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A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quarta-feira (10), o projeto de lei que reduz as penas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023. O PL da dosimetria recebeu 291 votos favoráveis, 148 contrários e uma abstenção. Os deputados rejeitaram todos os destaques da base do governo que poderiam alterar o projeto.
O texto segue para análise dos senadores. Mais cedo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), garantiu que a proposta será votada ainda neste ano. O deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator da matéria, destacou que o país passou por "tempos duros, em que a política perdeu o sentido do encontro e se trasnformou em campo de batalha".
"Esse projeto é um gesto de reconciliação", enfatizou. Bolsonaro foi condenado a 27 anos e 3 meses de prisão pela suposta tentativa de golpe de Estado. O relator estima que a prisão em regime fechado do ex-mandatário será reduzida para 2 anos e 4 meses.
A sessão foi marcada por críticas ao presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), pela retirada à força do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) da Mesa Diretora. O PL 2.162/2023 estava previsto para ser o primeiro da pauta. A votação só começou após 23h30, de terça (9), e terminou às 3h55, desta quarta (10).
Antes de encerrar a sessão, Motta classificou a votação como "complexa" e elogiou o trabalho do relator. "A sociedade não aguenta mais ouvir esse disco arranhado. Precisamos virar a página e entrar o ano de 2026 com novos assuntos, novos projetos", disse.
Paulinho alterou o texto original apresentado pelo deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ), rejeitando a possibilidade de uma anistia “ampla, geral e irrestrita” em busca de “equilíbrio” e da “pacificação nacional”. Os deputados aprovaram a tramitação de urgência para o PL 2.162/2023 em setembro.
A redução é uma estimativa e também dependerá da atuação de Bolsonaro, e de outros condenados, para diminuir a pena por meio de trabalho ou tempo de estudo. A Vara de Execução Penal do Distrito Federal estima que, com a pena atual, o ex-presidente pode ir para o semiaberto em 2033 e receber liberdade condicional em 2037.
“As pautas extremistas da anistia, de um lado, e da manutenção das condenações desproporcionais, por outro, servem para alimentar conflitos e agradar os radicais, mas não acolhem a visão da maioria da sociedade, que anseia por um acordo que devolva a paz e o bom convívio nas famílias”, disse o relator no parecer.
Deputados da base do governo Lula (PT) tentaram impedir a votação, argumentando que substituivo é completamente diferente do texto original e chegaram a dizer que Motta não tem mais condições de comandar a Câmara.
O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) destacou a necessidade de se aprovar a proposta para beneficiar as pessoas presas pelo 8 de janeiro. "Temos pressa na aprovação desse projeto, estamos falando da redução do sofrimento das pessoas", disse.
Diversos parlamentares da oposição afirmaram que o projeto era o texto possível, mas ponderam que a aprovação é um primeiro passo para uma possível anistia.
Líder do PT e Motta trocam farpas no plenário
O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), classificou a proposta como uma "vergonha" e criticou a votação na "calada da noite". "Hugo Motta está conduzindo um ataque à democracia do nosso país... O senhor está cometendo um crime, está interferindo em um julgamento que ainda está em curso", criticou o petista.
Motta rebateu a acusação, alfinetando o PT. "Escutar aqui por diversas e reiteradas vezes integrantes do PT — um partido que eu respeito, respeito sua história — falar sobre Ulysses Guimarães, quando esse partido votou contra a atual Constituição é realmente uma incoerência histórica", disparou o presidente da Câmara. No último dia 24, Motta anunciou publicamente o rompimento com o líder do PT.
O que muda com o PL da dosimetria
O PL da dosimetria altera o Código Penal e a Lei de Execução Penal (LEP). O projeto une os crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito, aplicando a maior pena entre eles. Ou seja, a proposta impõe a regra do concurso formal próprio e proíbe a soma das penas para esses dois crimes.
No caso de Bolsonaro, a pena de 6 anos e 6 meses de prisão fixada para o crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito seria descartada, permanecendo a pena estabelecida para golpe de Estado, de 8 anos e 2 meses, e as penas referentes aos demais crimes.
Além disso, o PL da dosimetria altera a regra para crimes cometidos em multidão (Art. 359-V). Neste caso, a pena será reduzida de um terço a dois terços, contanto que o agente não tenha exercido papel de liderança nem praticado ato de financiamento dos atos antidemocráticos.
“Concedemos tratamento mais benéfico aos participantes que não tiveram poder de mando nem participaram do financiamento dos atos antidemocráticos, nos termos do novel art. 359-V”, diz a justificativa.
O relator alterou as regras de progressão para um regime menos rigoroso. Quando o preso tiver cumprido ao menos 1/6 (um sexto) da pena no regime anterior, sem impacto na progressão prevista para crimes graves e hediondos.
Segundo o relator, a remição será da seguinte forma: a cada três dias trabalhados é descontado um dia da pena; e a cada 6 dias de estudos outro dia de pena será descontado.
Foram apresentadas duas emendas de plenário. Crivella propôs vedar o uso de tornozeleira eletrônica e o sequestro de bens de acusados pelo crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
A segunda emenda, de autoria de van Hattem, pretendia que fosse aplicado o princípio da consunção (absorção) para os crimes contra o Estado Democrático de Direito. O relator rejeitou as propostas.




