quando o tema do debate foi a intervenção federal na segurança do Rio de Janeiro.

O caráter consultivo implica na não obrigação do presidente da República seguir as orientações dos membros do colegiado, alerta o sócio e coordenador de análise política da BMJ Consultores Associados, Lucas Fernandes.

Dos seis cidadãos, dois são nomeados pelo presidente, dois eleitos pelo Senado e outros dois eleitos pela Câmara. O presidente da República ainda pode convocar um ministro para participar da reunião do conselho "quando constar da pauta questão relacionada com o respectivo ministério".

Quando Bolsonaro falou sobre o Conselho da República na terça-feira, Pacheco e Lira avisaram interlocutores que desconheciam a reunião citada. Já o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, sinalizou que ele e os senadores Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI da Covid-19, Renan Calheiros, relator da CPI, e Jean Paul Prates (PT-RN), líder da minoria, participariam de uma eventual reunião do Conselho da República.

Governistas e Bolsonaro não preveem novas convocações de atos de rua

O Conselho da República é visto como a "última cartada" de Bolsonaro como a principal tomada de decisão do governo para contornar a crise entre os poderes. A convocação para novos atos de rua como demonstração de força não estão no radar de governistas. O presidente e parlamentares respeitarão possíveis manifestações, mas entendem que elas não teriam a mesma eficácia.

"Voltar para a rua hoje é só para fazer um carnaval de comemoração, porque outra manifestação, hoje, no sentido de tentar ampliar o tensionamento, eu acho que Brasília já faz isso. O pessoal está concentrado e não vai sair mais. Não vejo mais a necessidade de mais nenhuma manifestação nesse momento e nos próximos dias que não seja da manutenção dessa pauta [Conselho da República]", diz o deputado Márcio Labre.

O parlamentar, que esteve com Bolsonaro no palanque na Avenida Paulista, notou um semblante de alívio do presidente. "Agora, ele se sente firme, seguro para dar o próximo passo. Estava muito angustiado e, hoje, essa angústia não existe mais. Entramos em compasso de espera para que, a qualquer momento, uma decisão mais dura seja tomada pelo poder Executivo", diz Labre.

"A demonstração popular de adesão à ideia de que a gente precisa assegurar nossas liberdades individuais foi plena. O governo já pode e tem absoluta certeza que conta com apoio da população e, agora, o próximo passo, é, realmente, tomar as devidas providências em relação ao que tiver de alcance legal para produzir o afastamento de alguns ministros. É esse o caminho. Está claro que eles não vão recuar e, do nosso lado, ficou claro que não vai recuar", sustenta Labre.

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