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OCDE Odebrecht
Em setembro, Toffoli decidiu anular provas de acordo da Odebrecht e disse que prisão de Lula foi “erro judiciário”| Foto: Carlos Moura/STF

A anulação das provas do acordo de leniência da Odebrecht no âmbito das investigações da operação Lava Jato pelo ministro Dias Toffoli, em setembro, causou preocupação na OCDE, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. O chamado “clube dos ricos” divulgou um relatório nesta quinta (19) em que avalia os esforços do Brasil para implementar medidas de combate ao suborno transnacional.

O Brasil é signatário da Convenção Contra o Suborno Transnacional desde 2002 – foi criada em 1999 –, e vem sendo avaliado a cada período de tempo sobre a implantação de medidas para coibir que empresas multinacionais paguem propinas em outros países. Esta é a quarta avaliação do país no grupo.

Ao longo do último governo, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tinha como uma das principais bandeiras fazer o Brasil se tornar um membro pleno da OCDE, ato que ainda é discutido pelo Ministério das Relações Exteriores sob Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O grupo de trabalho da Convenção esteve no Brasil em meados de maio para estudar as medidas implantadas, e avaliou que apenas 28 de 60 denúncias de suborno estrangeiro identificadas foram de fato investigadas desde o início da operação Lava Jato, em 2014.

O relatório que a Gazeta do Povo teve acesso (veja na íntegra) elogia a atuação do Brasil na “aplicação da lei durante a operação Lava Jato”, ressaltando as 60 denúncias identificadas, mas afirma que “em setembro de 2023, uma decisão do STF [Supremo Tribunal Federal] levantou dúvidas sobre a validade do acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor), e a empresa entrou com um pedido para afirmar a validade do acordo junto ao STF. A decisão também gerou preocupações em outros países do Grupo de Trabalho”.

“[Os examinadores líderes] recomendam que o Grupo de Trabalho faça um acompanhamento sobre as possíveis consequências da recente decisão de um juiz do STF em relação a evidências obtidas no âmbito do acordo de leniência da Odebrecht, principalmente no que diz respeito à sua certeza jurídica, e sobre as possíveis consequências dessa decisão na capacidade do Brasil de fornecer e obter assistência jurídica mútua em casos de suborno estrangeiro”, avança o relatório.

Em outro trecho da conclusão, os examinadores expressam preocupação de que o Brasil negligenciou ou subutilizou parte dos documentos apurados durante a investigação, como relatórios corporativos, encaminhamentos de autoridades estrangeiras ou relatórios da mídia e informações compiladas pelo Grupo de Trabalho. Isso, diz a entidade, sugere uma “falta de capacidade para detectar e reagir a alegações de suborno estrangeiro provenientes de outras fontes”.

“Embora o Brasil deva ser elogiado por sua capacidade de coletar dados sobre suas fontes de detecção, esses dados destacam a necessidade de o Brasil ser mais proativo em seus esforços de detecção e métodos, incluindo o estabelecimento de um maior engajamento entre agências governamentais”, afirmam os examinadores.

A apuração da OCDE é apontada pela oposição a Lula como uma “vergonha internacional”. O ex-deputado Deltan Dallagnol (Novo-PR), que atuava como procurador federal durante a operação, afirmou que “a cada dia que passa as narrativas contra a Lava Jato vão caindo e provando, mais uma vez, que a operação seguiu a lei e fez o certo”.

“Toffoli faz o Brasil passar vergonha internacional com sua decisão esdrúxula de anular provas da leniência da Odebrecht. OCDE está preocupada com impacto da decisão de Toffoli nos acordos de leniência e na capacidade de cooperação internacional do Brasil”, disse nas redes sociais.

Já o ex-juiz Sergio Moro (União Brasil-PR), que foi responsável pelo julgamento das ações penais da Lava Jato antes de ser nomeado ministro de Bolsonaro, preferiu não se pronunciar sobre o relatório.

Em meados de setembro, Toffoli decretou a nulidade de todos os atos relacionados ao acordo de leniência firmado pela Odebrecht em uma decisão “monocrática”, alegando que as provas estavam contaminadas e afetavam outras investigações em andamento no STF.

Ele declarou que as provas obtidas a partir do Acordo de Leniência da Odebrecht, bem como os sistemas Drousys e My Web Day B, e todos os elementos relacionados a eles, são “imprestáveis” em qualquer âmbito jurídico.

A decisão teve origem nas provas obtidas durante a Operação Spoofing, que revelou uma organização que invadiu contas de Telegram de autoridades brasileiras e pessoas ligadas à Lava Jato. Esse episódio ficou conhecido como “vaza jato” e envolveu o hacker Walter Delgatti Neto, que vazou supostos diálogos entre Moro e procuradores da Lava Jato.

A medida impactou diretamente o maior acordo de leniência já firmado no mundo entre uma empresa privada e o poder público, envolvendo a Odebrecht e investigações de corrupção em 12 países da América Latina, Caribe e África. A empresa se comprometeu, na época, a pagar uma multa de US$ 3,5 bilhões, segundo expressa a OCDE no relatório.

Toffoli tem uma história de ligação com o Partido dos Trabalhadores (PT) e o sindicalismo brasileiro, o que acrescenta um componente político à decisão. A nulidade dos atos ligados ao acordo da Odebrecht deve gerar debates e reações nos próximos dias.

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