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Bolsonaro: o Trump brasileiro?
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Tem muita gente fazendo uma comparação entre o presidente eleito nos Estados Unidos e Jair Bolsonaro, como se este fosse uma espécie de “Trump brasileiro”. Nesse artigo, pretendo argumentar que a comparação parece um tanto forçada. Antes, porém, é preciso fazer um alerta: já sei que vem chumbo grosso aí, pois infelizmente existe um ala da direita que não quer saber de debates civilizados, de argumentos, de respeito às diferenças. Desviou uma vírgula de sua cartilha, é pau e pedra, e automaticamente você se torna um inimigo, um “deles”, um socialista!

Sim, isso ficou bem claro ontem mesmo, quando escrevi criticando a invasão da Câmara por uma patota pedindo “intervenção militar”. Meu perfil no Facebook logo foi alvo do ataque irracional de alguns, que se acham os heróis da nação por aplaudir tais métodos. Já fui chamado de “fascista” muitas vezes, mas de “socialista” acho que foi a primeira. Claro, acho graça nos dois casos. Cheguei a responder com essa mensagem:

Sério que tem gente achando que uma intervenção militar é a salvação do país, a solução para todos os nossos problemas, e que quem discorda é frouxo ou comunista? Já esqueceram da desgraça que foi o positivismo do regime militar na economia, com estatais, protecionismo e tudo mais? E como acham que os militares no comando do governo iriam reagir se um grupelho tentasse invadir a Câmara (aliás, ainda haveria Câmara?) para protestar contra alguma coisa? Pois é. Menos, gente. Vocês provavelmente nunca leram um Scruton, um Dalrymple, um Oakeshott, um Berlin, um Hume ou um Burke e estão se achando os únicos representantes da direita legítima. Não: vocês são tudo aquilo que a esquerda gostaria que fosse a direita, pois são um alvo bem mais fácil. Vocês acabam dando vida aos espantalhos e caricaturas criados pela esquerda, fazem o jogo dela. E ainda querem monopolizar o patriotismo, a coragem? Ah, fala sério!

E também disse que talvez fosse preciso mudar a descrição aqui do blog, acrescentando: “Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda ‘politicamente correta’ e da direita boçal. Ainda me dei ao trabalho de explicar: “Pensamento independente, turma. Entendam o que é isso logo de uma vez. Significa não aderir a nenhuma seita fechada ou igrejinha ideológica. Defendo aquilo que julgo correto, doa a quem doer. Capisci?

Sim, muitos entenderam. São com esses que quero conversar agora, abrir um diálogo civilizado. Os outros, que reagem por instinto e detonam qualquer um que ousa discordar de seu fanatismo, vou simplesmente ignorar. E após essa longa introdução e alerta, vamos ao tópico do artigo: Bolsonaro é o candidato perfeito a ser o nosso Trump, assumindo que é desejável ter nosso Trump?

Em alguns aspectos, sim, a analogia faz algum sentido. Trump representou, afinal, um duro golpe nos esquerdistas “globalistas”, no politicamente correto, na “marcha das minorias oprimidas”. E Bolsonaro, sem dúvida, tem como sua principal característica (e também qualidade) seu anticomunismo, sua postura intransigente para com essa turminha “progressista” patética e perigosa. Mas acredito que as semelhanças terminam aqui.

Não me levem a mal, até porque dependendo de com quem ele esteja concorrendo, eu mesmo apoiaria Jair Bolsonaro em 2018 (tudo é relativo, em política ao menos). Mas não acham que estão forçando “um pouco” a barra nessa comparação com Donald Trump, como se fossem o mesmo fenômeno? Como exatamente um empreendedor bilionário que era totalmente um “outsider” da política pode se parecer com um deputado em seu sexto mandato, cujos filhos entraram todos para a política também, criando um clã familiar?

Entendo que o militar da reserva seja alguém fora do mainstream, mas daí a considerá-lo um “outsider” da política, como Trump, vai uma longa distância, em minha humilde opinião. Bolsonaro é um político de sucesso, fez sua carreira e sua fama dentro do sistema, representando um nicho importante no Congresso, o “exército de um homem só” contra os petistas. Mas não foi um empreendedor, alguém que fez fortuna no mercado, criando riquezas e empregos para a sociedade.

João Dória, nesse aspecto, não seria mais similar? Um gestor de sucesso, com mensagem mais empreendedora? Assim como Mauricio Macri na Argentina. São casos que, penso, soam mais parecidos com a trajetória de Trump. Claro, o fato de Dória estar no PSDB pesa contra ele, mas aqui também não podemos esquecer que o próprio Trump foi candidato pelo Partido Republicano, derrotando o velho establishment de dentro do GOP. Dória pode se mostrar um novo rosto mais liberal dentro do partido de FHC, um esquerdista.

Agora podem jogar as pedras, pois tem uma turma pouco disposta a debater racionalmente usando argumentos. Qualquer “porém” ou crítica e você logo se torna um “socialista fabiano”, termo que, creio, muitos ali aprenderam ontem, se aprenderam. Não sou esquerdista, muito menos tucano, e tampouco contra o Bolsonaro, que julgo ter um importante papel a cumprir no combate ao esquerdismo. Mas não preciso concordar com tudo. E não devo ficar calado só por receio da reação ensandecida de certos reacionários.

Se o fenômeno é um “outsider” contra todo o establishment político, alguém de fora do próprio sistema, então apenas acho que eleger um deputado em seu sexto mandato, com todos os filhos também na política, como representante desse fenômeno pode ser algo um tanto sem sentido. E, como meus leitores já devem ter notado, sou alguém que preza a coerência…

Rodrigo Constantino

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