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Evento PL
Jair Bolsonaro (PL) participa de evento político no litoral paulista um dia antes de ser alvo de operação da Polícia Federal.| Foto: Zack Stencil/PL

Poucas semanas após duas operações da Polícia Federal (PF) terem como alvos parlamentares aliados de Jair Bolsonaro (PL), incluindo seu filho Carlos (Republicanos), vereador do Rio, para investigar alegadas práticas ilegais que ameaçariam a democracia, uma nova operação deflagrada na manhã desta quinta-feira (8) envolveu o próprio ex-presidente. Denominada Tempus Veritatis ou “hora da verdade” em latim, ela revela a intenção nas autorizações do Supremo Tribunal Federal (STF) de buscar – mais de um ano após a mudança de governo – evidências definitivas para se confirmar a tese de que Bolsonaro foi o mentor de um alegado golpe de Estado frustrado.

As investigações partem do pressuposto de que o ex-presidente e os seus aliados mais próximos, sobretudo militares da reserva, trabalharam para disseminar a ideia de que as eleições presidenciais de 2022 teriam sido fraudadas e de que o Exército estaria apto e de prontidão para intervir a fim de manter Bolsonaro no poder.

Na perspectiva dos parlamentares oposicionistas, a rapidez e a abrangência das ações de busca e apreensão da PF, juntamente com as recentes prisões efetuadas de auxiliares militares do ex-presidente, indicam, contudo, uma resposta imediata tanto às declarações recentes quanto aos gestos dos próprios investigados em relação às suspeitas em pauta.

"É um contorcionismo jurídico para inibir a oposição brasileira", afirmou Rogério Marinho, o líder da oposição no Senado. Ele chamou a atenção para o fato do ministro Alexandre de Moraes do STF investigar o caso e ao mesmo tempo se colocar como vítima - o que na opinião de Marinho o impediria de julgar o caso.

Além disso, a oposição acredita que tais movimentações podem estar sendo influenciadas pelas pressões advindas do calendário eleitoral em curso, com a apresentação de candidaturas apoiadas por Bolsonaro para prefeituras e a meta ambiciosa de expansão de seu partido. Essa percepção sugere então influência direta do contexto político sobre as ações judiciais. Entre os interessados mais óbvios de seus desdobramentos estão o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e aliados.

Ao buscar apurar a existência de organização criminosa que teria atuado na tentativa de golpe, a Tempus Veritatis abre linha auxiliar e complementar à vasta operação Lesa-Pátria, que investiga preparativos e intencionalidades nos atos de vandalismo do 8 de Janeiro. Além de Bolsonaro, a nova operação mirou os ex-ministros Walter Braga Netto, Augusto Heleno (GSI), Paulo Sérgio Nogueira (Defesa) e Anderson Torres (Justiça). Trata-se então também do esperado avanço sobre o chamado núcleo militar.

A inclusão do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, entre os alvos aparentemente destoa dos demais, mas remete às manifestações dele em favor de auditagem do resultado do segundo turno das eleições presidenciais de 2022, o que custou sérias sanções à sua legenda pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), presidido pelo ministro Alexandre de Moraes. Detido por ter posse de uma arma de fogo supostamente irregular, Costa Neto é suspeito de ter usado o PL para difundir críticas ao sistema de votação e de ser um dos destinatários da "minuta do golpe".

O dirigente também deu entrevistas e publicou mensagens nos últimos dias em desagravo contra operações da PF envolvendo correligionários, nas quais destaca a perseguição a Bolsonaro. “O sonho de Alexandre de Moraes é ser candidato a presidente do Brasil”, afirmou em uma das oportunidades.

Bolsonaro e aliados apontaram falhas em operações recentes

Nos últimos dias, durante série de entrevistas e manifestações em público, Bolsonaro apontou contradições e viés de perseguição nas investidas da PF contra seu filho Carlos, no dia 29, uma segunda-feira. Ele sublinhou o fato de elas terem ocorrido na manhã posterior à transmissão de live realizada na noite do domingo com os três filhos com mandato pela internet, a partir de sua casa em Angra dos Reis (RJ).

A PF fez buscas contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), na quinta-feira (25) anterior à live, por supostamente ter “incentivado e encoberto” o uso de um programa espião. Uma semana antes, o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), líder da oposição, foi alvo de agentes federais com base no inquérito do 8 de Janeiro. “O que esses dois deputados têm em comum? A possibilidade de serem prefeitos das maiores cidades do Rio de Janeiro”, disse Eduardo Bolsonaro (PL-SP) à época. O deputado e filho do ex-presidente também lembrou nesta quinta-feira (8) que a chamada “Super Live” da família em Angra dos Reis já havia sido alvo de mandado de busca e apreensão dias antes, na qual se cogitou apreender o celular do pai e dos três filhos políticos. “A política do Brasil hoje é feita no STF”, escreveu.

As ações iniciadas nesta antevéspera de Carnaval em teoria poderiam desarticular a mobilização dos oposicionistas contra elas. Contudo, a medida ocorreu após dias nos quais o ex-presidente Bolsonaro e os seus aliados vinham destacando falhas das operações anteriores, incluindo divulgação de informações falsas pela imprensa e justificação baseada em indícios facilmente desmentidos.

Os líderes da oposição já se reuniram com os presidentes das duas Casas do Congresso para avaliar abusos contra deputados em exercício, a natureza inquisitória dos inquéritos intermináveis e a possibilidade de aprovar um projeto de anistia para aqueles considerados presos políticos atualmente.

Num aparente desafio à Justiça, o ex-presidente afirmou durante uma transmissão ao vivo em um canal de YouTube voltado para Portugal que o Brasil está sob uma ditadura e que houve uma armadilha em 8 de janeiro. Essa suposta provocação atinge diretamente o ministro Alexandre de Moraes, relator dos inquéritos no STF, ao sugerir que tudo foi feito para impedir a sua reeleição e insinuar que as eleições foram fraudulentas, pois, segundo ele, “ninguém entende” a vitória de Lula.

Oposição aponta reação contra apoio de cidadãos a Bolsonaro

Desde o início do ano, Bolsonaro e seus aliados têm explorado em declarações e postagens nas redes sociais o contraste entre a popularidade do ex-presidente em grandes concentrações em ruas, praças, praias e estabelecimentos comerciais e as raras e organizadas aparições de Lula em público, muitas vezes com convocações de militantes partidários e sindicais, e até mesmo coerção de servidores públicos para formar plateias.

Para Carla Zambelli (PL-SP), a operação tem relação direta com a manifestação de apoio feita por eleitores de Bolsonaro na quarta-feira (7), em São Sebastião, no litoral paulista. “Vinte e quatro horas após uma linda demonstração de apoio popular, Bolsonaro e aliados são alvo de mandados”, escreveu. O deputado Abílio Brunini (PL-MT) foi mais direto: “o desejo da PF é prender Bolsonaro”.

A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro reagiu à operação, postando uma mensagem bíblica: “Ao Rei eterno, o Deus único, imortal e invisível, sejam honra e glória para todo o sempre. Amém”. Sua amiga e senadora Damares Alves (Republicanos-DF) afirmou estar indignada, mas não surpresa. “Sabemos como funciona o mecanismo. Muitos não acreditavam quando a gente falava e agora estão vendo tudo acontecer”, disse.

Tanto a defesa quanto alguns parlamentares percebem que tanto o sistema judicial quanto as investigações das comissões parlamentares não conseguiram apresentar provas concretas da suposta conspiração golpista, que frequentemente se baseia em vídeos na internet e na “minuta do golpe”, um rascunho de um decreto que consagraria o golpe. Recentemente, o Ministério Público Federal (MPF) arquivou denúncia envolvendo o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, relacionada aos atos de 8 de janeiro.

Tese de perseguição política do STF a Bolsonaro ganha reforço

Por fim, o fato de Bolsonaro ser obrigado a entregar o passaporte em 24 horas e proibido de entrar em contato com os investigados reforça a alegação dos oposicionistas de perseguição política pelo STF e por uma “Polícia Federal Paralela”. A prisão de Filipe Martins, ex-assessor especial, e de Marcelo Câmara, coronel do Exército e ex-assessor especial, tenta estabelecer uma conexão entre intenção e comando, algo que ainda não foi comprovado nos autos.

Apesar de não haver uma relação direta, essa operação faz parte do mesmo esforço do STF em provar intenções golpistas que favoreceriam Bolsonaro e seu grupo político. Não por acaso, os crimes investigados são os mesmos imputados aos réus de 8 de janeiro: organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

Bolsonaro já foi condenado pelo TSE por ataques e disseminação de informações falsas sobre o sistema eleitoral, ficando inelegível até 2030.

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