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Lula tentará explorar questão ambiental para se promover na COP28| Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está apostando alto na COP 28 (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima), o evento mais importante do ano em termos das discussões ambientais e climáticas que começa nesta quinta-feira nos Emirados Árabes Unidos. Mas ao mesmo tempo em que tenta se vender como líder ambiental internacional, Lula tenta esconder fatos que contradizem seu discurso. Entre eles estão seu apoio à exploração de petróleo na Amazônia, o aumento de queimadas no país e o a ideia de financiar o gasoduto na Argentina.

Especialistas apontam que as discussões ambientais devem ser exploradas pelo Brasil como um meio para se tornar uma potência mundial, já que o país possui os recursos necessários para se tornar um porta-voz no assunto. Entre esses recursos estão uma rede de geração de eletricidade baseada em energia hidrelétrica e potencial para exploração de energia solar e eólica. O evento deve ser usado também por Lula para preparar a COP30, que deve ser realizada no Brasil em 2025.

Mas enquanto Lula ressalta essas características no discurso, na prática se envolve em uma série de contradições ao apoiar decisões que vão contra os ideais de ambientalistas e de sua própria ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

As críticas a Lula têm vindo até de alas do PT, especialmente em relação à exploração de petróleo na costa próxima à Amazônia, que é chamada de Margem Equatorial.

"A princípio sou contrário à exploração de petróleo na região. E a partir do momento em que a Petrobras realize tudo que o Ibama pede do ponto de vista dos estudos necessários para [explorar] uma região sensível, quero ser convencido da segurança para fazer a exploração de Petróleo [na Bacia do Foz do Amazonas]", disse à TV Câmara o deputado Nilto Tatto (PT-SP), que preside a frente parlamentar ambientalista da Câmara e é titular da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

Até ativistas de esquerda se voltaram contra Lula. “Se os planos do governo na Margem Equatorial se concretizarem, quando as pessoas pensarem no Brasil depois desse mandato, poderão pensar no país que promoveu um avanço vertiginoso do petróleo sobre a Amazônia e seus povos, em pleno 2023, ano em que os impactos da crise climática assolaram a população brasileira”, afirmou Marcelo Laterman, porta-voz da frente de Oceanos da ONG Greenpeace Brasil.

A exploração do petróleo na costa amazônica pode trazer desenvolvimento para o país oferecendo riscos ambientais aceitáveis, segundo o analista Armando Cavanha, orientador acadêmico na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e autor do canal sobre energia Cavanha.com. "Todos os países exploram ao máximo seus recursos naturais. Por que o Brasil não pode fazer o mesmo? Fico desgostoso ao saber que essa exploração está sendo dificultada", afirmou.

Mas, por mais benéfica que seja para o Brasil, não se encaixa no discurso internacional de Lula e o presidente deve evitar o tema o máximo possivel.

Segundo Eduardo Lunardelli Novaes, ex-secretário de Clima do Ministério do Meio Ambiente do governo de Jair Bolsonaro (PL) a contradição está mais na ministra Marina Silva. "Ela sequer consegue se entender com o próprio chefe dela, que é o Lula. Enquanto ele quer explorar reservas naturais que são estratégicas para independência do país, ela é contra por motivos que me parecem exclusivamente políticos e pautados pela agenda verde. O próprio governo não se entende", afirmou.

Emirados Árabes sediam cúpula mas também escondem crimes ambientais

No evento que acontece em Dubai e recebe milhares de visitantes do mundo inteiro entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro, Lula leva a maior comitiva brasileira da história: são cerca de 12 ministros, dezenas de empresários, cientistas, ativistas e parlamentares, além da primeira-dama, Rosangela da Silva — em uma demonstração da importância do evento para seu governo. As reuniões de chefes de Estado começam na sexta (1).

Mas o Brasil comandado por Lula não será o único país da cúpula que tentará manter seus crimes ambientais e exploração de combustíveis fósseis bem distante dos holofotes. Os Emirados Árabes Unidos tentam se evadir de provas exibidas na imprensa internacional de que continuam promovendo a queima de gases tóxicos provenientes da extração de petróleo, que havia sido banida há 20 anos, e poluem o ar em todo o Golfo Pérsico.

Além disso, o próprio presidente da cúpula, Sultan al-Jaber, é também o chefe da petroleira estatal. Documentos diplomáticos vazados recentemente mostram que a equipe dele quer aproveitar a cúpula para fechar nos bastidores novos acordos de venda de petróleo, que é considerado fonte não renovável de energia e poluente.

Indo contra ambientalistas, Lula apoia exploração de petróleo na Amazônia 

Enquanto Lula utiliza a Amazônia como seu portfólio para o mundo, o petista não deve dar destaque ao projeto de exploração de petróleo na Bacia da Foz do Amazonas — o qual o brasileiro tem se demonstrado a favor. O tema tem sido motivo de impasse nos últimos meses entre Lula e Marina Silva, além de não ser consenso entre os países membros da OTCA (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica).

A Petrobras descobriu que a região chamada de "Margem Equatorial" tem um potencial de exploração aproximado de 8 bilhões de barris de petróleo. Para se ter ideia, o Pré-Sal tem uma reserva estimada em 10 bilhões de barris. A petroleira tem buscado ter o aval do Ibama para perfurar um poços em uma área no Amapá, que é banhada pela Bacia da Foz do Amazonas. A empresa, contudo, recebeu uma negativa do órgão em maio.

O Ibama alegou que o pedido foi negado porque não havia garantias suficientes de que a Petrobras conseguiria proteger a fauna da região caso houvesse vazamento de petróleo de óleo ou outros incidentes. Com apoio de membros do governo, inclusive do ministério de Minas e Energia, a Petrobras fez um novo pedido à entidade que ainda está sob análise.

Em agosto, a Advocacia-Geral da União (AGU) divulgou ainda um parecer sobre o tema sugerindo que os empecilhos encontrados pelo Ibama no pedido fossem mediados através de um acordo com a Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal (CCAF). A decisão foi criticada por Marina Silva, que alegou que as dificuldades encontradas pelo Ibama “não pode ser negociadas”. Lula, por outro lado, veio à público dizer que não se deve impedir as “pesquisas” sobre a possibilidade de exploração de petróleo na região.

"Se encontrar a riqueza que se pressupõe que exista lá, aí é uma decisão de Estado se você vai explorar ou não. Mas veja, é uma exploração a 575 quilômetros à margem do [Rio] Amazonas. Não é uma coisa que está vizinha do Amazonas", defendeu o petista após ser questionado por jornalistas em coletiva do G20.

O tema também foi discutido na Cúpula da Amazônia na primeira semana de agosto, evento que foi promovido por Lula. O encontro contou com a presença dos oito países amazônicos (Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia, Guiana, Venezuela e Suriname) e evidenciou a falta de consenso entre eles sobre o tema. Enquanto Brasil, Venezuela, Guiana e Suriname não descartam a possibilidade de explorar o petróleo na região, outros países se posicionaram contra.

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, inclusive, chegou criticar o apoio de Lula ao desejo da Petrobras. Devido à crise já instalada nos últimos meses e o mal-estar gerado com outros países devido ao tema, o assunto deve ficar longe dos discursos de Lula na COP 28.

Desmatamento caiu, mas as queimadas aumentaram na Amazônia 

O governo tem apostado que Lula pode ganhar um papel de destaque na COP ao levar para o evento números que apontam para suposta uma redução no desmatamento na Amazônia nos últimos meses. Em dados apresentados por Marina Silva nos últimos dias, o desmatamento na região teve uma queda de 42% entre julho e agosto deste ano.

No evento em que apresentava os números coletados nos meses citados, a ministra pontuou que uma área de cerca de 9 mil km² havia sido desmatada na Amazônia e culpou Bolsonaro pelo número. “[O governo Lula pegou] um passivo de 6 mil quilômetros [quadrados de área desmatada] do governo Bolsonaro que estará sendo computado para o desmatamento de 2023”, disse em coletiva.

Em Dubai, Lula deve aproveitar o momento para pontuar as diferenças entre o seu governo e de Bolsonaro, sobretudo no que diz respeito às taxas de desmatamento. Os números sobre queimadas, contudo, não devem aparecer nos dados levados para o país já que o mês de outubro fechou com uma alta de 60% de focos de incêndio no bioma amazônico.

De acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o bioma da Amazônia teve 22.061 focos de incêndio em outubro deste ano — 8.150 casos a mais do que o registrado no mesmo mês do ano anterior. Somente o estado do Amazonas teve 3.858 focos de incêndio, o maior número para o mês na região desde 1998, quando começou a série histórica do Inpe.

Já o estado do Pará registrou 11.378 focos de incêndio no último mês. O número foi o maior registrado nesta época desde 2008, quando 11.568 focos de incêndio foram computados. Em uma tentativa de dissociar os números de sua gestão, Lula tem acusado o ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro de ser um dos culpados do aumento dos focos de incêndio no bioma.

Lula também tenta se esquivar do tema do desmatamento no Cerrado, que bateu recordes nos sete primeiros meses do ano. Segundo levantamento do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter) divulgado nesta quinta (3), houve um aumento de 21% nos avisos de desmate.

Exploração por fracking que governo quer financiar também é criticada por ambientalistas

Outro tema que coloca Lula em uma saia justa com ambientalistas é o interesse do governo em financiar a conclusão das obras do Gasoduto Néstor Kirchner, na região de Vaca Muerta, na Argentina. Nos últimos meses, o petista anunciou diversas maneiras de tentar ajudar seu amigo e então presidente da Argentina, Alberto Fernández, a superar a crise que o país enfrentava. Em uma dessas soluções, o financiamento para o gasoduto que extrai gás natural.

A instalação está localizada na região de Vaca Muerta, uma formação geológica localizada no norte da Patagônia, na Argentina, e promete garantir autossuficiência energética ao país em até dois anos. As negociações entre os dois países previam que o Brasil, através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Sustentável (BNDES), financiasse uma aporte de milionário para concluir as obras da região. A ideia apoiada por Lula, contudo, desagrada ambientalistas.

A obra utiliza a extração de gás natural por meio do método de fracking, é considerada extremamente agressiva ao meio ambiente. Utilizando largas quantidades de água para o método de extração, a técnica utiliza produtos químicos e areia para fraturar a rocha onde está "aprisionado" o recurso energético. Isso causa um uso muito alto de água e pode comprometer lençois freáticos.

O financiamento do trecho de cerca de 467 km do gasoduto foi tema de diversas conversas entre Lula e Fernández, além das trocas entre os ministério de Relações Exteriores de ambos países. As discussões, contudo, ainda não saíram papel.

Apesar desse método de extração ser considerado poluente, o gás natural não é necessariamente considerado um combustível poluente. Analistas de energia mais pragmáticos apostam nele como uma boa opção para possibilitar a transição da matriz energética mundial de combustiveis fósseis para energia verde.

Além disso, hoje o Brasil importa gás natural da Bolívia, mas as reservas do país vizinho estão acabando e o fornecedor terá que ser substituído no futuro, segundo o analista Armando Cavanha.

Ainda que nenhum acordo concreto tenha sido firmado com a Argentina, figuras como Marina Silva e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já fizeram declarações repudiando a obra. Para Marina, o empreendimento envolve "riscos socioambientais significativos a serem considerados”. Já Haddad pontuou que "a discussão ambiental não deve ser desconsiderada sobre a utilização do gás de xisto". O tema também não deve aparecer entre as pautas levadas pela comitiva brasileira para a COP28.

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