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Importante alerta de Gustavo Franco: o tamanho do problema
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Em sua coluna de hoje no GLOBO, o economista Gustavo Franco faz um importante alerta ao expor alguns dados da nossa economia. Custos pesados foram ocultados, jogados para baixo do tapete, mas não desapareceram. Voltarão para assombrar a próxima geração, se tanto. Talvez a bomba vá explodir antes mesmo. Seguem os principais pontos:

A crença inabalável em um futuro de opulência, um traço básico de nossa identidade, sempre afastou do brasileiro o medo de se endividar. Diante dos tesouros que existem no subsolo ou no fundo do mar, quem se importa com os termos de troca entre o presente e o futuro, a taxa de juros?

Nessas condições, é gigantesca a preferência pelo consumo hoje, relativamente ao futuro, por que esperar? O crescimento do endividamento familiar nos últimos anos trouxe preocupações com essa psicologia do “aqui-agora”, que pode ser associada ao consumidor de baixa renda, carente em educação financeira, incentivado a comprar e que facilmente se enreda em endividamento excessivo.

A má notícia é que nossas autoridades operam exatamente com a mesma lógica: desde que possam parcelar, qualquer dívida é aceitável.

[…]

Em razão do descontrole dos últimos dois anos, que o governo tenta encobrir com truques baratos de contabilidade, muitos enxergam um sério e perigoso retrocesso. Será que não estamos vendo o problema da dívida pública no seu exato tamanho?

Tipicamente, a primeira pergunta de quem olha a dívida interna é o que exatamente entra na conta, sendo esse o caminho mais comum pelo qual a complacência se intromete na métrica e dela se serve para ocultar o tamanho do problema. A resposta certa deveria ser “tudo”, mas a oficial é que devemos olhar a “dívida líquida”, que está em 35% do PIB, um número típico para um país emergente, não fora o fato de um artifício contábil tirar dessa conta as operações do Tesouro com o BNDES, que elevariam esse número para uns quarenta e poucos por cento.

Outro problema é que o conceito internacionalmente aceito é o de “dívida bruta” que, na metodologia do governo, está em 59% do PIB (incluindo as operetas com o BNDES), um número já não muito consistente com a classificação de risco soberano do país. Os especialistas preferem olhar para a dívida bruta, entre outras razões, porque não há como usar os dólares das reservas para pagar a dívida interna.

Mais outro problema é que as normas internacionalmente aceitas de contabilidade indicam que a nossa dívida bruta é maior: 68% do PIB. O ministro da Fazenda insiste em discordar do FMI nesse assunto, o que é mais ou menos como uma empresa listada questionar uma diretriz internacional de contabilidade.

[…]

É inafastável a reflexão: são anos para consertar, bastam meses para estragar.

Mas ainda não acabou: a previdência do servidor, e algumas outras “despesas de caráter continuado”, como as da saúde, são obrigações que não reconhecemos como dívidas, contrariamente ao que fazem muitos países que capitalizam esses gastos e a eles associam reservas e ativos, às vezes dentro de fundos de pensão. Que tamanho teria a dívida pública se essas contas fossem capitalizadas? Há países à beira de um ataque de nervos com os efeitos do envelhecimento sobre os gastos de seguridade social. Não é o nosso caso, pois uma bomba a uma década de distância é como se não existisse.

A conclusão escapista habitual diante de uma “dívida impagável” é que o problema não é nosso, mas do credor. Porém, nesse caso, o assunto é mais complexo: credor e devedor são a mesma pessoa.

O Brasil é um país de cigarras, que ganhou na loteria chinesa, e gastou por conta. Tenho repetido essa metáfora de forma cansativa, eu sei, mas é porque a ficha ainda não caiu para todos. Principalmente para a equipe do governo. Se a trajetória não for alterada a tempo, teremos sérios problemas à frente. Talvez logo ali…

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