O ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, completou no fim de setembro dois meses à frente do governo federal prestigiado junto ao presidente Jair Bolsonaro em viagem ao Piauí, seu reduto eleitoral, em inaugurações nos setores da educação e da segurança pública. Entretanto, as imagens ao lado de Bolsonaro e as diversas postagens em redes sociais não afastam as críticas e desconfianças atribuídas a ele por integrantes da base governista no Congresso.
A Gazeta do Povo procurou diferentes parlamentares — incluindo lideranças partidárias — da base para colher as impressões e análises dos dois meses de Nogueira à frente da Casa Civil. As leituras, feitas sob a condição de anonimato, divergem entre aqueles que fazem boa avaliação, embora entendam ser pouco o tempo para se fazer uma análise, e outros que criticam o atual desempenho.
Os integrantes da base que fazem alguma boa avaliação alegam que Nogueira está "fazendo política" e focado em "melhorar a imagem" de Bolsonaro. "Está viajando, organizando o partido [o PP, o qual ele é presidente nacional]", destaca uma liderança da Câmara. Em ano pré-eleitoral, viagens nessa época do ano são estratégias eleitorais típicas para iniciar a montagem de coligações e palanques com aliados políticos nos estados.
O problema na avaliação dos governistas críticos à atuação de Nogueira é que o chefe da Casa Civil não evoluiu na montagem de palanques de Bolsonaro, nem melhorou a articulação política do governo no Congresso. "O Ciro está fazendo a operação política do processo para tirar todo o sumo que ainda tem de poder, influência e força na máquina, mas pensando nas eleições de 2022 com o Jair fora do cenário", acusa um deputado aliado.
Qual é a análise sobre a articulação de Ciro Nogueira no Congresso
As críticas a Ciro Nogueira chamam a atenção. Quando foi nomeado para assumir a Casa Civil, a expectativa feita por governistas era de que ele solidificaria a base na Câmara, no Senado e nas sessões do Congresso. Passados dois meses, a leitura é de que a base não se consolidou como o esperado.
"Para o que eu esperava, ele [Nogueira] só deixou a desejar", diz um dos deputados ouvidos pela reportagem. "O que a gente viu acontecer, principalmente na votação do novo Código Eleitoral, aquele golpe dado com a emenda aglutinativa que deu a quarentena para forças policiais, que é o coração do eleitorado do presidente, botar os caras para se desvincular quatro anos antes é destruir a base", explica.
As críticas do parlamentar dizem respeito à reviravolta que permitiu que o projeto da reforma do Código Eleitoral incluísse, na redação aprovada pela Câmara, uma quarentena para que juízes, membros do Ministério Público, militares e policiais só possam disputar eleições quatro anos depois de deixarem seus cargos públicos. Outra crítica citada por parlamentares descrentes com a articulação de Nogueira na Câmara foi a votação da chamada PEC do voto impresso.
No Senado, críticos lembram da derrota na votação da MP da minirreforma trabalhista e das dificuldades em colocar a sabatina de André Mendonça em votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Ex-ministro da Justiça e da Advocacia-Geral da União (AGU), Mendonça foi indicado por Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Nas sessões do Congresso, também recaem críticas da base sobre Nogueira. Acusam a Casa Civil de ter aceitado acordos pela derrubada de vetos de Bolsonaro que, na prática, aumentarão os gastos públicos e ainda amplia a reforma eleitoral, com a regulamentação da federação partidária.
Um aliado de Nogueira minimiza os desconfortos e afirma que, ao contrário das expectativas criadas, nem tudo é atribuição do chefe da Casa Civil. "A articulação é função majoritária da Flávia [Arruda, ministra-chefe da Secretaria de Governo] que, de fato, deu umas 'apagadas'. Já nas sessões de Congresso, o [senador] Eduardo [Gomes, líder do governo] tem tido uma autonomia grande. Ele é quem tem tratado diretamente com os ministros e a equipe econômica", diz.
Quanto à sabatina de Mendonça, o aliado de Nogueira alega que foge do alcance do ministro. "A questão é a contrariedade do Davi [Alcolumbre, presidente da CCJ] e da turma dele, que cobram o cumprimento de acordos que o Davi fez com o governo, inclusive para eleger o [Rodrigo] Pacheco. Vai 'trucar' até a hora que pagarem [emendas parlamentares extras]", sustenta. Já críticos alegam que, como chefe da Casa Civil, o ministro teria a obrigação de resolver impasses políticos e deixar os acordos em dia.
Qual é a avaliação sobre Nogueira na coordenação eleitoral
Os parlamentares mais alinhados a Ciro Nogueira ressaltam que o ministro está mais engajado em melhorar a imagem de Bolsonaro a fim de evitar o desembarque de lideranças do Centrão, que podem se distanciar do governo caso Bolsonaro não amplie sua capilaridade política para a disputa da reeleição.
Esse grupo de parlamentares e lideranças lembra, ainda, que a segunda metade de agosto e a primeira quinzena de setembro foi um mês "delicado", dada toda a conjuntura política de crise entre poderes. "É pouco tempo para avaliar esses dois meses do Ciro. Setembro, então, foi um mês para virar a página, foi tudo muito atribulado, muita 'pancadaria'", alega um aliado de Nogueira, em referência às manifestações de 7 de setembro. "Nem que o Ciro operasse um milagre. Ele não tinha como acalmar os ânimos", complementa.
A leitura dos deputados da base mais próximos de Nogueira não convence os governistas mais críticos ao início da gestão. O discurso desse grupo é que a campanha do ex-presidente Luiz Inácio da Silva (PT) está mais avançada. Citam que ele já viajou o Nordeste para fechar acordos eleitorais e avançou sua peregrinação sobre o Sudeste, com viagem a Belo Horizonte em setembro, enquanto Bolsonaro segue sem palanques em 2022.
No Rio de Janeiro, por exemplo, reduto eleitoral de Bolsonaro, o atual governador, Cláudio Castro (PL), é apontado como o nome a ser apoiado por Nogueira. As conversas, entretanto, não animam aliados do governo. "O Valdemar [Costa Neto, presidente do PL] é muito camaleônico e tem estreitíssimas relações com o Lula. Tampouco há sinais sólidos de estreitamento do Ciro", diz um deputado.
Mesmo correligionários de Nogueira estão desconfiados com o real comprometimento do ministro com a coordenação eleitoral. "Tem algum partido do Centrão declarando apoio ao Bolsonaro para 2022? O Ciro vai montar palanque, sim, só não sabe para que lado", diz um parlamentar do PP. "O Bolsonaro não trouxe o PP ao governo, mas um habeas corpus contra o impeachment", analisa um segundo correligionário do chefe da Casa Civil.
A leitura feita por correligionários e deputados governistas de outros partidos de centro é que Ciro Nogueira está numa posição cômoda: se Bolsonaro "derreter" nas pesquisas, ele deixa o governo e negocia o capital político a outro político; se mostrar sinais de reação, mantém a fidelidade ao presidente.
"O Jair está sendo utilizado como uma 'mula' para que o Centrão e o establishment consiga se reestruturar em alguma outra candidatura. Ainda existe em Brasília um compasso de espera pelo surgimento de uma terceira via. O PP está procurando estruturar sua bancada para a Câmara. As candidaturas majoritárias [governadores, senadores e presidente] o Ciro vai deixar para mais a frente", analisa um deputado.
Quais os esforços da Casa Civil para tornar Bolsonaro mais popular
A suspeita feita pelos parlamentares críticos às articulações de Ciro Nogueira é que o chefe da Casa Civil só efetivamente se associará a uma possível candidatura do Bolsonaro se os números de popularidade do presidente da República sofrerem uma "mudança brusca".
"E aí, o Centrão fará o cálculo político se cola nele [Bolsonaro] na intenção de pegar carona, mas com acordos já muito bem amarrados com outra condição de força dos partidos de centro", analisa um aliado "bolsonarista" do governo. O parlamentar alerta que, diferentemente de seu eleitorado, que é mais desconfiado em relação às pesquisas eleitorais, os políticos "profissionais", não.
Nas mais diferentes pesquisas e cenários traçados, Lula aparece à frente de Bolsonaro em um possível segundo turno. Por isso, melhorar a imagem do governo a fim de elevar as taxas de popularidade e aprovação do presidente da República virou uma meta do ministro da Casa Civil para avançar nos palanques estaduais.
Para mudar isso, o ministro tem se reunido corriqueiramente com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para buscar soluções ao preço dos combustíveis e do gás de cozinha, segundo afirmam correligionários de ambos à reportagem. A inflação desses itens, por sinal, foi pauta das manifestações contra Bolsonaro no sábado (2). Outra pauta discutida é a aprovação do Auxílio Brasil, o novo Bolsa Família.
Lira, por sua vez, se reuniu na sexta-feira (30) com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para discutir o preço dos combustíveis. O presidente da Câmara tem defendido criar um fundo para estabilizar o preço dos combustíveis. A interlocução de Nogueira com Lira para solucionar os problemas da inflação e melhorar a imagem de Bolsonaro é bem avaliada pela maioria da base governista.
"O fiel da balança acaba sendo a economia. Se o presidente chegar na eleição com o gás custando R$ 120, a gasolina a R$ 7 e os itens da cesta básica caros como estão, aí pode jogar a pá de cal que o presidente chegará numa eleição muito desgastado", avalia uma liderança do Centrão.
Filiação de Bolsonaro ao PP também é debatida junto de Lira
Outra pauta nas conversas entre Ciro Nogueira e Arthur Lira é a filiação de Bolsonaro. Até para poder avançar na construção de palanques para o presidente da República nos estados, o chefe da Casa Civil tem buscado sua base para conferir a reação. O site Metrópoles informou que ele promoveu reunião com os presidentes estaduais e outras lideranças do PP para discutir o assunto.
A Gazeta do Povo confirmou as conversas e foi informada que o retorno obtido por Nogueira de sua base não é tão favorável. Existe uma ala do PP que é a favor da filiação de Bolsonaro. Outros, entretanto, não são. A maioria de dirigentes do Norte e Nordeste são contrários à ideia.
O entendimento é de que a filiação de Bolsonaro poderia atrapalhar as coligações nos estados. Segundo afirmou uma liderança da legenda, um dos contrários à filiação é o próprio Lira. A leitura é de que ter o presidente da República filiado ao PP retiraria parte do poder de negociação que, hoje, a Câmara tem com o Palácio do Planalto.
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