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Embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zonshine, durante homenagem ao Estado de Israel pelos 75 anos decorridos desde sua criação.
Embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zonshine, durante homenagem, no Senado Federal, ao Estado de Israel pelos 75 anos decorridos desde sua criação.| Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

O embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zonshine, disse, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo que acha “estranho” como o governo brasileiro tem lidado com os discursos antissemitas e pró-Hamas que têm sido proferidos nas redes sociais e por políticos nos últimos dias.

"Nós pensamos que matar crianças, bebês, mulheres, decapitar, estuprar, além de atacar civis em suas casas e queimar tudo, é terrorismo. O governo brasileiro não pensa assim. Pelo menos pelas palavras que usaram", disse o Zonshine.

O Ministério das Relações Exteriores e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificaram os assassinatos de civis em Israel como terrorismo no sábado (7), quando os ataques começaram. Mas o governo brasileiro em nenhum momento reconheceu o Hamas, responsável pelos atentados, como uma organização terrorista. O argumento usado foi que a definição não é adotada pelo Conselho de Segurança da ONU.

Apesar de entender que o atual governo tem opiniões e formas diferentes de tratar desse tema, o embaixador enfatizou que a definição do governo brasileiro sobre o que é terrorismo é bastante controversa.

Ele classificou ainda como vergonhoso para todos os brasileiros o fato de haver, no país, partidos políticos que apoiam e tratam um grupo terrorista como o Hamas como "movimento" pró-libertação da Palestina.

Segundo Zonshine, muitas pessoas não israelenses estão se oferecendo para combater por Israel, mas por enquanto a ajuda deles ainda não é necessária. Ele contou que os telefones da Embaixada de Israel no Brasil estão recebendo centenas de ligações de voluntários que estariam dispostos a lutar contra o Hamas.

Confira, a seguir, a entrevista na integra

Gazeta do Povo - Como o senhor interpreta algumas colocações anti-Israel que vêm saindo, inclusive na imprensa, como a de um jornalista chamado Breno Altman, do site Opera Mundi, que comparou Israel a ratos. Em uma de suas publicações, ele disse que, neste momento, não importa a cor dos gatos, desde que se cacem os ratos. Como o senhor avalia essa declaração?

Embaixador Daniel Zonshine - Acho que dizer que é importante o que fez o Hamas, isso é uma coisa que não conseguimos entender. Digamos, os métodos do Hamas não são humanos. Não que haja uma maneira humana de matar alguém, mas matar crianças e todas as imagens que vimos de lá, e ainda vemos, a cada dia mais, mais histórias, mais atrocidades que são reveladas. Falar sobre o Hamas como um movimento nacional de libertação... Acho que ninguém pode dizer isso sem fechar os olhos de uma maneira bem forte. O que eles fizeram não é coisa de humanos. Estupro de mulheres, mataram bebês, passaram de uma casa para outra, queimaram casas. Isso de nenhum jeito melhora a vida das pessoas. Não é uma maneira de promover a causa da Palestina, só trouxe mais sangue e sofrimento, tanto no lado israelense quanto no lado palestino. Essa é a verdadeira natureza deles. Nesta sexta-feira, nós vimos também a chamada do líder do Hamas para matar judeus e israelenses... Isso é para liberar a Palestina? Isso é para fazer uma barbárie pura.

Gazeta do Povo - O senhor tem visto também alguns discursos antissemitas, não só relacionados ao não repúdio ao Hamas, mas esses discursos vindos de alguns grupos ou mesmo de alguns partidos de esquerda, como o PCO e o PSTU, que se manifestaram em alguns locais do Brasil, proferindo discursos contra Israel e até a favor do Hamas.

Zonshine - Não sei de que maneira uma pessoa humana pode apoiar esses atos do Hamas. O Hamas provou ser uma organização terrorista. Promover a causa palestina não está entre as metas do Hamas. Só criou sofrimento. O que eles fizeram é algo que não pode ser aceito por nenhuma sociedade humana. Acho que temos que diferenciar quem apoia a causa palestina e quem apoia as atrocidades que o Hamas cometeu.

Eu acho que isso não é aceitável. É como cegos que não querem ver o que acontece na área. Isso é uma vergonha para esses partidos. É uma vergonha para o povo brasileiro que exista esse tipo de partido.

Gazeta do Povo - Além de partidos, nós vimos alguns movimentos, grupos, falando de lobby sionista, dizendo que eles são resistência a esse lobby. Os senhores têm mapeado esse tipo de discurso e pretendem tomar alguma atitude em relação a isso?

Zonshine - Não sei se é legalmente possível tomar medidas contra isso. Pessoas desse tipo existem em todas as sociedades, inclusive na sociedade israelense. Teremos que consultar organizações de direitos humanos para ver se há ações que podem ser tomadas contra esse tipo de declaração.

Gazeta do Povo - Alguns analistas da Escola do Comando e Estado Maior do Exército Brasileiro nos disseram que há a possibilidade de surgirem no Brasil foreign fighters, guerrilheiros estrangeiros, dispostos a viajar para Gaza e apoiar os terroristas do Hamas. Segundo os analistas, esse fenômeno acontece quando as pessoas se sentem frustradas ou não têm suas expectativas atendidas pelo governo local e acabam sendo seduzidas por essa propaganda terrorista. Como o senhor avalia esse cenário?

Zonshine - Eu não sei se as pessoas vão sair daqui, como saíram do mundo ocidental para ajudar o ISIS (sigla em inglês para o Estado Islâmico do Iraque e Síria). O movimento do ISIS envolveu matar, decapitar ou queimar pessoas, entre outras coisas horríveis que vimos. Eu acho que é melhor que as pessoas permaneçam aqui e que não viajem para ajudar a Faixa de Gaza. Lá não é o melhor lugar do mundo neste sentido, neste momento.

Gazeta do Povo - O senhor imagina então que isso não vá acontecer, é isso?

Zonshine - Eu não sei. Se alguém quiser chegar lá, terá que entrar pelo Egito. Tentar chegar à Faixa de Gaza agora eu acho que é uma loucura. Creio que seja coisa de pessoas com a cabeça um tanto problemática.

Gazeta do Povo - Está havendo mobilização de reservistas aqui na América do Sul para combater ao lado de Israel?

Zonshine - Israelenses que estão aqui no Brasil ou em outros países, de férias ou visitando suas famílias, foram convocados pelo exército. Eles agora estão procurando uma maneira de chegar a Israel para estar com amigos e familiares, e entre eles também há reservistas das forças de trabalho israelenses. Nós vamos ajudá-los a chegar a Israel, pois estamos enfrentando uma campanha que não é fácil. Uma campanha para desestimular o Hamas a repetir essa operação, por assim dizer. Temos que realizar uma ação que eles não vão esquecer por muito tempo.

Gazeta do Povo - Somente reservistas realmente serão convocados, ou Israel procurará ou aceitará voluntários não israelenses para formar uma legião internacional, como ocorreu na Ucrânia?

Zonshine - Acho que isso não vai acontecer. Espero que não tenhamos necessidade disso, mas percebemos muitas pessoas voluntárias que querem ajudar Israel de qualquer maneira possível. Os telefones não param de tocar até agora.

Gazeta do Povo - Em outros países, vocês têm verificado essa mesma disponibilidade de voluntários querendo ajudar Israel?

Zonshine - O apoio que as forças israelenses estão recebendo é muito forte, mas até agora não é em termos de pessoal. Até o momento, temos recebido apenas fornecimento de armas dos Estados Unidos para abastecer nossos arsenais.

Gazeta do Povo - O senhor se reuniu com alguns deputados brasileiros nesta semana. Quais foram os temas dessa conversa?

Zonshine - Falamos sobre a solidariedade deles com Israel e a disposição deles para ajudar onde e quando for possível.

Gazeta do Povo - A nossa oposição aqui no Congresso está querendo votar um projeto de lei para classificar o Hamas como terrorista. Na prática, isso, na verdade, é simbólico, porque somente o Poder Executivo pode tomar essa decisão. Mas como o senhor avalia essa iniciativa?

Zonshine - Eu acho que o projeto de lei é algo positivo. Tem bastante apoio no parlamento e na sociedade brasileira. Nós também apoiamos essa iniciativa.

Gazeta do Povo - O Brasil atualmente preside o Conselho de Segurança da ONU, e ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse ter conversado com o presidente de Israel, sugerindo um corredor humanitário. Como isso está sendo tratado? Como vocês veem essa questão?

Zonshine - Os dois presidentes conversaram ontem. Esta manhã, os dois chanceleres também se falaram, e o assunto humanitário foi discutido. Existe uma espécie de coordenação entre as autoridades de Israel e do Brasil para determinar que tipo de cooperação é necessária neste momento.

Gazeta do Povo - Como o senhor avalia o posicionamento do governo brasileiro e de alguns políticos brasileiros, falando sobre os ataques sem mencionar ou condenar o Hamas?

Zonshine - Para mim, isso é muito estranho. Estranho nem é uma palavra forte o suficiente. Há pessoas que apoiam o Hamas após o que vimos, tudo o que aconteceu. Não se trata apenas de métodos, é a natureza da própria organização terrorista. E quanto ao governo brasileiro? Temos diferentes opiniões sobre definições. Cada um tem sua própria maneira de definir as coisas. Nós pensamos que estuprar mulheres e matar crianças, bebês, mulheres, decapitar... Atacar civis em suas casas e queimar tudo... Isso é terrorismo. O governo brasileiro não pensa assim, pelo menos pelas palavras que usaram.

Gazeta do Povo - Na Guerra de Gaza em 2014, o Brasil considerou apenas o lado palestino, sem considerar os três adolescentes que foram mortos e que desencadearam uma operação na Faixa de Gaza. [O Brasil no governo de Dilma Rousseff convocou seu embaixador, em um sinal que é considerado um gesto de protesto. O episódio fez Israel classificar o Brasil de "anão diplomático"]. O senhor acha que o episódio da convocação do embaixador do Brasil em Israel pode se repetir?

Zonshine - Acredito que não e espero que não. Não sei o que o futuro reserva. Agora, com esta guerra, espero que o público brasileiro e as autoridades brasileiras entendam com quem temos que lidar lá e que tipo de ações são necessárias para enfrentar essas organizações. O Hamas construiu uma série de túneis abaixo da área de guerra. Agora eles começaram a lançar mísseis contra Israel. Enquanto isso, os líderes estão abaixo da terra, dentro dos túneis, e o povo está lá em cima sofrendo. Houve vítimas devido às tentativas de impedir esses lançamentos de mísseis e ainda há confrontos em alguns lugares. Eles começaram em algumas áreas ao longo da fronteira com o Líbano - que é outra história, não se trata do Hamas, mas sim do Hezbollah. O Hezbollah também está atacando Israel no Norte. O Hezbollah é mais forte que o Hamas. Esperamos que eles não abram mais uma frente contra Israel.

Gazeta do Povo - O senhor tem alguma outra questão a acrescentar, especialmente em relação a esses posicionamentos antissemitas?

Zonshine - Bem, o antissemitismo existe. Ele existe aqui, às vezes abaixo da superfície. Mas, em momentos como esses conflitos, algumas pessoas sentem que devem expressar o antissemitismo. Isso não é algo positivo, mas sabemos que existe. Da mesma forma que o líder do Hamas convocou o assassinato de judeus e israelenses, isso está incentivando outras pessoas a saírem de suas casas e falar dessa maneira.

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