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Liturgia do cargo não é frescura liberal
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Em editorial neste fim de semana, o Estadão chamou de "falta de decoro" a postura do Bolsonaro diante de um jornalista que lhe perguntava sobre o caso Flavio, e acabou sendo atacado pelo presidente de forma extremamente agressiva.

O jornal reconhece que esse estilo, digamos, direto e espontâneo do presidente tem sido sua marca: "É fato que Bolsonaro transformou sua retórica inflamada e muitas vezes ofensiva em uma marca pessoal, vista por seus apoiadores como sinal de sua 'autenticidade' como político, destacando-se dos demais por ter a coragem de dizer em voz alta, em público, o que os demais não sussurram nem quando estão sozinhos".

É verdade que o povo estava cansado de políticos tradicionais, "certinhos" por puro produto de marketing, falsos como uma nota de três reais. As redes sociais trouxeram maior proximidade, e o consumidor/eleitor passou a valorizar mais a sinceridade.

Além disso, o estilo de Bolsonaro serve para inflamar sua militância agressiva. Porém, dessa vez o caso foi muito além do tolerável até para o grosseiro padrão do bolsonarismo, segundo o jornal: "Nada justifica que o presidente tenha se dirigido a jornalistas da forma como fez, com ofensas ginasianas a respeito da sexualidade de um repórter e do comportamento da mãe de outro". No mais, a reação estridente denota alguma suspeita maior de culpa, como diz o jornal: "Ao agir dessa maneira, Bolsonaro não apenas se apequena como presidente, como dá a entender que está acuado diante das suspeitas que recaem sobre seu filho Flávio".

Erram aqueles que acham que liturgia do cargo é frescura ou algo ultrapassado na era das redes sociais. O jornal conclui: "O decoro no exercício da Presidência não é um capricho; é, antes, a consciência da responsabilidade – e dos limites – de quem conduz os rumos da nação, como chefe de Estado e de governo".

Tudo leva crer que até Bolsonaro percebeu que passou do tom, tanto que no dia seguinte convidou jornalistas para o Palácio e os recebeu de forma descontraída e sorridente. Sobre o caso envolvendo seu filho, Bolsonaro disse: "O processo tá em segredo de Justiça. Tá, né. Quem é que julga, o MP ou o juiz? Os caras vazam e julgam. Paciência, pô, qual a intenção, um estardalhaço enorme, será porque falta materalidade para ele. E que vale o desgaste agora. Quem está feliz com essa exposição absurda na mídia? Alguém está feliz com isso. Agora, se eu não tiver a cabeça no lugar, eu alopro".

Compreende-se o desabafo, mas Bolsonaro precisa se controlar mais. O que alguns não entendem é que quando o presidente xinga um jornalista, pode até levar ao delírio sua claque, mobilizar a militância, erguer uma cortina de fumaça sobre escândalos, mas afasta os moderados. Quer copiar Trump? Mas Trump estaria com maior vantagem se fosse mais contido!

Para copiar mesmo Trump, Bolsonaro antes tem que gerar a menor taxa de desemprego da história, colocar para escanteio o guru nacional-populista radical, e produzir um crescimento acelerado da economia. Aí pode "mitar" mais.

Mesmo assim, repito, Trump estaria nadando de braçada se fosse menos fanfarrão. Sua reeleição corre algum risco justamente porque sua postura exagerada afasta as mães de subúrbio. Compensa para ser ovacionado pela militância fanática?

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