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Militares nos arredores do Congresso Nacional: governo Bolsonaro negocia com partidos do Centrão em busca de uma base de apoio na Câmara e no Senado.
Militares nos arredores do Congresso Nacional: governo Bolsonaro negocia com partidos do Centrão em busca de uma base de apoio na Câmara e no Senado.| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O presidente Jair Bolsonaro disse recentemente que dialoga "praticamente com todos os parlamentares". A declaração foi dada em resposta a um questionamento sobre a intensificação de suas conversas com o Centrão, o grupo de deputados e senadores pertencentes a diferentes partidos que, sem conotação ideológica, apoia governos em troca de cargos na estrutura federal. Nas últimas semanas, Bolsonaro tem realizado reuniões com representantes de partidos como PP, Solidariedade, MDB e Republicanos.

O diálogo de Bolsonaro com os membros do Centrão tem como um dos objetivos fazer com que o presidente amplie sua base de apoio no Congresso Nacional — algo que influencia a governabilidade desde o início do mandato — e também colabora para que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com quem o chefe do Executivo trocou farpas em público recentemente, tenha sua influência reduzida dentro do Parlamento.

O impacto da aproximação entre Bolsonaro e o Centrão pode ser traduzido em termos numéricos. Tanto em relação ao número de parlamentares que passaria a votar com o governo, quanto no referente à fatia do Orçamento que pode ficar à disposição de membros do Centrão caso eles e seus apadrinhados passem a comandar diferentes estruturas do governo federal.

Qual o tamanho do Centrão?

A definição do que é exatamente o Centrão não é tarefa simples. Como o rótulo tem caráter pejorativo, os deputados e senadores evitam dizer que fazem parte do grupo. Por exemplo, em entrevista recente à Folha de S. Paulo, o presidente do PSD, Gilberto Kassab, disse: "se um colega seu nos procura e pergunta se nós somos do Centrão e a resposta é não, é porque é não. Os outros partidos sabem que não integramos o Centrão". Kassab foi ministro dos governos de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB), além de vice-prefeito durante a gestão de José Serra (PSDB) em São Paulo.

Apesar da negativa do ex-ministro, o PSD é rotineiramente apontado como sendo um dos partidos que compõem o Centrão. Outras legendas que fazem parte do bloco são PL, PP, MDB, Solidariedade, PTB, Pros, Avante, Republicanos e PSC. Estes partidos não têm bancadas homogêneas — em muitos deles, há integrantes que fazem oposição ao governo e outros que aderem à agenda de Bolsonaro.

O DEM de Rodrigo Maia é uma legenda que exemplifica bem este último caso. Apesar das divergências entre Bolsonaro e o presidente da Câmara, a sigla tem membros que apoiam o governo, e outros que adotam mais o perfil habitual do Centrão. E tem também filiado ao partido o deputado Kim Kataguiri (SP), um dos líderes do Movimento Brasil Livre (MBL), que apresentou um pedido de impeachment de Bolsonaro.

O número de deputados de PL, PP, PSD, MDB, DEM, Solidariedade, PTB, Pros, Avante, Republicanos e PSC é de 261. Um conjunto superior à metade de membros da Câmara dos Deputados (que são 513, no total) e bem maior do que o necessário para barrar um processo de impeachment, temor que voltou a rondar o governo após acusações feitas pelo ex-ministro Sergio Moro.

Um pedido de afastamento não pode tramitar na Câmara se rejeitado por ao menos 172 deputados (um terço das cadeiras da Casa). E além destes integrantes do Centrão, Bolsonaro ainda contaria com grande parte da bancada do PSL, partido pelo qual concorreu na eleição de 2018. O PSL passou por um racha no segundo semestre do ano passado, mas muitos dos seus membros da Câmara prosseguem bolsonaristas.

"Bolsonaro ainda não tem uma base sólida, tanto que ele está chamando o Centrão para conversar. E o Centrão é um grupo muito grande, articulado, que vem participando de governos há anos. Quando esse grupo decide marchar junto, marcha mesmo. E isso pode dar uma boa sustentação ao governo", declarou o deputado Célio Silveira (PSDB-GO).

Segundo o deputado bolsonarista Filipe Barros (PSL-PR), a intensificação do diálogo de Bolsonaro com as lideranças do Centrão é um quadro novo, e que é também reflexo do panorama econômico. "Bolsonaro tem chamado líderes de outros partidos. Antes isso era com a Casa Civil, agora Bolsonaro chamou isso para ele. É um procedimento comum e também necessário, porque nós precisamos aprovar medidas internas para evitar um colapso econômico", apontou.

Barros disse não ver a possibilidade do avanço de um pedido de impeachment. Na sua avaliação, Bolsonaro conta com apoio popular e a ideia não encontraria respaldo no Congresso: "algumas pessoas da oposição querem o impeachment, mas a maioria do Congresso não deseja, porque sabe que isso seria jogar o Brasil ao caos".

O que quer o Centrão?

Bolsonaro se candidatou em 2018 prometendo não repetir práticas da "velha política", como a distribuição de ministérios em troca de apoios no Congresso. E seu primeiro escalão, até o momento, segue nesta diretriz. Os ministros com filiação partidária, como Tereza Cristina (Agricultura-DEM), Onyx Lorenzoni (Cidadania-DEM) e Ricardo Salles (Meio Ambiente-Novo), foram selecionados para o posto como escolhas de Bolsonaro, não como indicações dos partidos.

Mas a distribuição de postos de comando pode ainda assim se efetivar, em cargos de segundo e terceiro escalões. Levantamento feito pelo jornal O Estado de S. Paulo apurou que o governo negocia com lideranças do Centrão diretorias do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), entre outros órgãos. Também o Porto de Santos (SP) estaria à mesa: o deputado federal Paulinho da Força (SP), que é presidente nacional do Solidariedade, disse que a gestão do estabelecimento foi oferecida ao seu partido.

Integrantes do Centrão estariam também de olho no Ministério da Ciência e Tecnologia, que é atualmente comandado pelo astronauta Marcos Pontes. Durante o governo de Michel Temer, a pasta teve como titular Gilberto Kassab.

Reportagem da BBC Brasil identificou que os cargos em negociação envolvem um orçamento superior a R$ 68,5 bilhões para 2020, sendo que destes R$ 10,6 bilhões não estão "carimbados" com destinações específicas. A conta se refere a Dnit, Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs), Codevasf, Funasa, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Banco do Nordeste e duas secretarias do Ministério da Saúde. As entidades são cobiçadas pelas lideranças políticas por serem responsáveis por obras de grande visibilidade, o que pode representar retornos eleitorais.

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