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Época de Natal, família quase toda reunida, e um dos assuntos, claro, é a política nacional. Um dos meus parentes me diz algo assim: “Rodrigo, o Brasil sempre foi isso aí. Esquece essa coisa de consertar a podridão toda. O jeito é melhorar um pouco, mas o sistema manda”. Pessoa de sucesso, esse parente acha que Tarcísio seria o melhor nome para 2026.
Entendo os argumentos. Depois de tantas tentativas de endireitar o país, e constatar que vivemos escândalos atrás de escândalos, é quase irresistível adotar a mesma postura de que o Brasil não tem jeito mesmo, e que o máximo com que podemos sonhar é mitigar problemas graves, impedir que vire a Venezuela e se livrar de Lula. Mas Gilmar Mendes sempre estará lá, com os monstros do pântano...
Apesar da tentação de concordar com o prognóstico pessimista, eu me recuso a adotar essa visão mais cínica. Não há nada escrito em pedra afirmando que o Brasil sempre será esse lixo moral. É um problema cultural, institucional, enraizado em estruturas profundas da sociedade e, portanto, muito difícil de mudar. Mas difícil não é impossível.
Eu me recuso a aceitar que a única alternativa é abandonar a moralidade. Há muita gente honesta no Brasil. São esses que possuem a capacidade de mudar nosso destino
Outros países já foram uma porcaria e conseguiram dar a volta por cima. Para tanto, porém, é preciso ter gente “louca” o suficiente para acreditar na mudança para valer, desafiar todo pessimismo de quem já jogou a toalha. É preciso ter um Javier Milei da vida com sua “motosserra” para declarar guerra ao sistema todo.
É praticamente impossível ler O Homem Medíocre, de José Ingenieros, e não pensar na situação caótica do nosso país. No livro, o autor descreve as características presentes numa mediocracia, contrapondo isso à visão de um ideal de perfeição por parte de alguns poucos indivíduos de destaque.
Ingenieros sustenta que é fundamental manter acesa esta chama de um ideal, uma meta visionária que não sucumbe às contingências da vida prática imediata. Esses visionários buscam alguma perfeição moral, emancipando-se do rebanho. São espíritos livres, adversários da mediocridade, são entusiastas contra a apatia. Sem ideais o progresso seria impossível. O culto ao “homem prático”, com foco apenas no presente imediato, representa a renúncia à evolução.
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Na mediocracia, “todos se apinham em torno do manto oficial para alcançar alguma migalha da merenda”. E no Brasil das esmolas estatais, dos vastos subsídios para grandes empresas, das anistias milionárias para intelectuais, do financiamento estatal bilionário para ONGs, o clima predominante não é exatamente este? Não estão todos se vendendo em troca de “migalhas”?
“As artes tornam-se indústrias patrocinadas pelo Estado”. E esse não é o país dos filmes bancados por verbas estatais, fazendo proselitismo para agradar a mão que os alimenta? “Tudo mente com a anuência de todos; cada homem põe preço à sua cumplicidade, um preço razoável que oscila entre um emprego e uma condecoração”. Pensemos nos jornalistas que mudam de acordo com a conveniencia, ou em militares que se vendem a comunistas.
“Ou se instaura a moralidade, ou nos locupletemos todos”, disse Stanislaw Ponte Preta. Eu me recuso a aceitar que a única alternativa é abandonar a moralidade. Há muita gente honesta no Brasil. Lutam contra tudo e todos, contra um sistema podre e carcomido, contra um mecanismo perverso de incentivos. Mas são esses que merecem louvor. E são esses que possuem a capacidade de mudar nosso destino. Não podemos aceitar que Gilmar Mendes será para sempre o ícone de um sistema...





