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Sede do Banco Central, em Brasília.
Sede do Banco Central, em Brasília.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A guerra declarada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Banco Central (BC) dividiu a base governista, incluindo partidos do centro político, nos quais dirigentes e lideranças discordam e concordam com as críticas do petista. Já na base mais à esquerda, lideranças e caciques dobraram a aposta com relação às críticas ao presidente da autoridade monetária, Roberto Campos Neto.

Em alinhamento à guerra declarada pelo próprio presidente à atual gestão da autoridade monetária e sua autonomia, lideranças e dirigentes do PT, PSOL e PCdoB subiram o tom contra a autarquia federal, com direito a pedido de convocação para que Campos Neto vá ao Congresso e até de defesas de propostas legislativas de revogação da independência do órgão.

Nos últimos dias, Lula fez críticas ao BC, à política monetária que manteve as taxa de juros em 13,75% ao ano, às atuais metas de inflação, e também disse que planeja reavaliar a autonomia do BC após o término do mandato de Campos Neto à frente da autoridade monetária, ao fim de 2024.

A presidente nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann, defendeu nesta quinta-feira (9) que a política monetária esteja alinhada com a política econômica do governo que vence as eleições. Campos Neto assumiu mandato em 2021, após o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionar lei que assegura autonomia ao órgão e mandatos de quatro anos ao presidente e diretores.

"Eu fui uma das pessoas que disse que nós não iríamos mexer com isso [legislação], porque realmente não é o foco agora. Isso não quer dizer que a gente não vai discutir a política monetária que o Banco Central tem implementado. A política monetária do Banco Central tem que estar de acordo com a política monetária do projeto que ganhou nas urnas", declarou.

Lideranças de legendas da esquerda, inclusive do PDT, entendem que as críticas ao BC têm por intuito marcar posição e pressionar por uma renúncia para emplacar uma pessoa alinhada à política econômica do governo petista. Como existe o entendimento de que Campos Neto não vai renunciar ao mandato, diferentes alas e bancadas da esquerda têm subido a pressão.

Após as críticas de Lula, a bancada do PSOL na Câmara apresentou na terça-feira (7) um projeto de lei para revogar a autonomia do BC. O objetivo é desvincular a autoridade monetária de qualquer estrutura do Executivo ao alterar a legislação sancionada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que assegurou autonomia ao órgão e fixou mandato de quatro anos para o presidente e os diretores.

Na quarta-feira (8), o deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ), que deve ser no próximo ano o líder da federação partidária liderada pela legenda na Câmara, protocolou requerimento para que Campos Neto seja convocado pela Comissão de Finanças e Tributação (CFT) e explique a política monetária do país.

Os requerimentos de convocação são diferentes dos de convite e são usados politicamente como formas de "enquadrar" a autoridade em questão, uma vez que, na convocação, existe a obrigação de comparecimento sob pena de incorrer em crime de responsabilidade.

Como a base de Lula ao centro reagiu às críticas sobre autonomia do BC

Já entre os partidos de centro que ocupam a base de Lula, embora exista uma divisão, há mais parlamentares independentes que discordam das críticas ao BC. Os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), respectivamente, saíram em defesa da autonomia e independência da autoridade monetária. Os dois foram reeleitos com o apoio do governo e sua base no Congresso.

"Eu tenho a escuta, a tendência do que a maioria do plenário pensa. Com relação à independência do Banco Central, esse assunto não retroagirá. O Banco Central independente é uma marca mundial, o Brasil precisa se inserir neste contexto", disse Lira nesta quinta. "É uma autonomia que afasta critérios políticos de um órgão que tem um aspecto técnico muito forte, que é o Banco Central", comentou Pacheco na quarta.

O deputado federal José Nelto (PP-GO) critica os ataques ao BC e sustenta que não se baixa juros "no grito, nem na canetada". "Todo governo tem que fazer o dever de casa. Você tem que dar segurança jurídica para os investidores nacionais e internacionais", destaca. O parlamentar pondera, ainda, que as principais e mais sólidas economias mundiais dispõem de bancos centrais independentes e entende que o Congresso não voltará atrás da autonomia aprovada na última legislatura.

Nelto e outros parlamentares de centro entendem, porém, que é um direito de Lula criticar os juros. O deputado federal Marco Bertaiolli (PSD-SP) avalia as críticas como uma forma de Lula expressar seu descontentamento com os juros a 13,75% ao ano. Para ele, é um debate válido. "O debate precisa ser feito, as críticas à autonomia serão constantes, sem que isso signifique risco à autonomia. Mas isso exige do BC uma maior transparência e interação com o país", avalia.

Ex-presidente da Comissão de Finanças e Tributação, Bertaiolli pondera que a economia não está aquecida a ponto de justificar a manutenção de juros no atual patamar. Para ele, o BC precisa manter sua autonomia, mas poderia ser mais transparente em suas decisões. Sobre as pressões de partidos e lideranças da esquerda pela revogação da autonomia, ele entende como natural, embora não acredita que possam prosperar. "Não há espaço político e não vejo motivo para que isso ocorra. Vejo muito mais como posicionamento legítimo de cada um dizer se é a favor ou contrário", diz.

Os dirigentes de partidos de centro que defendem as críticas sustentam que há teses econômicas para embasar a cobrança por juros menores. O ex-deputado Júnior Bozzella (União Brasil-SP), vice-presidente do partido, entende que Lula não está equivocado ou exagerando na dose ao apelar por uma redução dos juros.

"Não está errado ter redução da taxa de juros para fomentar e injetar recursos na economia, girar e fazer a alavancagem do processo de desenvolvimento e automaticamente redução de desemprego", afirma. Bozzella comenta que a defesa é amparada não apenas pela equipe econômica do governo, mas também pelo vice-presidente e ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin.

Em conversa com parlamentares, Alckmin tem comentado que 1% de redução da taxa de juros implicaria em uma economia de R$ 70 bilhões no pagamento dos juros da dívida. O cálculo foi citado, inclusive, em uma reunião na terça-feira com deputados da Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE), que é presidida por Bertaiolli.

"Se baixarmos 2%, chegamos a R$ 140 bilhões e nós pagamos a PEC extrateto que votamos agora para poder alimentar o Brasil durante este ano na questão do Bolsa Família. Essa foi a conta do vice-presidente e é a conta que está na cabeça do Lula. Com uma taxa de 13,75%, não faço mais nada a não ser pagar o custo da dívida", comenta Bertaiolli. "É óbvio que não é simplista desse jeito, pois temos outras variáveis dependentes de um Banco Central com uma taxa de juros dessa, como a própria inflação. Não é tão fácil, só digo o quanto custa ao país", complementa.

Oposição critica Lula e promete esforço para manter autonomia do BC

A postura entre senadores e deputados opositores a Lula também é semelhante ao de parlamentares independentes que defendem a manutenção da autonomia do BC ou que se posicionam de maneira mais crítica. Líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PLRN) usou as redes sociais para assegurar que a oposição fará sua parte para “defender as conquistas estruturantes do país”.

“Em vez de governar, Lula continua dizendo lulices: sabota a economia atacando a autonomia do Banco Central, a modernização dos marcos regulatórios e, agora, a capitalização da Eletrobras”, comentou na terça no Twitter.

“Dividir o país, inflar narrativas, confundir a população, aparelhar a máquina pública, utilizar bancos oficiais para subsidiar setores específicos da economia aumentando a desigualdade é um padrão típico do PT que já conhecemos”, complementou.

Líder da oposição na Câmara, o deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ) acusou Lula e a esquerda de praticar “péssimas relações” com as instituições brasileiras em razão das críticas feitas ao BC. “E tudo isso por quê? Porque querem encontrar um culpado por todo o desgoverno que ele vem promovendo”, disse nesta quinta.

Para ele, as críticas agravam a crise econômica. “O desgoverno Lula é o retrato da irresponsabilidade e incompetência”, disse em publicação no Twitter.

Em vídeo enviado à imprensa, o deputado Sanderson (PL-RS) prometeu empenho para assegurar a manutenção da autonomia do BC. “Retirar a autonomia do Banco Central seria um verdadeiro desastre na política monetária brasileira, com reflexos nefastos à economia como um todo”, apontou. “Por isso que aqui, na Câmara, vamos trabalhar para manter a autonomia do BC, algo que foi conquistado a duras penas”, acrescentou.

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