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Acuado com a instalação da CPI da Covid-19, o governo sofre pressão do Centrão no Senado por mais cargos na Esplanada dos Ministérios. Dessa vez, o grupo que apoia o Palácio do Planalto tenta convencer o presidente Jair Bolsonaro a ceder uma estrutura generosa em seu primeiro escalão para acomodar algum aliado político. O ministério dos sonhos é o Desenvolvimento Regional, embora congressistas não neguem o interesse em estruturas do Ministério da Economia, de Paulo Guedes.
A cobiça por espaços no governo não é nova, mas se intensificou nos últimos dias. Na política, a alocação de um parlamentar aliado para chefiar uma pasta costuma ser visto sempre como uma grande oportunidade. É onde os partidos podem indicar aliados para tocar as políticas públicas na expectativa de colher os frutos políticos em suas bases eleitorais. Sobretudo o Ministério do Desenvolvimento Regional, chefiado por Rogério Marinho.
Desde a eleição para a presidência do Senado, ventilava-se a ideia de acomodar o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) no Desenvolvimento Regional. Mas isso não se concretizou e aliados afirmam que, por ora, ele não pensa em aceitar um ministério, sob risco da imagem política que isso transmitiria, com a CPI da Covid na mira do Brasil. Mas a pressão por algum espaço a um senador aliado permanece.
“Essa questão de que o Senado não é contemplado com um ministério, enquanto a Câmara é, continua presente”, afirma um interlocutor do Palácio do Planalto. Mas ele diz que o presidente Bolsonaro não cogita levar isso adiante, pelo menos nesse momento. "O que não quer dizer que isso não mude amanhã. Mas é algo que vem da pressão do Centrão, e não da boa vontade do Planalto em ceder um ministério”, sustenta um segundo interlocutor.
Como o Ministério da Economia se insere na cobiça do Centrão
Os argumentos que saem do Planalto não são diferentes do que a Gazeta do Povo ouviu ainda este mês. A novidade, contudo, fica por conta da possibilidade de o Centrão aceitar alguma estrutura do Ministério da Economia. Na impossibilidade de conseguir o Desenvolvimento Regional, o Centrão almeja desmembrar o Ministério da Economia e assumir a gestão de um futuro Ministério do Planejamento.
Até a gestão de Michel Temer, o Ministério do Planejamento era o encarregado de controlar orçamentos, liberar recursos para estados, planejar a administração do governo, entre outras políticas públicas do agrado do Centrão. Depois de todo o desgaste com Guedes na aprovação do Orçamento, ter alguém apoiado por lideranças políticas cuidando dessa área seria do agrado de aliados.
O assédio do Centrão sobre um posto no primeiro escalão do governo é visto com preocupação por Guedes, que promete resistir. Até porque, entre a equipe econômica, a leitura é de que esses aliados poderiam abocanhar duas estruturas com uma tacada só. No pior dos cenários para o chefe da equipe econômica, aliados no Senado poderiam ficar com dois ministérios.
“Na verdade, eles [lideranças do Centrão] estão de olho no ministério que tem a ‘caneta’, como diria o Severino Cavalcanti [ex-presidente da Câmara], que ‘fura poço’. Estão de olho no Desenvolvimento Regional”, afirma um segundo assessor do Ministério da Economia. “E aí, se tira o Rogério Marinho [ministro da pasta], para deslocar ele, ficam imaginando desmembrar o Ministério da Economia para entregar o Planejamento [para ele]”, acrescenta o técnico.
Ou seja, as informações e leituras que circulam dentro do Ministério da Economia é de que, nesse cenário, o Centrão manteria uma pasta para distribuir as emendas parlamentares, o Desenvolvimento Regional, e ainda conseguiria apadrinhar Marinho em uma estrutura onde ele poderia dar as cartas sobre o Orçamento. “Mas o Paulo [Guedes] não aceita”, diz um dos interlocutores da equipe econômica.
Guedes reluta em ceder estruturas e alerta para instabilidade do mercado
O ministro da Economia tem usado do prestígio que ainda lhe resta junto a Bolsonaro para alertá-lo e tentar vetar qualquer desmembramento de sua pasta, composta pelos extintos ministérios da Fazenda; do Planejamento; do Trabalho (que já chegou a incluir a Previdência Social em outros governos); e o do Desenvolvimento, Comércio Exterior e Serviços (Mdic).
Um dos alertas feitos por Guedes é a sinalização negativa que o governo daria aos mercados fazendo isso por ora, sobretudo como uma clara tentativa de se blindar diante da CPI da Covid. “O presidente Bolsonaro sabe que, agora, não é hora de começar a mexer com a instabilidade de mercado. É o pior que pode acontecer”, alerta um interlocutor da equipe econômica.
Dentro do Planalto, comenta-se que, para evitar o pior cenário — de seu desafeto Rogério Marinho assumir o Planejamento —, Guedes concordaria em desmembrar sua pasta para recriar o Ministério do Trabalho e da Previdência, atualmente uma secretaria especial que, inclusive, foi chefiada por Marinho. “Do Planejamento, ele não abre mão de jeito algum”, dizem assessores.
A relutância de Guedes em ceder o Planejamento não é algo que se restringe à equipe econômica. O líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), disse ao jornal Valor Econômico que questionou o chefe da equipe econômica sobre as chances de desmembramento do ministério. “Ele rechaçou a possibilidade e disse que não está no radar dele. Afirmou que prefere trabalhar com essa estrutura completa, porque, segundo ele, dá alívio na parte do custeio”, afirmou.
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Mudanças internas na Economia não têm ligação com cobiça do Centrão
A pressão sobre Paulo Guedes se intensifica num momento em que o Ministério da Economia sofreu uma baixa com a saída do secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, que, agora, passa a ser assessor especial. Guedes negou que a saída seja uma demissão e insistiu que se trata de um remanejamento. Seus assessores também confirmam e reiteram que não tem nada a ver com uma suposta “montagem de terreno” para uma reforma ministerial que possa vir.
“A discussão do Orçamento foi extremamente desgastante, até porque é o primeiro Orçamento impositivo que se faz”, afirma um interlocutor da equipe econômica. “Com as emendas impositivas, os parlamentares, para se impor, deslocaram suas despesas orçamentárias obrigatórias, que foi a briga interna que gerou o desgaste grande dos envolvidos”, acrescenta a fonte.
Ao subestimar as despesas obrigatórias para superestimar as emendas parlamentares, Waldery acabou sendo o mais desgastado no processo, por alertar que o governo teria de cortar parte das despesas, sob o risco de Bolsonaro cometer crime de responsabilidade. Desde então, como mostrou a Gazeta do Povo, o Centrão pressiona pela volta do Ministério do Planejamento.
Outro integrante da equipe econômica corrobora e afirma que as mudanças no Ministério da Economia não têm ligações com quaisquer interesses do Centrão por espaços. "Esse movimento interno [saída de Waldery] é como um jogo de basquete, disputado ponto a ponto, e que o técnico tem hora que tem que fazer rodízio da equipe. Membros são técnicos, têm desgaste até emocional em termos de pessoal, de enfrentamento. Agora, recompõe-se a equipe para tocar o jogo", sustenta.




