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À espera de uma vaga em um abrigo, refugiados afegãos moram no aeroporto de Guarulhos
À espera de uma vaga em um abrigo, refugiados afegãos moram no aeroporto de Guarulhos| Foto: Divulgação: Organização de Resgate de Refugiados Afegãos (ARRO)

O GRU Airport – Aeroporto Internacional de São Paulo, conhecido como aeroporto de Guarulhos, é o principal terminal logístico de cargas internacionais do país e traz inúmeros benefícios econômicos para a cidade de Guarulhos, como o desenvolvimento dos negócios e do turismo local.

Se por um lado ele movimenta a economia regional gerando emprego e renda, do outro vem gerando um efeito colateral para a cidade: a chegada de milhares de refugiados do Afeganistão, país que vive uma das piores crises humanitárias do mundo.

Fugindo da extrema pobreza e do conflito político que se acirrou em 2021, com a retirada das tropas dos Estados Unidos e a volta do grupo fundamentalista islâmico Talebã, milhares de afegãos buscam refúgio ou asilo político em outros países.

“Esse é um fluxo muito novo para o Brasil, não existia uma comunidade afegã estabelecida aqui anteriormente. É uma população que começou a chegar sem rede de apoio, então ela tem uma demanda pelo acolhimento”, diz Thais Menezes, oficial de proteção do Alto Comissariado das Nações Unidas (Acnur).

O Brasil é o 21º destino desses refugiados e o aeroporto de Guarulhos, um grande hub que se conecta a todo o país, tem capacidade de receber voos diretos do Irã ou do Paquistão, que ocorrem em aeronaves de grande porte. Em um espaço público dentro do aeroporto, os afegãos vivem mais uma etapa da difícil jornada de recomeçar.

Fugindo do conflito internacional em seu país de origem, eles tentam continuar suas vidas em terra estrangeira, longe de seus familiares, em uma língua que desconhecem e sem um lugar para morar, aguardando por uma vaga em um dos abrigos disponibilizados pelo poder público. Enquanto isso não ocorre, eles se abrigam em barracas de acampamento no aeroporto e ficam durante dias sem conseguir sequer tomar banho.

De acordo com o último dado disponível pelo Ministério das Relações Exteriores, desde 2021 o Brasil autorizou 13.133 vistos de acolhida humanitária para afegãos. Dados do Alto Comissariado das Nações Unidas (Acnur), da ONU, apontam que mais de 6.600 mil afegãos desembarcaram no Brasil. O ano de 2023 concentrou o maior número, de 3.800 pessoas.

“Temos uma expectativa de que 11 mil pessoas virão para Guarulhos, pois elas receberam o visto humanitário brasileiro, mas ainda não chegaram no Brasil. Existe um lapso de tempo entre elas conseguirem o visto e conseguirem se organizar financeiramente para comprar a passagem e chegar aqui”, diz Fábio Cavalcante, secretário municipal de Desenvolvimento e Assistência Social de Guarulhos.

Atualmente uma passagem do Irã ou do Paquistão para o Brasil pode custar entre US$ 1.200 e US$ 4.000 e, muitas vezes, uma família não consegue comprar bilhetes para todos. Cavalcante conta que já ocorreram casos em que, apesar de ser proibido, crianças embarcaram sozinhas. Já no Brasil, elas foram direcionadas para abrigos e ficaram à espera de seus pais.

“Todas as pessoas que chegam precisam de acolhimento. Nosso maior desafio é a imprevisibilidade, não sabemos se chegam 20 ou 60 pessoas. Já acionamos o governo federal por diversas vezes, falamos com o ministério de Relações Exteriores, mas não conseguimos saber efetivamente quantas pessoas vão chegar”, completa Cavalcante.

Barracas de camping no aeroporto de Guarulhos

Depois de um hiato de dois meses sem precisar passar longos períodos no aeroporto devido ao aumento de vagas em abrigos, no início de maio as barracas em Guarulhos voltaram a ficar ocupadas. De acordo com a Organização de Resgate de Refugiados Afegãos (ARRO), 50 pessoas estavam morando no local na primeira quinzena de maio e, nesta quinta-feira (24), eram aproximadamente 20 refugiados afegãos.

Fundada por Shabir Ahmad Niazi, de 22 anos, a ARRO é uma organização não governamental que dá apoio a essa população. Shabir desembarcou no Brasil em novembro de 2022 e precisou morar por cerca de um mês no aeroporto de Guarulhos até ser direcionado para um abrigo em Rio Grande da Serra, na região metropolitana de São Paulo.

“Quando eu cheguei, éramos em 300 pessoas no aeroporto. Tivemos muitas dificuldades principalmente para tomar banho, comer, nos comunicar. Ali não é um lugar apropriado para morar”, disse Shabir à Gazeta do Povo. “Antes era muito pior, agora as pessoas estão sendo mandadas mais rapidamente para os abrigos”, disse ele.

Shabir veio para o Brasil sozinho e deixou para trás o pai, a mãe, uma irmã, um irmão e um sobrinho que ainda não tiveram a mesma sorte de conseguir um visto para o Brasil. “Eles estão tentando vir, mas estão em Teerã (Irã) esperando sair uma nova portaria para conseguirem o visto”, disse ele.

Vagas em abrigos são insuficientes

Desde setembro de 2023, uma portaria interministerial estabeleceu que o governo brasileiro só concederá o visto temporário e de autorização de residência para fins de acolhida humanitária para afegãos caso haja vagas em abrigos.

De acordo com o secretário Cavalcante, o município de Guarulhos possui cinco abrigos que totalizam cerca de 300 vagas para os refugiados afegãos, mas as pessoas também são direcionadas para entidades parceiras do município, como o novo abrigo que foi inaugurado em abril pelo governo do Estado de São Paulo.

Com 150 vagas, a estrutura ajudou a zerar a fila durante dois meses, porém elas voltaram a ocorrer. “A gente assiste com retaguarda de médicos, fraldas, tem uma equipe no aeroporto para fazer o acompanhamento dessas famílias, muitas vezes chegam mulheres grávidas e crianças”, disse Cavalcante.

“Enquanto essas pessoas não são acolhidas e ficam no aeroporto, o município de Guarulhos disponibiliza café da manhã, almoço e jantar, respeitando toda a questão cultural para evitar a violação de direitos, pois eles não comem carne de porco nem carne vermelha. Guarulhos precisou se apropriar da cultura afegã para dar o melhor acolhimento para essas pessoas fugindo de uma situação de guerra”, complementou.

Em resposta a questionamentos da Gazeta do Povo, a prefeitura de Guarulhos informou que recebeu do governo federal um auxílio à situação dos refugiados de R$ 600 mil reais, sendo R$ 240 mil em 2022 e outros R$ 360 mil em 2023. Já os repasses estaduais foram de R$ 4 milhões, sendo R$ 3 milhões para a abertura do acolhimento e R$ 1 milhão para a alimentação dos refugiados no aeroporto.

Cavalcante afirmou que o município de Guarulhos investiu cerca de R$ 1 milhão na criação de vagas e que, em um diálogo recente com o Ministério de Direitos Humanos, a pasta encaminhou um recurso de R$ 5,2 milhões para a abertura de “cursos de português nos acolhimentos, retaguarda de alimentação para as pessoas que estão no aeroporto e a manutenção de 100 vagas de acolhimento na cidade de Guarulhos no período de um ano”.

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