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Eduardo Braga e Rodrigo Pacheco
Senador Eduardo Braga (MDB-AM) foi escolhido pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para relatar a reforma tributária no Senado. Ambos se posicionaram contra o fatiamento do texto.| Foto: Jonas Pereira/Agência Senado

O Senado deu início à fase revisora da reforma tributária com o desafio de eliminar oportunismos e contradições presentes no texto aprovado pela Câmara na madrugada da sexta-feira (7). A tramitação na Casa terá início efetivo em agosto, após o recesso parlamentar, e será abrigada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), presidida por Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), com relatoria do líder do MDB, senador Eduardo Braga (AM). A meta é concluir a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019 até outubro. Os pontos controversos já estão sendo analisados, com destaque para as concessões feitas a setores econômicos e o embate federativo entre Norte, Nordeste e Centro-Oeste, de um lado, e Sul e Sudeste, de outro.

Houve um embate prévio em relação à reforma tributária, com a possibilidade de modificar a PEC como um todo ou fatiá-la. Os líderes do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) e no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), defenderam o fatiamento, mas não receberam apoio do relator nem do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem expressado confiança na aprovação da PEC no Senado enquanto Pacheco tem destacado a responsabilidade do Senado.

Os relatores da reforma, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e o senador Eduardo Braga (MDB-AM), reuniram-se na quarta-feira (12) com Haddad e Pacheco com objetivo de identificar os artigos mais polêmicos e aprofundar o alinhamento de Câmara e Senado na matéria.

Um problema apresentado previamente pela oposição e reconhecido pelo relator e pelo governo diz respeito à falta de estudos sobre os impactos das mudanças propostas na reforma tributária. Braga demandou análises sobre o impacto nas receitas fiscais, na carga tributária geral e no peso sobre cada setor, e a equipe econômica se comprometeu a fornecer os dados necessários e realizar simulações de alíquotas.

No entanto, a principal incerteza na reforma, que alimenta a tensão principal entre as regiões Nordeste e Sudeste, está relacionada à divisão dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), que terá um patrimônio mínimo de R$ 40 bilhões para reduzir disparidades regionais. Os estados nordestinos, que representam um terço dos 81 assentos no Senado, estão se articulando com as regiões Norte e Centro-Oeste para garantir critérios de distribuição do fundo favoráveis a eles.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu deixar a definição do modelo de divisão do fundo fora do texto constitucional, em legislação complementar, devido à pressão do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Tarcísio conseguiu ainda incluir na PEC um modelo de governança do Conselho Federativo, responsável pela gestão do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), para que estados do Sul e Sudeste possam influir mais. Além de discutir este ponto, o Nordeste busca aumentar o valor reservado pela União ao FNDR para R$ 75 bilhões. Uma possibilidade discutida é destinar parte dos recursos do fundo de compensações para incentivos, também previstos na PEC, que totalizam R$ 160 bilhões de 2025 a 2032.

Os governadores do Nordeste propõem o uso do critério do "PIB invertido" como forma de distribuição dos recursos, o que significaria que os estados mais pobres receberiam uma parcela maior desses recursos. Por sua vez, os governos do Sul e Sudeste concordam em receber menos, desde que seja incluído um mecanismo que leve em consideração o tamanho da população. Os estados do Nordeste, Norte e Centro-Oeste estão preocupados que, além de terem influência no Conselho Federativo, os estados mais populosos também fiquem com a maior parte dos recursos do FNDR.

Penduricalhos aprovados de última hora geram distorções

Além da tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) também será discutida em audiências públicas na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). Nessas audiências, serão abordados temas delicados, como os benefícios fiscais concedidos aos fabricantes de automóveis até 2032. Na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei conseguiu aprovar uma proposta para retirar as isenções do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) do texto da reforma. No entanto, senadores das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste estão buscando reintroduzi-las, contando com o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Tanto o governo quanto os senadores concordam que o desafio mais difícil no Senado é eliminar a maioria dos dispositivos estranhos aos objetivos da PEC, conhecidos como "jabutis", bem como as várias isenções e deduções acrescentadas de última hora.

O senador Efraim Filho (União Brasil-PE) foi designado como relator do grupo de trabalho da reforma tributária na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), que inclui outros nove senadores, entre eles Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), considerado o maior crítico da PEC. A oposição argumenta que os riscos de aumento da carga tributária e concentração de poder na destinação de receitas para a União são evidentes.

Por essa razão, a CAE aprovou requerimentos do senador Rogério Marinho (PL-RN), na terça-feira (11), e solicitou estimativas do governo sobre o impacto da alíquota média da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que serão criados pela reforma. Marinho, líder da bancada oposicionista, destacou a importância de ter informações claras "antes de prosseguir com uma mudança tão significativa". Ele também ressaltou que o texto da reforma ganhou forma apenas alguns dias antes da votação, e que demandas diversas foram incluídas horas antes em um só bloco, sem discussão prévia e até mesmo sem qualquer acompanhamento do governo.

Reparos em inconsistências vão demandar dedicação especial

De acordo com Luis Henrique Macedo Cidade, diretor da consultoria Foco Relações Governamentais, Rodrigo Pacheco expressou aos líderes partidários sua intenção de envolver o Senado de forma mais ativa na elaboração do texto final da reforma tributária, promovendo um debate em ritmo mais lento. Pacheco estaria aberto a incluir na discussão outras Propostas de Emenda à Constituição (PECs) em tramitação na casa, como a PEC 46/2022, de autoria do senador Oriovisto Guimarães, apoiada por grandes prefeituras e pelo movimento Simplifica Já.

No entanto, outros analistas consultados pela Gazeta do Povo acreditam que as inconsistências deixadas pela Câmara já exigirão grande parte dos esforços dos senadores, visando corrigir o texto e conciliar interesses de forma a preservar o espírito da reforma, que atingirá o ápice de sua efetividade em 2033.

Em termos de incongruências, o aspecto mais polêmico da PEC é a autorização para os estados criarem um imposto para financiar investimentos até 2043, o que vai contra a promessa de não aumentar a carga tributária. Essa autorização foi incluída de última hora durante a votação na Câmara para atender a diversos setores e ao governo Lula. Essa medida permite, por exemplo, que os governadores tributem produtos primários e semielaborados, uma prerrogativa que hoje é da União. Há o risco de isso afetar as exportações de petróleo, energia e minério.

A emenda global incluída no final da votação também beneficia igrejas, clubes esportivos e setores comerciais específicos, ao estabelecer novas hipóteses de alíquotas reduzidas em 60% para o novo imposto. Especialistas em tributação lembram que quanto maior o número de atividades beneficiadas, maior será a alíquota padrão a ser aplicada.

No que diz respeito à posição do relator em defesa das vantagens para a Zona Franca de Manaus, espera-se que a discussão desse tema não seja reaberta no Senado. Eduardo Braga já tem participado ativamente das negociações relacionadas ao seu estado na Câmara e estabelecido uma relação próxima com o governo e o presidente do Senado. Além da manutenção da Zona Franca, da Sudam e do Fundo de Desenvolvimento do Norte, o Amazonas conseguiu incluir no texto da reforma um Fundo de Sustentabilidade e Diversificação Econômica.

Imposto maior para bebidas e cigarros não alcança defensivos

O texto da reforma estabeleceu a implementação de um imposto seletivo com propósito regulatório, que incidirá sobre produtos prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Conforme previsto na PEC, esse imposto será aplicado a bebidas alcoólicas, cigarros e alimentos com excesso de açúcar ou sal. No entanto, os defensivos agrícolas foram excluídos dessa medida e ainda receberão uma redução de 60% na alíquota. Pela proposta aprovada pelos deputados, a definição desse aspecto será feita por meio de legislação complementar, resultado das negociações conduzidas pelo relator na Câmara com a bancada do agronegócio.

No caso dos cigarros e bebidas alcoólicas, não se esperam grandes mudanças, uma vez que eles já são tributados há décadas com alíquotas elevadas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), como parte de uma política de saúde pública. No entanto, para os demais produtos com riscos sanitários e ambientais, a implementação do imposto seletivo provavelmente resultará em um aumento de preços.

Além disso, o detalhamento da Cesta Básica Nacional de Alimentos, que será isenta de impostos, também será fixado mediante lei complementar. Nesse ponto, o setor agrícola buscará ampliar a lista de produtos que se beneficiarão da alíquota zero na nova tributação.


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