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Presidente Jair Bolsonaro com a deputada Carla Zambelli
O presidente Jair Bolsonaro e a deputada Carla Zambelli.| Foto: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo

A deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) conseguiu algo inimaginável até pouco tempo atrás: ofuscar o colega de Câmara Hélio Negão (PSL-RJ), “papagaio de pirata” número um do presidente Jair Bolsonaro. Mas, ao contrário do deputado carioca, ela não se contenta apenas em sair na foto. Carla ganhou protagonismo no Palácio do Planalto nas últimas semanas, tornando-se uma espécie de auxiliar informal do governo em momentos de crise.

Ela esteve envolvida em dois eventos políticos recentes: a saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça e da atriz Regina Duarte da Secretaria Especial da Cultura. Na terça-feira (26), a deputada bolsonarista foi ainda alvo de uma polêmica por supostamente ter antecipado a deflagração da operação policial que mirou o governador do Rio de janeiro, Wilson Witzel, desafeto do presidente Bolsonaro. Informação privilegiada? Ela nega.

Um dia antes da Operação Placebo, a deputada disse, em entrevista à Rádio Gaúcha, que governadores eram investigados pela PF. "A gente já teve algumas operações da Polícia Federal que estavam ali, na agulha, para sair, mas não saíam. E a gente deve ter, nos próximos meses, o que a gente vai chamar, talvez, de ‘Covidão’ ou de, não sei qual vai ser o nome que eles vão dar, mas já tem alguns governadores sendo investigados pela Polícia Federal”, afirmou.

Depois da deflagração da Operação Placebo (contra Witzel), Carla Zambelli desmentiu no Twitter que soubesse do que estava por vir: "Se eu tivesse informações privilegiadas e relações promíscuas com a PF, a operação de hoje seria chamada de 'Estrume' e não 'Placebo'."

A deputada também falou sobre o assunto à CNN. "Eu não sou uma pessoa burra. Se eu tivesse informação privilegiada, eu falaria isso publicamente?". Na mesma linha, apontou, em tom de indagação: "Se há algum tipo de interferência [de Bolsonaro na operação contra Witzel], o presidente também está agindo em cima do STJ?". A operação contra o governo Witzel foi desencadeada com autorização do ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Ainda segundo Carla, a deflagração da Operação Placebo menos de 24 horas depois das suas declarações à Rádio Gaúcha foi "uma feliz coincidência" que ela espera que se repita em outros estados. "Governadores estão superfaturando tudo [na ações de combate ao coronavírus]. Eles têm de começar a entender que têm de ter medo, sim. Vai ter de parar de roubar, principalmente, em um momento como esse em que as pessoas estão morrendo de fome", disse a deputada ao jornal O Estado de São Paulo.

Federação de policiais diz que há vínculo entre deputada e delegados da PF

A Federação Nacional de Policiais Federais (Fenapef) defendeu que um eventual vazamento da Placebo seja investigado. A entidade destacou que é “notório” o vínculo de Zambelli com delegados da PF.

"Sobre as suspeitas de que a deputada Carla Zambelli (PSL- SP) foi informada antecipadamente da Operação, é conhecido e notório o vínculo da parlamentar com a Associação de Delegados, desde quando era líder do movimento Nas Ruas. Esse laço se demonstra pela participação de Zambelli em eventos, vídeos e homenagens. A Fenapef defende a apuração, com responsabilidade e profundidade, sobre a possibilidade de que esse vínculo possa ter sido utilizado para a obtenção de alguma informação privilegiada", afirmou a entidade, em nota.

Papel de Carla Zambelli na saída de Moro do governo

Eleita com 76.306 votos em 2018 na esteira do antipetismo e do bolsonarismo, Carla Zambelli era uma das líderes do movimento Nas Ruas, que ganhou projeção nos atos que culminaram com o impeachment da presidente Dilma Roussef (PT), em 2016. Tinha profunda devoção pelo então juiz da Lava Jato Sergio Moro – a quem costumava chamar de herói nacional.

Mas o encanto se quebrou na conturbada saída do ministro da Justiça do governo Bolsonaro. Carla Zambelli foi ouvida como testemunha no inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar as acusações de Moro sobre a interferência de Bolsonaro na PF. A deputada protagonizou uma troca de mensagens com Moro, na qual ela procurou evitar a saída do ex-juiz e sugeriu que ele teria uma vaga garantida no STF, indicação feita pelo presidente da República.

"Vá em setembro para o STF. Eu me comprometo a ajudar. A fazer o JB [Jair Bolsonaro] prometer", escreveu a deputada. Moro respondeu que não estava "à venda".

Ela disse que tomou a iniciativa de procurar o então ministro da Justiça após falar com o chefe da Secretaria de Comunicação, Fabio Wajngarten, e o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, mas alegou que não consultou Bolsonaro.

"Se eu tivesse falado direto com o presidente, não teria pedido para o Moro ficar. Eu estava com os olhos vidrados no juiz da Lava Jato, mas Moro tinha uma agenda desarmamentista. O presidente não fazia questão de que ele ficasse", disse Carla ao jornal O Estado de São Paulo.

Ainda segundo a deputada, a admiração pelo juiz da Lava Jato – que foi um dos padrinhos de seu casamento, em fevereiro – foi "substituída por decepção".

Na entrevista à Rádio Gaúcha, Zambelli disse que enquanto era juiz, Moro tinha "investigação seletiva" e "predileção pelo PT". “Ele tinha predileção em investigar e condenar o PT, legitimamente (...) Se falava [dentro da Polícia Federal] sobre a falta de suporte operacional para que a investigação corresse mais solta. Hoje, eu olho para trás e verifico que essa falta de suporte operacional pode estar ligada ao fato de que o Sergio Moro tinha uma investigação seletiva”, afirmou a deputada.

Acusação de tráfico de influência

O ministro Celso de Mello encaminhou à Procuradoria-Geral da República (PGR), nesta terça-feira (26), um pedido de investigação da deputada Carla Zambelli pelos crimes de advocacia administrativa e tráfico de influência. O pedido foi levado em abril ao Supremo por 37 deputados do PT.

Com a denúncia encaminhada, o Ministério Público vai avaliar se deve fazer uma apuração do caso. A acusação apresentada por deputados do PT contra ela tem como base a conversa via WhatsApp entre a deputada e o ex-ministro Sergio Moro. Segundo os petistas, Carla pode ter cometido crime ao prometer uma vaga no STF para Moro.

Carla Zambelli buscou saída honrosa para Regina Duarte

Carla Zambelli também assumiu a missão de resolver a crise com Regina Duarte, de quem tornou-se amiga e conselheira. Bolsonaro pediu à deputada que encontrasse uma saída honrosa para a atriz: "Veja o que pode fazer para deixar a Regina feliz. Ela deixou a Rede Globo e me sinto responsável", disse o presidente, segundo ela. Carla então ficou de marcar um café da manhã de Regina com Bolsonaro para apaziguar os ânimos.

Foi da deputada bolsonarista a sugestão de oferecer à atriz o comando da Cinemateca. O protagonismo de Carla no caso virou foco de reclamação no entorno do presidente: após o episódio, recebeu mensagens que a aconselhavam a sair dos holofotes. Mas também houve outras de apoio, conta.

Rivalidade com Joice Hasselmann

Segundo Carla Zambelli, a aproximação dela com Bolsonaro se deu após o rompimento da também deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) com o governo. Segundo a parlamentar , Joice a "bloqueava" do contato com o presidente da República e fazia intrigas. "Bolsonaro ficou quatro meses sem falar comigo na campanha por causa da Joice, que inventou mentiras de que eu usava drogas e teria feito um aborto."

As duas foram amigas e participaram juntas do movimento pelo impeachment de Dilma Rousseff. Foi Carla quem abriu espaço para Joice no carro de som do grupo Nas Ruas, o que ajudou a projetar a jornalista paranaense nos grupos de direita. "Quem a trouxe para os movimentos de rua fui eu", assegura a deputada.

"O Bolsonaro nunca gostou da Carla Zambelli. Ele chegou a mandar a Carla descer de um trio elétrico. Ele dizia: ‘Tire essa mulher de perto de mim’. Eu não tive nada a ver com isso", disse Joice, em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo.

Carla Zambelli era gerente de projetos da KPMG em São Paulo quando tornou-se líder do movimento Nas Ruas. Em 2013, conta ela, sua irmã Paula Zambelli assinou um manifesto do Mackenzie contra Bolsonaro. O presidente, depois, chegou a questioná-la. À irmã, Carla disse: "Use outro sobrenome ou vou para o embate com você". Ela conta que o pedido foi acatado. "Minha irmã é de centro-esquerda."

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