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Duas visões distintas de país: o otimismo infundado de Mendonça de Barros. Ou: Mendonção "lulou"
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Acabo de participar de um painel sobre a economia brasileira, cenários e perspectivas, no XXV Congresso Nacional de Executivos de Finanças organizado em Belo Horizonte. Dividiu comigo o painel Luiz Carlos Mendonça de Barros, o que possibilitou ao público um contraste entre duas visões bem diferentes de país.

Mendonça falou primeiro, e ofereceu uma visão um tanto otimista do desenvolvimento do país nos últimos anos. Para ele, a grande conquista, a grande “reforma” ocorrida na década foi a inclusão de milhões de brasileiros na formalidade. Usou um gráfico interessante para mostrar como saímos de uma informalidade que chegava a quase 70% da força de trabalho algumas décadas atrás para um quadro invertido hoje, com cerca de 30% na informalidade.

Essa inclusão, em sua opinião, muda a configuração política do Brasil. É a tal da nova classe média, que pode viver ainda em favelas, mas está inserida na formalidade e consumindo mais. Pode ter se excedido nas dívidas, mas a mudança veio para ficar, e altera o paradigma político no país. As manifestações de junho de 2013 teriam ligação com isso, e esse povo sabe melhor agora como o estado ineficiente pode ser cobrado, e como custa caro.

Segundo Mendonção, como é conhecido, Eduardo Campos havia percebido o fenômeno melhor do que os demais, e por isso não batia em Lula. O seu próprio partido, o PSDB, ou não entendeu bem o que mudou ou não tem como elogiar Lula. Mendonça disse que seus colegas tucanos acham que ele “lulou” por conta de tais elogios, mas ele tenta apenas ser realista.

Hoje, tais conquistas estariam ameaçadas pela incompetência da equipe de Dilma e da própria presidente, pelo esgotamento do modelo de estímulo ao consumo. Mas não há crise grave à frente, risco algum de virarmos uma Argentina, e é preciso realizar algumas mudanças conjunturais apenas, criar um novo modelo mais adaptado ao momento atual.

Comecei minha fala notando que Mendonça observava algumas árvores, mas ignorava a floresta. Não levava em conta o que acontecia no resto do mundo. Elogiava uma mudança que não era bem brasileira, mas sim fruto de um vento favorável exógeno que permitiu tudo isso. Enfim, o Brasil foi apenas uma cigarra sortuda que ganhou na loteria e surfou uma onda insustentável.

Sem fazer o dever de casa, sem realizar reformas estruturais para reduzir o Custo Brasil, sem aumentar nossa produtividade, sem expandir nossa poupança, todo o aumento no gasto público e no crédito se mostra insustentável. Não pude deixar de cutucar o colega, lembrando que meu discurso mais “pessimista” já vem sendo feito há uns 4 anos, enquanto outros economistas de matiz keynesiana elogiavam o quadro econômico e demonstravam bastante otimismo com o futuro. Hoje estamos vivendo um cenário de estagflação.

Não nego o fenômeno em si, da ascensão de uma “classe média” que, apesar de ainda ganhar muito mal e viver em favelas, inseriu-se em um mercado formal antes inexistente. Mas chamo a atenção para o fato de que nada disso se deu por mérito do PT, por medidas ou reformas do governo, e que tudo corre perigo justamente porque a direção dos ventos externos mudou, com a China crescendo menos e os bancos centrais dos países desenvolvidos retirando lentamente os estímulos.

O Brasil cresceu bem menos do que os pares emergentes nos últimos anos, e com muito mais inflação. É uma visão bastante míope celebrar a entrada da classe média na formalidade sem levar em conta o imenso custo de oportunidade perdido. Era para o Brasil ter crescido uns 5% ao ano pelo menos, e com inflação bem menor, de no máximo 4,5% (a meta). Rasgamos o bilhete de loteria.

Comprar televisores novos, trocar de carro e fazer uma viagem pela CVC com base em financiamento antes inexistente pode ser muito legal, mas não é um modelo bem-sucedido de nação próspera. Mendonça parece aceitar com resignação o fato de que somos um país de cigarras, e tudo bem. Prefiro apontar para a irresponsabilidade coletiva com alguma esperança de que sejamos capazes de reverter o curso atual, que nos levará inexoravelmente a um muro.

Outro ponto de divergência diz respeito ao risco de seguirmos uma trajetória bolivariana. Mendonça descartou totalmente essa possibilidade, e eu preferi fazer o alerta, até porque a nossa negligência é o maior aliado dos que desejam tal destino. Os venezuelanos acharam que não seriam a próxima Cuba, e os argentinos acharam que não seriam a próxima Venezuela.

Para Mendonça, temos instituições sólidas e o PMDB, o “centrão” que impede melhoras rápidas por um lado, e aventuras revolucionárias catastróficas, do outro. Não discordei totalmente, e já disse em outras ocasiões coisa parecida. Mas as instituições vêm sendo aparelhadas a cada ano de PT no poder, e correm sérios perigos. Mais quatro anos poderiam ser fatais sim, e considero um dever moral daqueles que enxergam mais além apontar para essa trágica possibilidade. Algo precisa ser feito com urgência. E esse algo é tirar o PT do poder.

Não senti em Mendonça a mesma urgência ou apreensão. Parece razoavelmente satisfeito com o status quo, celebrando a nossa mediocridade. Talvez seus colegas tucanos estejam certos mesmo: ele “lulou”. Seu otimismo me parece infundado. Prefiro fazer coro ao “Pessimildo”, boneco que o PT criou para desqualificar aqueles críticos realistas que não fecham os olhos para o que se passa ao redor do país e do mundo. Até porque com uma “oposição” dessas, o PT não precisa de amigos…

Rodrigo Constantino

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