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Projeto para 50 anos

Urbanista que revolucionou NY e Copenhague vai redesenhar Florianópolis

Urbanista que revolucionou NY e Copenhague vai redesenhar Florianópolis
Em Copenhague, há vias expressas para bicicletas, para deslocamentos em maior velocidade, e há um plano para conectar as ciclovias da cidade com as de outras regiões. (Foto: CDL Florianópolis/Divulgação)

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Ao longo dos próximos meses, Florianópolis (SC) receberá representantes do escritório dinamarquês Gehl Architects, do urbanista Jan Gehl, para um estudo que pretende remodelar a área central da cidade nos próximos 50 anos. Meio século parece distante, mas foi o tempo para que Copenhague, antiga cidade portuária, se tornasse referência em urbanismo para o mundo a partir dos anos 1960, com as intervenções do mesmo Gehl.

Na capital catarinense, a consultoria internacional, que já elaborou projetos para cidades como Nova York, São Francisco, Melbourne, Sydney, Moscou e Cidade do México, será financiada pela Associação Comercial de Florianópolis (Acif) e pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Florianópolis (CDL), com a participação de secretarias estratégicas da prefeitura. O trabalho terá ainda a parceria com o Laboratório de Urbanismo e Arquitetura, criado para dar suporte ao time de Gehl no fornecimento de mapas, dados socioeconômicos e informações históricas que contribuam para a elaboração do plano urbano.

"O mundo inteiro olha para Copenhague como exemplo e o Gehl é uma referência mundial. Ele trabalhou na reurbanização de Nova York e na Cidade do México e agora vem contribuir para pensar a Florianópolis que teremos quando ela completar 400 anos (em 2076)", observou o prefeito Topázio Neto (PSD).

O foco do estudo será a área central, entre o Morro da Cruz e a Ponte Hercílio Luz, abrangendo o Centro Histórico, a Passarela da Cidadania e o Centro de Eventos. Com um cronograma de seis meses para ser desenvolvido, o projeto trará conceitos de mobilidade ativa e proporá a ampliação dos espaços públicos com equipamentos que ofereçam gastronomia, lazer e cultura. Servirá como um guia para que as futuras intervenções na cidade sejam conectadas entre si e mantenham o mesmo padrão de qualidade.

"Numa união de esforços entre o poder público e a sociedade civil, estamos fazendo essa contratação para trazer a consultoria do escritório de Jan Gehl para Florianópolis, porque tudo o que se viu lá em Copenhague a gente acha que é possível trazer para Florianópolis, respeitando, logicamente, as nossas características", explicou o presidente da Acif, Célio Bernardi.

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Roteiro por cidades europeias inspirou estudo para Florianópolis

A iniciativa de levar o escritório Gehl Architects para Florianópolis surgiu após a viagem à Europa de líderes representativos de CDL, Acif, Sinduscon, Floripa Sustentável, prefeitura de Florianópolis e empresários. O roteiro incluiu Copenhague, Londres, Lisboa e Coimbra.

"Vimos como os empreendimentos podem transformar o entorno e fortalecer bairros, valorizando as pessoas, gerando oportunidades e melhorando a vida de todos", destacou Eduardo Koerich, presidente da CDL, que apresentou os resultados da missão no início deste mês.

Projeto para Florianópolis vai propor mobilidade ativa e ampliação dos espaços públicos com equipamentos que ofereçam gastronomia, lazer e cultura.

Em Copenhague, o grupo foi acompanhado por um urbanista do escritório de Jan Gehl, que explicou como se deu a transformação da cidade nas últimas décadas. "Nos quatro dias, percorremos a cidade de bicicleta e pudemos perceber o uso democrático dos espaços públicos, com pessoas curtindo as praças, o canal, com equipamentos apropriados. Uma qualidade de vida gerada pelo urbanismo", disse Koerich.

Ainda na capital da Dinamarca, a comitiva teve a oportunidade de conhecer o próprio Jan Gehl, que, no alto dos seus 88 anos, ministrou uma palestra de quase duas horas sobre como as cidades devem ser criadas para as pessoas, tema de seu livro mais famoso. "Para ele, as cidades devem ser construídas para fomentar a interação entre os humanos, devem ser pensadas sob a escala humana, não para a velocidade de um carro", sintetizou o presidente da CDL.

Em Copenhague, há vias expressas para bicicletas, ppropiciando deslocamentos em maior velocidade, e há um plano para conectar em breve as ciclovias da cidade com as de outras regiões. A previsão é chegar a 850 quilômetros de extensão em percursos voltados somente para ciclistas. Além disso, rodovias que antes tinham duas, três e até quatro pistas agora contam com calçadas largas para circulação de pessoas.

"Gehl contou sobre quando uma das ruas de maior trânsito foi fechada para dar lugar a um calçadão, em 1962, e o comércio reagiu de forma contrária à decisão por receio de que o movimento nas lojas caísse. Em pouco tempo, as vendas cresceram 30%", contou Koerich, comparando a medida com a Rua Felipe Schmidt, no Centro de Florianópolis, que foi fechada em 1977 e hoje é a principal área comercial da capital catarinense.

Da agenda internacional, a comitiva elencou a seguinte síntese para o planejamento urbano de Florianópolis:

  • Copenhague: referência mundial em mobilidade ativa e qualidade de vida, tornou-se uma cidade voltada às pessoas após movimentos iniciados na década de 1960, liderados por nomes como Jan Gehl. O fechamento de ruas centrais para carros, a valorização dos espaços públicos e o incentivo ao uso da bicicleta transformaram o comércio e a vida urbana em apenas três décadas.
  • Londres: mesmo sendo um polo financeiro global, vem ampliando áreas de convivência e integrando modais de transporte para se tornar uma cidade mais amigável às pessoas.
  • Lisboa: destacou-se pela política de retrofit e pelos incentivos à requalificação de imóveis, fortalecendo a vitalidade urbana sem abrir mão da memória histórica.
  • Coimbra: apresentou experiência com o BRT, um sistema de transporte coletivo eficiente mesmo em terrenos acidentados, semelhante à geografia de Florianópolis.
Urbanista Jan Gehl com presidente da Acif, Célio Bernardi; prefeito de Florianópolis, Topázio Neto; secretários Ivanna Tomasi e Rafael Hahne, e presidente da CDL Florianópolis, Eduardo Koerich. (Foto: CDL/Divulgação)

Missões internacionais inspiraram revisão do Plano Diretor na capital de SC

O estudo da Gehl Architects, intitulado "Floripa para Todos", será integralmente financiado pela Acif e CDL Florianópolis, sem impacto para os cofres públicos. No entanto, a prefeitura de Florianópolis terá um papel essencial de apoio institucional, participando da construção e do desenvolvimento das propostas.

A execução dos projetos, por sua vez, poderá ser viabilizada por meio da outorga onerosa do direito de construir, um instrumento urbanístico que ganhou força com a revisão do Plano Diretor de 2023 (Lei n.º 739/2023) e que direciona contrapartidas de empreendimentos imobiliários para a criação e a qualificação de espaços públicos.

"O Plano Diretor de 2023 foi pensado para um novo modelo de cidade e, com o retrofit e a outorga onerosa, será possível efetivar projetos como este para que locais que hoje são destinados aos veículos possam ser voltados às pessoas", destacou a secretária municipal de Habitação e Desenvolvimento Urbano, Ivanna Tomasi.

Florianópolis tem se aproximado de Copenhague desde 2018, quando foram feitos os primeiros intercâmbios de arquitetos, urbanistas, representantes da sociedade civil e políticos. Em junho deste ano, Esben Neander Kristensen, sócio do escritório Gehl Architects, esteve em Florianópolis a convite do Laboratório de Urbanismo e Arquitetura para conhecer a realidade local e elaborar um escopo do projeto.

A diretora executiva do laboratório, Tatiana Filomeno, concorda que as missões internacionais serviram de inspiração para a revisão do Plano Diretor de 2023. "Com a nova lei, quem constrói tem incentivos e instrumentos urbanísticos para abrir áreas do lote ao uso público, misturando usos residenciais com comerciais. Isso dá vida à rua, ao lote, aos próprios empreendimentos, mas também traz segurança para que as pessoas possam usufruir dos espaços", avaliou Tatiana.

O atual secretário de Projetos Estratégicos da Prefeitura de Florianópolis, Michel Mittmann, participou de viagens a Copenhague ainda em 2018, quando era diretor do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf). Ele cita o projeto Ponte Viva, na Ponte Hercílio Luz, como um dos frutos dessa relação entre as duas cidades. Principal cartão-postal da cidade, a ponte é fechada para carros nos finais de semana e só pode ser acessada por pedestres e ciclistas.

"Acho que essa consultoria vem em um momento muito propício, porque alcançamos uma maturidade e estamos melhorando nossas metodologias e mecanismos nessa questão do desenho urbano. A cidade está mais preparada, inclusive, do ponto de vista de experiências próprias, com mais dados em mãos", salientou.

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