![Por um maior pragmatismo nas relações externas. Ou: Melhor no “cantinho” que ao lado de ditadores Por um maior pragmatismo nas relações externas. Ou: Melhor no “cantinho” que ao lado de ditadores](https://media.gazetadopovo.com.br/rodrigo-constantino/2016/05/blog-626-9fc55d88.jpg)
Já escrevi aqui em apoio a José Serra no Itamaraty, tentando reverter o estrago causado pelo PT também nessa área, com sua visão ideológica comunista. Volto ao tema hoje, tendo como base a coluna do diplomata Marcos Troyjo na Folha, em que rebate o ponto de vista de Celso Amorim. Este, na mesma Folha, escreveu um texto condenando a postura de Serra ao falar mais grosso com os bolivarianos, e insinuou que “o Brasil voltará ao cantinho pequeno de onde nunca deveria ter saído”, o que estaria ao agrado das “elites”. Seguem alguns trechos da resposta de Troyjo:
A imagem revela uma falha no sentido de proporção e também de movimento. Ela supõe, em sua trajetória de 2003 a 2016, que graças ao “projeto popular” e sua vertente de política externa, um gigante pegou carona no Cristo da “The Economist” que decolava do Corcovado rumo ao núcleo central das relações internacionais. E de lá, agora, corre risco de ser extraído.
Não é nada assim. O período Lula-Dilma, seja em termos econômicos ou estritamente de política externa, não lega ao Brasil um acervo de excedentes de poder, prosperidade e prestígio. Representamos hoje os mesmo 2,7% do PIB global que nos cabia em 2002. Não quebramos a inércia do 1% que infelizmente é a pequena fatia que há décadas ocupamos no comércio global.
[…]
A diplomacia de Lula-Dilma não projetou, a bem da verdade, o país ao centro do palco. Nossos tradicionais ativos e potencialidades, de território, população, peso relativo do mercado interno e patrimônio ambiental, somaram-se a um conjunto de fatores positivos. A estabilidade macroeconômica herdada (e dilapidada) pelo lulopetismo, o bônus demográfico, o superciclo das commodities e a promessa de uma superpotência energética permitiram-nos acesso ao “camarote VIP” frequentado por potências emergentes.
De lá, equipado por uma boa estratégia de inserção global, o Brasil poderia ter continuado a ascender, mas desperdiçou boas oportunidades que lhe passaram à frente. No camarote VIP, o Brasil pouco fez por reformar-se internamente ou adaptar-se à globalização. Com a possível exceção da agenda global do meio ambiente e dos marcos para o desenvolvimento sustentável, o país pouco liderou. Os Brics, seja como sinônimo de classe de ativos ou plataforma de inserção global, não representam uma formulação “Made in Brazil”. Tampouco o G20.
Dizer que de agora em diante o Brasil vai abandonar a “liderança” da integração latino-americana é uma bobagem. Empatias ideológicas e a multiplicação de fóruns regionais para a crítica aos males do mundo não são sinônimos de integração. Enquanto comprar uma garrafa de um bom vinho argentino for mais barato em Nova York do que em São Paulo, a integração não é para valer.
Amorim deixa a sua própria visão ideológica de esquerda falar mais alto quando critica o maior pragmatismo e lamenta a perda de qualquer coisa que seja da era lulopetista. O PT não trouxe nada de bom para o país, e o mesmo vale para o setor externo. Ao contrário: ficamos presos na camisa de força do Mercosul ideologizado, aproximamo-nos de ditaduras sanguinárias só para atacar os Estados Unidos ou por corrupção, tornamo-nos rabo de sardinha, aceitando abusos de países como Bolívia e Equador.
O passado petista precisa ser apagado na economia, no social, na política e também no Itamaraty. Serra está longe de ser um liberal. É ele também de esquerda. Mas, ao contrário de Amorim, demonstra mais bom senso e visão histórica. O Brasil não precisa ficar num “cantinho”. Ele tampouco deve confundir falar grosso ao lado de bandidos, focando apenas na retórica antiamericana, com efetivamente ter poder de influência perante o resto do mundo. Poder é algo que se segue da capacidade, não só da vontade. Troyjo conclui:
O que afasta o Brasil de uma maior centralidade no mundo contemporâneo seguramente não é a promessa de uma política externa mais pragmática e amparada no interesse nacional. Nossas potencialidades estão intactas. O que empurra o país para fora dos principais palcos são os equívocos de diagnóstico e atuação internacional e a corrosão de sua economia.
Enquanto esteve no camarote VIP, o Brasil, a um só tempo, teve os olhos do mundo sobre si e um excelente ponto de observação para antecipar tendências. Ao optar pelo acessório e o perdulário, comportou-se como o “rei do camarote” das relações internacionais.
Rodrigo Constantino
-
Calamidade no RS acirra guerra eleitoral entre governo e oposição
-
Congresso impõe derrotas ao governo, dá recado ao STF e reafirma sua autonomia
-
Os recados do Congresso ao governo Lula e ao Judiciário; ouça o podcast
-
Ministro acusou Guiana de “chupar” petróleo do Brasil. Saiba por que isso não faz sentido
Inteligência americana pode ter colaborado com governo brasileiro em casos de censura no Brasil
Lula encontra brecha na catástrofe gaúcha e mira nas eleições de 2026
Barroso adota “política do pensamento” e reclama de liberdade de expressão na internet
Paulo Pimenta: O Salvador Apolítico das Enchentes no RS
Deixe sua opinião