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A Gazeta do Povo informou na manhã de terça-feira (17/6/25), com base em informações da Polícia Federal (PF) disponíveis até aquele momento, que o ex-presidente Jair Bolsonaro havia sido indiciado no caso conhecido como “Abin Paralela”. Na quarta-feira (18/6/25), fontes da PF esclareceram que o nome de Bolsonaro atualmente aparece no inquérito ligado ao crime de organização criminosa, mas ele não foi indiciado por já responder por esse crime em outro inquérito do órgão.
Corrigido em 18/06/2025 às 10:52
A Polícia Federal indiciou na terça-feira (17) o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), o ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem (PL-RJ), o atual chefe do órgão, Luiz Fernando Corrêa, e mais de 30 pessoas por suposto envolvimento no esquema que ficou conhecido como “Abin paralela”. O ex-presidente Jair Bolsonaro foi citado no caso por supostos indícios de cometimento de crime de organização criminosa, mas não foi indiciado.
Fontes a par da investigação afirmaram à Gazeta do Povo que foram descobertas evidências de que a Abin teria sido utilizada para supostas perseguições e monitoramentos indevidos. A atual direção ainda teria tentado atrapalhar o processo de apuração, o que justificaria o indiciamento do atual diretor, escolhido pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O relatório sobre o esquema de monitoramento ilegal está sob sigilo e foi enviado para o Supremo Tribunal Federal (STF), onde será analisado pelo ministro Alexandre de Moraes. A reportagem procurou o governo federal para comentar o indiciamento do atual diretor-geral e aguarda retorno. Já a Abin disse que não se pronunciará sobre o assunto.
A reportagem apurou que a Polícia Federal apontou alegados indícios de autoria e materialidade de Jair Bolsonaro por organização criminosa no caso da chamada Abin Paralela, mas decidiu não fazer um novo indiciamento contra o ex-presidente no relatório enviado ao STF.
O documento aponta que supostos elementos que demonstrariam que Bolsonaro tinha pleno conhecimento do esquema e que era o principal beneficiado pelas supostas irregularidades.
Apesar disso, a corporação entendeu que, como o crime é o mesmo pelo qual ele já responde formalmente como réu em ação penal, não cabe um novo indiciamento no âmbito do processo da Abin Paralela.
Segundo informações preliminares do relatório da PF, o ex-secretário de Planejamento da Abin, Paulo Maurício Fortunato, teria sugerido espionar autoridades através do software israelense First Mile, utilizado para monitorar a geolocalização em tempo real de telefones celulares. O indiciamento ainda cita que ele teria tentando atrapalhar as investigações ao não entregar equipamentos para as apurações, dificultando o acesso a documentos.
Também constam no indiciamento o chefe de gabinete da Abin, Luiz Carlos Nóbrega Nelson, e o atual corregedor da agência, José Fernando Moraes Chuy. Este último foi nomeado para o cargo em setembro do ano passado em meio às investigações da “Abin Paralela”.
Ainda são citados no inquérito o policial federal Marcelo Bormevet e o subtenente do Exército, Giancarlo Gomes Rodrigues, investigados no processo da suposta tentativa de golpe de Estado que se alega ser liderada por Bolsonaro. Ambos faziam parte da Abin durante a gestão de Ramagem.
O relatório da PF indica uma ligação entre a suposta “Abin Paralela” e o plano de golpe, em que um setor da agência teria sido estruturado para levantar informações para favorecer a candidatura de Bolsonaro e sua permanência no cargo de presidente após as eleições de 2022.
Carlos Bolsonaro criticou o indiciamento e sinalizou o que seria uma perseguição relacionada com as eleições de 2026, em que ele pode ser candidato ao Senado.
"Alguém tinha alguma dúvida que a PF do Lula faria isso comigo? Justificativa? Creio que os senhores já sabem: eleições em 2026? Acho que não! É só coincidência", afirmou em uma rede social.
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Alvos da espionagem
De acordo com as investigações iniciadas ainda em 2023, autoridades que eram consideradas opositoras a Bolsonaro teriam sido monitoradas ilegalmente pela Abin no período em que era dirigida por Ramagem, durante parte do governo do ex-presidente.
O monitoramento era realizado por um software israelense chamado de First Mile, utilizado para fornecer a localização geográfica aproximada de celulares em tempo real a partir do número da linha. A ferramenta teria sido adquirida ainda durante a gestão de Michel Temer (MDB).
“A continuidade das investigações também evidenciou a utilização dos recursos da Abin para monitorar autoridades dos Poderes Judiciário (ministros desta Corte e seus familiares) e Legislativo (Senadores da República e Deputados Federais), com o objetivo de obter vantagens políticas”, disse o despacho de Moraes tornado público na época e que a Gazeta do Povo teve acesso.
Ramagem, no entanto, negou a participação no esquema e afirmou que determinou uma investigação sobre o uso do First Mile logo que tomou posse do cargo em 2019. “Passei pente-fino na Abin”, afirmou.
“Na gestão Lula quem é que voltou para a Abin? O oficial de inteligência que eu havia exonerado. Ele voltou numa posição superior, na de secretário de Planejamento e Gestão”, completou.
Mais recentemente, em depoimento ao STF na investigação da suposta tentativa de golpe de Estado, Ramagem negou a acusação de ter montado uma espécie de "estrutura paralela" na Abin e afirmou que a agência jamais atuou contra autoridades. Ele atribuiu qualquer irregularidade a uma eventual ação isolada de servidores.
Segundo a petição, o esquema de espionagem que ficou conhecido como “Abin paralela” monitorou:
- Judiciário: ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luis Roberto Barroso e Luiz Fux.
- Legislativo: deputados Arthur Lira (PP-AL, presidente da Câmara), Rodrigo Maia (PSDB-RJ), Kim Kataguiri (União-SP) e Joice Hasselmann (PSDB-SP), e os senadores Alessandro Vieira (MDB-RS), Omar Aziz (PSD-AM), Renan Calheiros (MDB-AL) e Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).
- Executivo: ex-governador de São Paulo, João Doria; os servidores do Ibama Hugo Ferreira Neto Loss e Roberto Cabral Borges; os auditores da Receita Federal Christiano José Paes Leme Botelho, Cleber Homem da Silva e José Pereira de Barros Neto.
- Jornalistas: Mônica Bergamo, Vera Magalhães, Luiza Alves Bandeira e Pedro Cesar Batista.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, afirmou na petição ao STF que “a representação se escora em elementos indicativos de que, entre os anos de 2019 e 2022, integrantes do grupo investigado teriam instalado estrutura paralela no órgão central do Sistema Brasileiro de Inteligência – a Abin, destinada à implementação com viés político, em grave desacordo com os limites impostos pelas balizas do Estado democrático de Direito”.
A PF também aponta no material que encontrou provas de monitoramento e vigilância dos ex-deputados Jean Wyllys e familiares, Rodrigo Maia, Joice Hasselmann, Kim Kataguiri, servidores do Ibama, jornalistas, e pessoas ligadas à “ação clandestina” de investigações de Renan Bolsonaro (filho 04 do ex-presidente), caso Marielle Franco, caso Adélio Bispo (autor da facada contra Bolsonaro em 2018), entre outros.









