É curioso pensar que há poucos dias se discutia sobre uma possível Terceira Guerra Mundial quando em pelo menos um continente, a Antártida (ou Antártica), a paz está garantida até 2048 por um tratado assinado por líderes de 53 países, inclusive o Brasil. Todos esses países mantêm equipes de pesquisadores na região, convivendo sem qualquer limite de propriedade.
O Tratado da Antártica, em vigor desde 1959, estipula que os únicos e exclusivos propósitos da atividade humana no continente sejam "promover a Paz e a Ciência". E prevê que os países com atividades científicas lá preservem o solo, a água, o gelo, animais e plantas, não introduzam espécies de outros lugares nem determinados produtos químicos, não realizem testes militares, de armamentos ou explosões e consultem-se sobre o uso do continente, com o compromisso de não torná-lo objeto de discórdia internacional.
Pode-se perguntar até que ponto é possível confiar no cumprimento de um tratado desses diante de polêmicas recentes e desrespeito a itens de outros acordos internacionais, como o de Paris, por exemplo. Mas o fato é que na Antártida as regras são respeitadas há 60 anos e o número de signatários do tratado só aumenta. A lista de 12 assinantes originais saltou para 53 ao longo das décadas.
A fiscalização do cumprimento das regras fica a cargo de uma comissão internacional, eleita nas reuniões anuais dos membros consultivos, que incluem os 29 países com pesquisas consideradas substanciais na região. O Brasil está entre eles. E garantiu a prerrogativa mesmo com o incêndio na Estação Antártica Comandante Ferraz, em 2012, porque manteve as pesquisas em laboratórios improvisados.
Passados quase oito anos, o novo complexo, maior e mais equipado, está pronto para ser inaugurado. A cerimônia, prevista para esta terça-feira (14) precisou ser adiada, porque o clima instável da região não permitiu a chegada das autoridades. O importante é que o Brasil segue participando deste grande experimento de Paz.
Cooperação como fórmula de sucesso
As regras de convivência pacífica na Antártida não são tão explícitas quanto aquelas que estipulam os limites da exploração científica, mas se constroem e solidificam dia após dia entre os que visitam ou convivem por alguns meses no continente.
Estive lá em novembro de 2008, quando trabalhava como repórter de tv. Cheguei a escrever uma matéria especial para a Gazeta do Povo relatando duas experiências marcantes de como é estar num território sem fronteiras, guiado pela cooperação.
A primeira experiência foi na ida para a Ilha Rei George, onde fica a estação de pesquisas brasileira. A viagem a bordo de um navio da Marinha deveria durar dois dias partindo do porto de Ushuaia, no extremo Sul da Argentina, mas por força do Tratado Antártico o navio Ary Rongel foi carregado com óleo combustível e desviou da rota original para fazer a entrega da encomenda na distante estação da Bulgária, que estava na iminência de sofrer queda no sistema de calefação.
Para os jornalistas a bordo, ansiosos por chegar ao destino, o atraso de um dia inteiro pareceu frustrante a princípio. Foi, porém, uma prova contundente de que a colaboração entre os povos é um caminho eficiente para a promoção da paz.
A outra experiência foi descobrir que na Antártida as portas das estações e laboratórios não têm chaves. Qualquer um pode entrar, usar as instalações, inclusive comer e vestir-se com o que estiver disponível no local, caso precise se agasalhar. Tudo guiado pelo bom senso, claro, mas é parte do acordo.
Socorrer quem precisa de acolhida ou de materiais para seguir com as pesquisas acaba gerando troca de gentilezas que sequer estão previstas no Tratado. Na época em que estive lá, a Estação Antártica Comandante Ferraz costumava receber a visita de pesquisadores e militares poloneses, baseados numa ilha relativamente próxima. O interesse deles era usar a internet da estação brasileira, já que na polonesa as falhas de comunicações eram frequentes.
Diante de tantas constatações, quem se importa com a instabilidade do clima ou com o atraso na reinauguração da estação? Importante é saber que exite um continente servindo como um imenso laboratório de Ciência e Paz e que o Brasil está lá ajudando a provar ao mundo que a convivência pacífica entre os povos é possível quando os interesses dos envolvidos são explícitos e aceitos por todos.
Bolsonaro e mais 36 indiciados por suposto golpe de Estado: quais são os próximos passos do caso
Deputados da base governista pressionam Lira a arquivar anistia após indiciamento de Bolsonaro
Enquete: como o Brasil deve responder ao boicote de empresas francesas à carne do Mercosul?
“Esmeralda Bahia” será extraditada dos EUA ao Brasil após 9 anos de disputa
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF
Deixe sua opinião