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Whiplash: em busca da perfeição. Ou: Há possibilidade de equilíbrio na genialidade?
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Após a satisfação com as manifestações de domingo, resolvi me conceder um descanso da política e assisti ao filme “Whiplash”. Como alguém que adora jazz e já tocou bateria, sabia que iria gostar do filme, que fala justamente da história de um jovem baterista que almeja nada menos do que a perfeição, e encontra o tutor certo para tal tarefa – ou não. A ambição desmedida do jovem será lapidada pela pressão excessiva e até absurda do maestro, que também não aceita o menor deslize. Em frase memorável, ele diz que não existem duas palavras piores do que “bom trabalho”. O bom é inimigo do perfeito.

O tema do filme é o custo pessoal da genialidade. A história verídica de Charlie Parker dá o tom do enredo: o jovem músico teve um instrumento lançado contra si, quase degolando sua cabeça, ao cometer um erro num festival. Qualquer um poderia ter surtado ali, desistido de tudo, entrado em parafuso. Mas o garoto foi treinar mais e mais, até se superar, até provar que era capaz de executar a música com perfeição. O ataque, que não o matou, tornou-o mais forte. Mas ele era um gênio do jazz.

Os gênios, em suas diferentes áreas, costumam ser obcecados pela superação de seus próprios limites na busca pela perfeição. Mais do que uma escolha, são tomados pela paixão de forma avassaladora, são “escolhidos” pelo destino, por sua vocação que é um chamado irresistível. Não há equilíbrio possível aqui. A família paga um elevado preço, sua vida pessoal é sacrificada, tudo gira em torno do objetivo de se superar e atingir o máximo que for possível no desempenho de sua obsessão. Deixam, por isso mesmo, sua marca no mundo, mas ninguém se importa muito com o custo disso. Ou alguém realmente quer saber se Einstein foi um bom marido e um bom pai?

Claro que levar alguém ao limite dessa forma, exercendo uma pressão insuportável para ver se o gênio finalmente floresce, é algo extremamente arriscado que merece suas críticas. E os tantos defuntos no caminho? E os que sucumbem à pressão e desmoronam? No filme mesmo há o caso de um jovem músico que não aguentou e se matou. Tinha sido aluno do mesmo maestro. Mas, se por um lado a busca desenfreada pela excelência pode parecer exagerada, por outro lado é inegável que o mundo moderno passou a enaltecer a mediocridade. O próprio maestro ridiculariza as novas bandas de jazz gravando músicas para o Starbucks.

Penso no filme “Entrando numa fria maior ainda”, com Ben Stieler e Robert DeNiro, quando este chega à casa dos pais daquele e se depara com um quarto que acumula todos os “prêmios” do jovem filho. Jack, o personagem de DeNiro, solta esta pérola: “Vocês celebram a mediocridade!” O filho tinha chegado num sétimo lugar ou algo assim, e os pais comemoravam, pois “o importante é competir”. Será que não existe um meio termo entre a busca pela excelência e o equilíbrio emocional? Será que a alternativa para não criarmos neuróticos surtados com o mínimo deslize é criarmos medíocres que se vangloriam da própria mediocridade? A geração “mimimi”, afinal, adora ouvir elogios imerecidos, tudo pela “autoestima”.

Creio que, em geral, é possível encontrar um equilíbrio. Estimular a meritocracia, e busca pela excelência, sem deixar de lado a vida pessoal, as amizades, e não se levar tão a sério a ponto de não tolerar a mais banal das falhas. Os obsessivos sofrem mais por natureza, mas mesmo eles precisam aprender a relaxar um pouco, sem que, com isso, caiam na vala comum da mediocridade transformada em conquista, como quer o PT (não deu para evitar o tema política, sinto muito). Tentar melhorar, sempre. Dar o máximo de si, sem dúvida. Mas com algum equilíbrio. Algo que, infelizmente para eles e felizmente para a humanidade, os gênios verdadeiros não conseguem fazer. Só a perfeição os satisfaz.

PS: A performance do jovem ator Miles Teller como o baterista perfeccionista é de tirar o chapéu e prender a respiração. Espetacular. E que solos de bateria!

PS2: Em uma passagem que derruba os relativistas modernos, alguém pergunta ao jovem baterista se tais concursos de música não são subjetivos demais, no que ele responde: “Não, não são”. Nós sabemos quando estamos diante de um verdadeiro gênio, de alguém melhor do que os demais. Mas é politicamente incorreto admitir isso hoje em dia, pois sequer existe essa coisa de melhor e pior; somos todos “apenas diferentes”…

Rodrigo Constantino

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