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Relações Exteriores

Comissão de relações exteriores pode atrapalhar parcerias de Lula com a China e barrar ONGs

Comissão presidida pelo deputado Filipe Barros (PL-PR) (foto) pode atrapalhar parcerias de Lula com a China e barrar ONGs.
Comissão presidida pelo deputado Filipe Barros (PL-PR) (foto) pode atrapalhar parcerias de Lula com a China e barrar ONGs. (Foto: Alan Santos/Câmara dos Deputados)

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A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (Credn) será presidida neste ano pelo aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), deputado Filipe Barros (PL-PR). A comissão tem entre as suas atribuições o papel de debater e votar tratados, atos, acordos e convênios internacionais firmados pelo Executivo com outros países. Ela também trata da autorização para que o presidente ou o vice-presidente da República possam se ausentar do território nacional por mais de 15 dias.

Além disso, uma série de propostas que tratam de relações diplomáticas e de política de defesa nacional, incluindo atividades de informação e contrainformação e assuntos das Forças Armadas, podem ser temas da comissão. 

Diante do pedido de licença do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Barros deve ser um ponto de contato com o colega licenciado. Analistas ouvidos pela Gazeta do Povo avaliam que o deputado paranaense deve direcionar a pauta prioritária da comissão para temas de relevância política da agenda de aliados do ex-presidente Bolsonaro e obstrução de temas de interesse do governo. 

Um dos indicativos de como será a atuação de Barros foi destacado pelo próprio Bolsonaro em entrevista para a Revista Oeste. “O grande problema dessa comissão são os [mais de] 37 memorandos e acordos assinados entre o Brasil e a China. Um dos mais importantes ali é de mineral estratégico: urânio. A China não tem esse material suficiente e vieram aqui para buscar o nosso urânio”, disse o ex-mandatário ao se referir a atos assinados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em novembro do ano passado. 

Em seu discurso de posse, Barros também indicou que atuará contra a ingerência de ONGs estrangeiras que estariam pautando o debate e as ideias no Brasil, colocando em risco a própria democracia.

“As relações internacionais têm que ser pautadas, sobretudo, na ideia de Estados-nações fortes, culturalmente soberanos. Mas, hoje, infelizmente, não é ao que assistimos no Brasil nas últimas décadas, onde fundações internacionais usam seu poderio econômico para influenciar a política local. Acabamos de assistir, por exemplo, ao escândalo da Usaid. E já é público o quanto ONGs pautam a circulação de ideias no Brasil”, destacou o novo presidente da Comissão. Barros é autor de um projeto de lei limitar investimentos estrangeiros em ONGs no Brasil. A proposta já foi tema de reportagem da Gazeta do Povo.

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Atos assinados por Lula fortalecem proximidade com a China, mas podem ser barrados pela Credn 

Em novembro de 2024, quando o líder da China, Xi Jinping, esteve no Brasil, quase 40 atos foram assinados entre os países. Eles tratam desde temas relacionados a cultura e educação até mineração e infraestrutura. Na oportunidade, o secretário de Ásia e Pacífico do Ministério das Relações Exteriores, Eduardo Paes Saboia, disse, em entrevista à imprensa, que a ocasião confirmava a “elevação da parceria política bilateral” entre o Brasil e a China.

Entre os memorandos, há parcerias entre a Telebras, empresa vinculada ao Ministério das Comunicações do Brasil e a SpaceSail. A promessa é que a empresa chinesa preste serviços de internet via satélite nos moldes da Starlink. No entanto, a SpaceSail não deve atender o território brasileiro tão cedo, já que o serviço sequer está em funcionamento na China.

Há também a previsão de cooperação entre a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e a China Media Group, uma instituição chinesa de rádio e televisão estatal. Apesar de o acordo prever formalmente a troca de conteúdo entre as partes, o presidente da EBC, Jean Lima destacou à Agência Brasil que a comunicação pública e governamental tem como prioridade o combate à desinformação, indicando que o tema também deve ser parte das trocas entre as estatais. “É preciso reverter esse processo [da desinformação], que tanto enfraquece o sistema político, polariza as relações e abala as instituições democráticas”, afirmou Lima. A China é conhecida por operar mundialmente fortes iniciativas de desinformação e propagação de notícias falsas.

Os atos, no entanto, podem ser barrados pelo Congresso. Na Câmara, a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (Credn) tem a atribuição de debater tratados, atos, acordos e convênios internacionais e demais instrumentos de política externa.  

Os acordos assinados entre o Brasil e a China em novembro ainda não foram enviados à Câmara e, na prática, isso pode demorar anos para acontecer. Nos bastidores, membros da oposição avaliam que a posse de Barros como presidente pode postergar esse envio. Há ainda a possibilidade de que esses atos sequer sejam enviados para apreciação dos parlamentares.

De acordo com a diretora de Relações Governamentais da BMJ Consultores Associados, Rebeca Lucena, “os atos internacionais somente serão apreciados pelo Congresso Nacional se acarretarem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional”.

A Gazeta do Povo questionou o Ministério das Relações Exteriores sobre o envio dos atos ao Congresso, mas não recebeu retorno até o fechamento da matéria. 

Apesar disso, a oposição pode apresentar propostas para sustar os atos promulgados pelo Executivo, a exemplo do que aconteceu com um decreto do presidente Lula que fez com que o Brasil aderisse novamente à União de Nações Sul-Americanas (Unasul).

Comissão de Relações Exteriores já aprovou a suspensão da adesão do Brasil à Unasul 

Em dezembro do ano passado, a Comissão de Relações Exteriores aprovou, a suspensão da adesão do Brasil à União de Nações Sul-Americanas (Unasul), estabelecida no Decreto 11.475/23. Em 2019, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), havia oficializado a retirada do Brasil do organismo, mas, ao assumir a presidência novamente em 2023, Lula retomou a adesão.

A Unasul foi fundada em 2008 por doze presidentes da época, a maioria deles de esquerda, entre os quais Cristina Kirchner (Argentina), Evo Morales (Bolívia), Michelle Bachelet (Chile), Rafael Correa (Equador), Hugo Chávez (Venezuela) e o próprio Lula. Os integrantes do órgão usaram o fórum para discutir a utilização de recursos e mecanismos para aumentar o realinhamento social, econômico e político dos países-membros com um viés predominante de esquerda.

Segundo o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), um dos autores da proposta para suspender a adesão à Unasul, precisaria haver novo decreto legislativo aprovando a participação do Brasil. "Toda e qualquer alteração em um tratado previamente aprovado pelo Parlamento brasileiro deve ser objeto de nova apreciação, o que se dirá de um novo comprometimento do Estado com uma mesma organização internacional, da qual era parte anteriormente", observou. 

A proposta ainda precisa ser aprovada também na Comissão de Constituição e Justiça antes de seguir para o Plenário. A relatora da proposta na CCJ é a deputada Caroline De Toni (PL-SC). Para virar norma legal, o decreto legislativo precisa ser aprovado pela Câmara e pelo Senado.

Oito membros do PL foram escalados para compor a Credn 

Do total de 38 membros da comissão, o presidente Filipe Barros contará com oito deputados do PL como membros da comissão. Dentre os escalados estão: delegado Ramagem (PL-RJ), general Girão (PL-RN), Gustavo Gayer (PL-GO) e o líder da oposição, Zucco (PL-RS), que foi cotado para assumir a presidência da Credn.

Na comissão, os deputados poderão propor debates e analisar propostas. Além disso, poderão aprovar requerimentos convocando ministros e autoridades para prestar esclarecimentos sobre assuntos de interesse dos deputados membros.  

Também é comum que deputados apresentem requerimentos de informação para que ministros e autoridades esclareçam pontos sobre determinadas situações ou políticas públicas.  

Os requerimentos de informação têm sido usados com frequência pela oposição para pressionar o governo a fornecer dados e esclarecer pautas apresentadas. Somente em 2025 o líder da oposição Zucco, por exemplo, apresentou mais de 40 requerimentos de informação. Os mais recentes buscam informações sobre os repasses de ministérios feitos para a Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI). No começo de março, a OEI ganhou destaque por um acordo de R$ 478,3 milhões firmado pelo governo Lula para organização da COP-30. 

O reforço da base aliada do ex-presidente Bolsonaro na Comissão deve se somar ao apoio de Eduardo Bolsonaro, que é ligado ao novo presidente da Comissão. A ligação entre Filipe e Eduardo foi evidenciada pelo ex-mandatário em entrevista para a Revista Oeste. “O contato e a afinidade do Eduardo com o Filipe Barros é muito grande. Pode ter certeza que o Filipe terá sua autonomia na comissão, mas sempre vai se manter antenado com o Eduardo”, disse Jair Bolsonaro. 

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