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Projeto de lei autoriza estados a usar leitos do sistema privado de saúde de forma compulsória para tratar pacientes com Covid-19.
Projeto de lei aprovado no Senado garante o uso compulsório de UTIs de hospitais particulares por pacientes com Covid-19. Proposta segue para Câmara.| Foto: Venilton Küchler/AEN

O Senado aprovou por unanimidade um projeto de lei que prevê o uso compulsório de leitos de UTI de hospitais privados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para pacientes da Covid-19. O projeto (PL 2.324/2020) ainda deve ser analisado e votado pela Câmara dos Deputados. Mas a nova regulamentação não propõe uma fila única de pacientes durante a pandemia, ao contrário do que se imagina.

O texto substitutivo feito pelo relator, senador Humberto Costa (PT-PE) e aprovado por unanimidade pelos senadores, determina regras que devem ser cumpridas pelos entes federados antes de “obrigar” os hospitais particulares a cederem as UTIs.

Desde o registro do primeiro caso de Covid-19 no país, em 26 de fevereiro, é discutida a possibilidade de adoção de uma fila única para pacientes levando em conta a progressão da doença. No final de março, o Psol pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que permitisse ao SUS administrar os leitos privados para criar uma fila única, enquanto durar a pandemia como uma medida extraordinária. Os 26 estados e o Distrito Federal reagiram contra o pedido  e pediram ao STF que a ação do partido fosse impugnada.

De autoria do senador Rogério Carvalho (PT-SE) o projeto aprovado pelo Senado tenta chegar em uma espécie de acordo com o sistema privado para garantir o acesso de pacientes do SUS a leitos de terapia intensiva. Para Marco Aurélio Ferreira, diretor-executivo da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) a proposta traz segurança jurídica e garante que não aconteça sobreposição de pedidos.

Além disso, ele destaca três pontos estabelecidos pelo projeto: a necessidade da realização de um chamamento público por parte dos estados e municípios solicitando as vagas, a remuneração que será definida através de reuniões de Comissão Intergestores Bipartite (CIB) e a taxa de ocupação nos hospitais particulares, que deverá estar abaixo de 85% para que o sistema público possa internar um paciente.

“Os hospitais privados vem tendo um diálogo muito forte com o setor público desde o início dessa pandemia. Estamos acompanhando esse projeto do Senado e ele traz questões que são muito importantes”, afirma.

As diferenças entre a fila única e o uso compulsório de leitos

Uma fila única de pacientes poderia conceder ao SUS a gestão do acesso aos leitos públicos e privados de internações e de UTIs no Brasil, independentemente de os pacientes terem ou não direito ao acesso, seja por meio de planos e seguros de saúde, ou da capacidade de pagamento no momento da internação.

“Poderia causar uma sobreposição de leitos de pacientes. O município age de uma forma, o estado age de outro. O projeto também regula isso, é mais ou menos o que acontece em São Paulo. Primeiro você faz o chamamento, a questão da fila única se torna posterior a isso”, diz Ferreira.

Já o Grupo de Estudos sobre Planos de Saúde (GEPS – FM/USP), em parceria com o Grupo de Pesquisa e Documentação sobre o Empresariamento na Saúde (GPDES – IESC/UFRJ) defenderam a adoção da fila única enquanto durar a pandemia. A avaliação dos grupos também trata da atuação de empresas de planos de saúde e da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em meio à pandemia.

A nota técnica: “As empresas de planos de saúde no contexto da pandemia do coronavírus: entre a omissão e o oportunismo” ressalta que a atuação do setor privado não está em acordo com a crise sanitária atual.

“No Brasil, portanto, urge regulamentação nacional, com participação de Ministério da Saúde, ANS, secretarias estaduais e municipais de saúde, que determine, em caráter excepcional, uma “fila única” ou “estoque único” de leitos de internação e de UTI, para atendimento de casos graves de coronavírus, independentemente de os pacientes serem usuários da rede pública ou privada. Concretamente, propõe-se um Sistema Nacional de Vagas para Casos Graves de Coronavírus”, diz a nota.

O sistema seria nos moldes do Sistema Nacional de Transplantes. As Secretarias Estaduais de Saúde seriam responsáveis pela organização das Centrais Estaduais Únicas de Vagas. “Haveria, assim, um cadastro único de pacientes, ordenado por gravidade de casos que necessitem atenção hospitalar, gerenciado por central reguladora estadual com informações sobre todos os leitos capazes de absorver a demanda”.

Segundo o Ipea, a nota do GEPS e GPDES (2020) não menciona os hospitais de “clientela fechada”, como os hospitais militares, sindicatos, igrejas, entre outros, que, eventualmente, também possam receber, direta ou indiretamente, benefícios, tais como subsídios diversos e serem utilizados para a fila única.

O Ipea descreve a “fila única geral” (FUG) e a “fila única parcial” (FUP), que contemple apenas vagas excedentes nos hospitais que não atendem ao SUS, após o atendimento dos beneficiários de planos e seguros de saúde. A FUP é parecida com o projeto aprovado no Senado. Segundo o estudo do Ipea, no entanto, seria difícil estimar as vagas excedentes e originaria uma situação menos abrangente (e talvez menos efetiva) do que uma FUG que envolva todas as vagas hospitalares do país.

“Por ser menos abrangente, uma fila parcial talvez seja mais facilmente aceita pelos atores de fora do SUS que não concordem com a fila única. A eventual facilidade de aceitação não implica, necessariamente, maiores facilidades de implementação. Ambas as alternativas exigem investimentos consideráveis para sua implementação e operacionalização satisfatória”, aponta o instituto.

O projeto traz pontos que estabelecem segurança jurídica entre o prestador e o estado. E ele leva muito em conta as questões regionais”, diz o diretor-executivo da Anahp. Essa regionalização se dá, segundo ele, porque quem irá determinar as necessidades, valores pagos ao sistema privado e realizar chamamentos é a Comissão Intergestores Bipartite (CIB), formada por gestores estaduais.

O que muda se o projeto sobre leitos for aprovado na Câmara sem alterações

O substitutivo que segue para a apreciação dos deputados federais prevê que os gestores do SUS só podem utilizar os serviços particulares que tenham taxa de ocupação menor que 85%. Os leitos em questão são UTIs destinadas a pacientes com Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) ou infectados com o novo coronavírus. Os responsáveis pelos hospitais deverão especificar e informar diariamente a quantidade de leitos e equipamentos, como respiradores, em uso e ociosos.

As autoridades de saúde devem informar o número de pacientes que aguardam uma vaga em unidade de terapia intensiva. Além disso, deverá ser feito um chamamento pelo estado ou município requisitando as vagas, assim os hospitais particulares podem ter a chance de se manifestarem e negociar a contratação dos leitos. A negociação deverá ocorrer antes do uso compulsório pelo estado, o chamamento deverá apresentar a quantidade, o prazo de utilização e valores de referência para cobrir os gastos das unidades.

No uso compulsório os leitos ficam sujeitos à regulação pública, mas seguem sob administração do setor privado. Já na requisição administrativa, os leitos passam a ser administrados pelo setor público.

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