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O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigoa Maia, com a bíblia ao fundo . Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem poder para abrir processo que pode cassar o presidente da República. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil| Foto:

Jair Bolsonaro mal completou três meses de governo e já é alvo de solicitações de impeachment. Culpa, em parte, das polêmicas criadas pelo próprio presidente. Mas a apresentação de pedidos de cassação do chefe do Executivo é mais comum do que se imagina. Virou prática corriqueira desde a promulgação da Constituição Federal, em 1988, e da eleição direta para presidente da República, no ano seguinte.

Até o mês passado foram protocolados três pedidos de impeachment de Bolsonaro na Câmara dos Deputados: um pela divulgação de um vídeo celebrando a ditadura militar, outro pelo caso do vídeo obsceno de carnaval e um terceiro (já arquivado) cujo teor não foi informado pela Câmara.

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Mais grave que o pedido de cassação em si é o fato de que isso põe o futuro de Jair Bolsonaro nas mãos de um político com quem o chefe do Planalto vem trocando farpas e provocações seguidas de reconciliações: o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Todos os pedidos de impeachment de um presidente da República, que podem ser formulados por qualquer brasileiro, têm de ser protocolados na Câmara. E quem decide se abre ou não um processo de cassação, por crime de responsabilidade, é exclusivamente o chefe da Casa. Ou seja, Rodrigo Maia.

Em geral, os presidentes da Câmara costumam barrar pedidos de abertura de processo de impeachment. Desde o governo de Fernando Collor (1990-1992), os presidentes brasileiros foram alvo de 179 pedidos de cassação, segundo dados da Câmara. Apenas dois foram aceitos: o do próprio Collor, em 1992; e o de Dilma Rousseff, em 2016.

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Ambos perderam os mandatos em meio a profundas crises político/econômica e escândalos de corrupção. Não é o caso de Bolsonaro neste momento, embora o presidente venha enfrentando atritos com o Congresso.

Quem pediu impeachment

O primeiro pedido de impeachment contra Bolsonaro foi protocolado em 5 de fevereiro por Antonio Jocelio da Rocha. A Câmara não esclareceu o motivo dessa denúncia; apenas que já foi arquivado por Rodrigo Maia. A Casa informou à Gazeta do Povo que mais detalhes só poderiam ser obtidos por meio de pedido formalizado pela Lei de Acesso à Informação.

O segundo pedido de impeachment, protocolado em 13 de março por Diva Maria Piedade Vieira dos Santos, segue em análise. Foi motivado pela publicação de um vídeo com conteúdo pornográfico no Twitter do presidente durante o carnaval. A Câmara também não informou qual foi o embasamento jurídico desse pedido.

A terceira denúncia contra Bolsonaro, do advogado Karlos Alexandre Klomfahs, é desta semana. O advogado usa como base o vídeo, enviado pelo WhatsApp oficial do Planalto, celebrando os 55 anos do golpe militar de 1964. O autor do pedido alega que o presidente cometeu crime de responsabilidade ao “provocar animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contras as instituições civis”, um dos casos passíveis de impeachment previsto na Constituição.

Flávio Pansieri, pós-doutor em direito e fundador da Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDConst), explica que para ser considerado crime de responsabilidade a ação deve atentar contra uma das hipóteses do artigo 85 da Constituição.

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Especificamente nos dois casos envolvendo vídeos e redes sociais, Pansieri explica: “Não me parece que opiniões pontuais do presidente, independentemente de considerarmos essas opiniões adequadas ou inadequadas – ele tem direito de tê-las – , atentem contra algumas das hipóteses previstas no artigo 85”.

Poder de Maia cresce

Na prática, apesar de eventuais fragilidades dos pedidos de impeachment contra Bolsonaro, Rodrigo Maia ganha um importante poder de barganha em sua relação com o Planalto, que tem sido conturbada.

Quando o clima esquentou entre os poderes, Maia colocou na geladeira o pacote anticrime, proposto por Sergio Moro, e convocou a votação da proposta de emenda à Constituição (PEC) que obriga o governo a executar as emendas de bancadas estaduais.

No auge da crise o resultado, nas entrelinhas, foi uma vitória esmagadora para Maia, com a PEC do Orçamento Impositivo aprovada com 448 votos favoráveis e apenas 3 contrários. Enquanto isso a tramitação da reforma da Previdência permanecia travada.

A falta de articulação do governo em questões vitais como a reforma da Previdência e os problemas internos constantes de alguns ministérios – caso da Educação – em conjunto com as polêmicas criadas pelo próprio presidente não colaboram para uma melhora do cenário.

O que os casos Dilma e Collor ensinam

O poder da caneta de um presidente da Câmara, num ambiente de crise do Planalto com o Congresso, pode ser decisivo para determinar o futuro de um presidente.

Antes do impeachment de Dilma Rousseff, por exemplo, a relação dela com o então presidente da Câmara Eduardo Cunha, não era das melhores. A ex-presidente recebeu 68 denúncias e pedidos de impeachment ao longo de seis anos de governo, de acordo com a Câmara dos Deputados.

Cunha queria o apoio do PT para escapar do Conselho de Ética da Câmara que votaria um pedido de cassação protocolado pelo PSOL e pela Rede na esteira das investigações sobre contas bancárias secretas em nome dele na Suíça. Sem apoio, as investigações continuaram e mesmo tendo arquivado vários pedidos de impeachment da presidente anteriormente, Cunha aceitou enviar para apreciação da Casa o pedido protocolado por Hélio Pereira Bicudo, Miguel Reale Júnior, Janaina Conceição Paschoal e Flávio Henrique Costa Pereira.

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A crise política e econômica no governo em 2016 era profunda, o que facilitou o movimento de Cunha contra Dilma. Mas não deixa de mostrar o estrago que uma crise com outros poderes pode causar. Dilma perdeu definitivamente o mandato no dia 31 de agosto de 2016.

Já Fernando Collor sofreu um impeachment em 1992, após o então presidente da Casa, Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) acolher o pedido feito pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Nacional, Marcello Lavenère Machado, e pelo presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Barbosa Lima Sobrinho. A Câmara havia recebido 29 protocolos de denúncias/impeachment contra Collor.

179 pedidos de impeachment, mas só dois aceitos Entre denúncias e pedidos diretos de impeachment, nem sempre os processos se concretizam, o número de protocolos foi de 179, de acordo com a Câmara dos Deputados. Foram 29 de Collor, um foi aceito; quatro de Itamar Franco; 24 de Fernando Henrique Cardoso; 37 de Lula e 68 de Dilma, com um aceito; os números informados sobre o governo Temer não estavam atualizados, mas somavam 17.

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