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Quid est veritas? A importância da verdade objetiva
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Por Alexandre Borges

Quando Pôncio Pilatos perguntou a Jesus se ele era um “rei”, sua resposta pegou todos de surpresa: “Tu dizes que eu sou rei. Eu para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz.” Pilatos retrucou, em forma de deboche: “o que é a verdade?” (Quid est veritas?) A dúvida de Pilatos está mais viva do que nunca.

Você sabe que está vivendo numa sociedade disfuncional quando ouve numa discussão alguém dizer “verdade ou não”. Verdade ou não? Agora quando se prova que uma determinada história espalhada nas redes sociais e na imprensa é mentira, que nada do que foi relatado bate com os fatos reais, logo aparece alguém e diz “verdade ou não, temos que concordar que…”. Ser ou não verdade virou um mero detalhe e se você defende a verdade é conivente ou cúmplice de cinco mil anos de crimes, violência, preconceito ou seja lá o que o militante esteja berrando naquela discussão.

Quando se descobre que um caso determinado de “ataques racistas nas redes sociais” é mentira, por exemplo, a tendência de muitos é sequer tocar no assunto porque a resposta automática será “então você está dizendo que não existe racismo?” Se você menciona que um episódio específico de um assaltante negro morto por um policial branco nos EUA não tem nada a ver com racismo (e que exatamente por isso o policial foi absolvido), o racista é… você!

No artigo “A guerra suja contra a verdade”, publicado em 2014 pelo jornal Gazeta do Povo, eu já alertava sobre esse ponto em que reputações estão sendo assassinadas e inocentes jogados na cadeia por crimes simplesmente forjados em nome de um agenda política. Leia aqui:http://bit.ly/1oGnD0V

Nada disso é por acaso. Este trecho do magistral “A Nova Era e a Revolução Cultural” (Olavo de Carvalho) aponta as origens deste fenômeno:

“Para Gramsci, as tradições filosóficas devem ser todas varridas de uma vez, e junto com elas a distinção entre “verdade” e “falsidade”. Pois Gramsci não é um marxista puro-sangue. Através de seu mestre Antonio Labriola, ele recebeu uma poderosa influência do pragmatismo, escola para a qual o conceito tradicional da verdade como uma correspondência entre o conteúdo do pensamento e um estado de coisas deve ser abandonado em proveito de uma noção utilitária e meramente operacional. Nesta, “verdade” não é o que corresponde a um estado objetivo, mas o que pode ter aplicação útil e eficaz numa situação dada. Enxertando o pragmatismo no marxismo, Labriola e Gramsci propunham que se jogasse no lixo o conceito de verdade: na nova cosmovisão, toda atividade intelectual não deveria buscar mais o conhecimento objetivo, mas sim a mera “adequação” das idéias a um determinado estado da luta social. A isto Gramsci denominava “historicismo absoluto”. Nesta nova cosmovisão, não haveria lugar para a distinção — burguesa, segundo Gramsci — entre verdade e mentira. Uma teoria, por exemplo, não se aceitaria por ser verdadeira, nem se rejeitaria por falsa, mas dela só se exigiria uma única e decisiva coisa: que fosse “expressiva” do seu momento histórico, e principalmente das aspirações da massa revolucionária. Dito de modo mais claro: Gramsci exige que toda atividade cultural e científica se reduza à mera propaganda política, mais ou menos disfarçada.” (Na íntegra: http://www.olavodecarvalho.org/livros/negramsci.htm)

Os frankfurtianos e depois os pós-modernistas vieram apenas terminar o serviço. Se no séc. XIX Nietzche tentou declarar a “morte” de Deus, o que se vê nas últimas décadas é a perseguição implacável contra a verdade objetiva e factual. Se a verdade não reforça uma determinada narrativa, se não serve a um propósito político, se não avança uma agenda ideológica, não serve. E se você insistir em ser fiel aos fatos, o criminoso é você. E é assim que alguém, sem o menor constrangimento, tem a cara-de-pau de argumentar começando uma frase com “verdade ou não”.

Toda vez que a imprensa e as redes sociais forem invadidas por um tsunami de hashtags e textões engajados, antes de mais nada investigue a veracidade do que está sendo relatado. A realidade não está nem aí para os delírios, frustrações, paranóias e alucinações de quem produziu o texto ou para a desonestidade intelectual dos caçadores de cliques que compartilharam. Se for mentira, desmascare em nome da sua própria sanidade mental e do mundo em que você vive.

Uma sociedade em que a verdade objetiva não é mais relevante está condenada. Um mundo onde cada aspecto da vida é politizado e ideologizado é simplesmente inviável. Nunca esqueça: lutar pela verdade é a primeira de todas as batalhas.

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