Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Embargos de declaração

Defesa de Bolsonaro cita voto valioso de Fux para recorrer contra condenação

Defesa de Bolsonaro recorre de condenação no STF
Defesa de Bolsonaro recorre de condenação por suposta tentativa de golpe de Estado e destaca pena "injusta". (Foto: EFE/Andre Borges)

Ouça este conteúdo

A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recorreu nesta segunda-feira (27) contra sua condenação por suposta tentativa de golpe de Estado. Os advogados citaram o voto do ministro Luiz Fux, único a defender a absolvição do ex-mandatário, para solicitar a redução da pena e questionar a vinculação com os atos de 8 de janeiro de 2023 e a credibilidade da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid.

Segundo o recurso, o voto de Fux demonstrou que "as ilegalidades" apresentadas durante o julgamento da ação penal não foram resolvidas. A defesa destacou que “os fatos imputados são graves” e que a decisão é “visivelmente injusta”.

Foram apresentados embargos de declaração, cujo objetivo é sanar ambiguidades, omissões e contradições no acórdão, documento que oficializa a decisão. Normalmente, os embargos de declaração não alteram o resultado do julgamento. A Primeira Turma condenou Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão.

VEJA TAMBÉM:

Após a apresentação do recurso, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, pode solicitar uma manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR). Cabe ao relator pedir que o presidente da Primeira Turma, Flávio Dino, marque uma data para o julgamento dos embargos de declaração.

A defesa alega que o acórdão se "esforça para colocar o Embargante [Bolsonaro] como uma figura onipresente", mas repete "fundamentos contraditórios" onde as premissas "não encontram respaldo na prova". Os advogados Celso Vilardi, Paulo Cunha Bueno e Daniel Tesser, que representam o ex-presidente, classificam as palavras de Fux como “valiosas”.

"Em diversos momentos, essa dicotomia torna-se patente, mas não pode ficar intocada quando se está diante de acusações graves e impressionantes. Valiosas, na análise dos argumentos apresentados para a condenação do ex-Presidente, as palavras do d. Ministro Fux", diz um trecho do recurso.

Durante o julgamento, o ministro ressaltou que cada ato processual praticado pelo STF deveria refletir o “compromisso ético do julgador com a justiça concreta do caso, reafirmando, diante da sociedade, que a Constituição vale para todos e protege a todos — inclusive e sobretudo no campo sensível da jurisdição criminal”.

O ex-presidente e os outros sete réus do “núcleo crucial” foram acusados por cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado por violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

Advogados questionam pena de 27 anos de prisão

Os advogados solicitaram a aplicação do princípio da consunção para os crimes abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. A medida consiste na absorção do crime menos grave ao mais grave e pode levar à redução da pena. Fux afirmou que Bolsonaro não poderia ser responsabilizado por esses dois crimes.

“Condutas praticadas pelo réu durante seu mandato como presidente da República não podem configurar o crime previsto no 359-M, do Código de Processo Penal, pois pressupõe a prática de conduta de tentar remover o mandatário do cargo, e era ele o mandatário do cargo”, destacou o ministro.

Segundo a defesa, o acórdão é contraditório, pois “reconhece a existência de um projeto unitário de poder”, mas também “afirma haver finalidades distintas” para justificar o concurso material. “Tal raciocínio é contraditório: se há unidade de desígnio e encadeamento único de condutas, a tentativa de golpe de Estado é mero meio normal de execução da abolição violenta da ordem democrática”, diz o recurso.

Além disso, a pena-base foi fixada de forma elevada em todos os crimes, pois Bolsonaro foi considerado o líder da suposta trama golpista. Para os defensores, o acórdão não expôs o cálculo que levou o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, a aumentar a pena final.

Eles apontam que a ausência de quantificação do "como" e "porquê" de cada vetor desfavorável é uma omissão. A defesa apontou discrepâncias nos cálculos do ministro, como a pena-base para o dano qualificado, que foi fixada em 3 anos (o máximo legal), representando um aumento de 100% do mínimo, enquanto no crime de organização criminosa o aumento foi de apenas 16%.

“Do modo como a dosimetria está exposta no voto condutor, não é possível ao embargante, alvo da exacerbada punição, saber os motivos pelos quais aquela pena está lhe sendo imposta”, disseram os advogados.

Vincular Bolsonaro ao 8/1 é “contradição lógica e jurídica”

Outro ponto levantado é a “contradição lógica e jurídica” da decisão pela vinculação das acusações aos atos de 8 de janeiro de 2023. Os advogados apontam que o acórdão impôs aos réus a "autoria mediata", utilizando a premissa de que os manifestantes presentes na Praça dos Três Poderes teriam sido usados como instrumentos e, portanto, agido "sem dolo ou culpa".

No entanto, a defesa aponta que o próprio acórdão registra que mais de 1.600 réus já foram condenados pelos mesmos fatos, tendo seu dolo (intenção) ampla e repetidamente reconhecido. Os defensores alegam que é juridicamente impossível punir os réus da ação penal quando o dolo dos “autores imediatos” pelos atos já foi atestado.

Em seu voto, Fux afirmou que “não é possível aceitar” a tentativa de vincular Bolsonaro aos atos de 8 de janeiro de 2023 com base apenas em discursos e entrevistas. O ministro apontou que a PGR preferiu “adotar uma narrativa desprendida da cronologia dos fatos alegados” em vez de individualizar as condutas dos réus.

Defesa de Bolsonaro diz ter sido cerceada e aponta "vícios" em delação

Os advogados consideram que o voto de Fux evidenciou a "gravidade do cerceamento de defesa" que marcou a instrução da ação penal. Em seu voto, o ministro alertou que a compreensão contemporânea da garantia do contraditório e da ampla defesa implica o dever do magistrado de acolher a manifestação das partes de forma efetiva, e não meramente formal.

Na ocasião, Fux destacou a alegação das defesas de que houve cerceamento devido à disponibilização tardia de um "tsunami de dados" (document dumping), sem identificação suficiente e antecedência minimamente razoável.

Os advogados reforçaram que os autos foram disponibilizados em "imensa quantidade”, com “links desorganizados” e incompletos, caracterizando uma tática de document dump. O volume de dados alcançou 70 terabytes. “Descompactados, a quantidade de material equivaleria a quase 44 bilhões de páginas”, afirma a defesa.

A defesa apontou "vícios" na delação premiada de Mauro Cid, alegando que o delator mentiu e agiu "confessadamente pressionado". Para os advogados de Bolsonaro, a versão que prevaleceu na delação foi a do delegado, não a do colaborador, diante da necessidade de retificações nas narrativas.

Braga Netto pede revisão de pena

A defesa do ex-ministro Walter Braga Netto alega que a condenação é "absolutamente injusta e contrária à prova dos autos", resultado de um processo conduzido sem a "necessária imparcialidade" e norteado por uma "delação comprovadamente mentirosa". O general foi condenado a 26 anos de prisão.

Os advogados solicitaram correções na dosimetria, apontando que a pena final deve ser corrigida para 25 anos e 6 meses. Eles consideram que o acórdão contém vícios de omissão e contradição e buscam a anulação do processo. A defesa reafirmou a tese de suspeição de Moraes e sustenta que ficou impedida de ter acesso amplo e efetivo aos elementos de prova, violando o princípio da “paridade de armas”.

Anderson Torres

A defesa do ex-ministro da Justiça Anderson Torres pede que o acórdão esclareça qual ação específica ele deveria ter praticado para evitar os atos de 8 de janeiro de 2023, e se sua presença no país teria sido decisiva para evitar a ocorrência dos fatos, sanando a obscuridade sobre o nexo de causalidade na omissão imprópria. À época, Torres era o secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, mas estava de férias nos Estados Unidos.

Caso a condenação seja mantida, a defesa requer a readequação da dosimetria da pena imposta de 24 anos. Segundo os advogados, a pena-base de todas as imputações deve ser fixada no mínimo legal, em consonância com as circunstâncias judiciais favoráveis, como ser réu primário, ter bons antecedentes e conduta social irrepreensível.

Alexandre Ramagem

O deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), foi condenado a 16 anos, 1 mês e 15 dias. Como a pena a ser cumprida em regime fechado ultrapassa 120 dias, o colegiado determinou a perda do mandato. O parlamentar não foi julgado pelos dois crimes de dano ao patrimônio.

A defesa pede que a Corte estenda a resolução da Câmara que suspendeu a ação penal para crimes praticados após a diplomação à infração de organização criminosa. Os advogados pedem que os ministros analisem a aplicação da lei que permite a diminuição da pena quando a participação for de menor importância. Além disso, pedem a retificação do acórdão para que seja afastada a aplicação automática da perda do cargo público de delegado federal.

Almir Garnier

A defesa de Almir Garnier, ex-comandante da Marinha, questionou a pena de 24 anos de prisão e pediu esclarecimentos sobre os critérios usados para valorar negativamente sua culpabilidade, baseada no "exercício de funções de alta responsabilidade no Estado". Os advogados pedem a equalização das penas-base de todos os delitos, reduzindo-se ao patamar uniforme de 20% sobre o mínimo legal.

Paulo Sérgio Nogueira

A defesa do ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira busca a reversão da condenação, alegando que o próprio acórdão reconheceu elementos fáticos que excluem ou minoram sua responsabilidade penal. Os advogados apontam que Nogueira agiu para diminuir o risco da ruptura institucional. Caso a condenação seja mantida, a defesa pede a readequação da pena de 19 anos para 16 anos e 4 meses, sendo 14 anos e 3 meses de reclusão e 2 anos e 1 mês de detenção.

Augusto Heleno

A defesa do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno pediu sua absolvição ou a readequação da pena de 21 anos imposta pela Primeira Turma. Os advogados pedem que a decisão seja declarada nula por cerceamento de defesa, pela atuação de Moraes e ausência de prova de participação.

Caso a condenação seja mantida, a defesa requer que as penas-base sejam mantidas no patamar mínimo legal, argumentando que os motivos citados para majorar a pena são “genéricos” e em razão da participação de menor importância de Heleno. Além disso, pede a redução da multa para um sexto do salário-mínimo por dia-multa, alegando que o valor fixado em 84 dias-multa ao valor de um salário-mínimo é “excessivamente elevado”.

Defesa de Cid não apresenta embargos de declaração

A defesa do tenente-coronel Mauro Cid decidiu não recorrer da decisão da Primeira Turma. Por ter firmado o acordo de delação, o militar foi condenado a 2 anos de prisão. Os advogados consideram que Cid já cumpriu a pena durante as investigações, pois além do período preso, cumpre medidas cautelares. Na semana passada, a defesa pediu a extinção da punibilidade do militar.

VEJA TAMBÉM:

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.