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Para além do imbróglio das últimas semanas envolvendo o serviço de motos oferecido por empresas de transporte de aplicativos e acusações de perseguição a trabalhadores do segmento, o prefeito da maior cidade do país, Ricardo Nunes (MDB), estrutura este segundo mandato municipal tendo como destaque um pacote de privatizações. A proposta, que abrange a venda de empresas municipais, pretende avançar para a ampliação de parcerias público-privadas (PPPs) e o encerramento de atividades de empresas consideradas obsoletas na cidade de São Paulo.
No campo social e de saúde, renova-se a cobrança social para respostas do poder público ao problema histórico da cracolândia na região central. O plano é revitalizar a área, transformando-a em um polo turístico e comercial da capital. Por enquanto, a cracolândia é palco de outra polêmica: a construção de um muro de segregação.
Entre os aliados, Nunes pretende consolidar seu posicionamento ideológico. Conhecido como um político do espectro de centro durante os oito anos que integrou o corpo parlamentar na Câmara Municipal de São Paulo, e na sequência como vice-prefeito de Bruno Covas, Nunes busca se firmar como um representante da ala mais à direita, após ter tido o apoio dos padrinhos Jair Bolsonaro (PL) e Tarcísio de Freitas (Republicanos) nas acirradas eleições municipais de 2024.
Privatizações ganham impulso no 2°mandato de Ricardo Nunes
A Secretaria Executiva de Desestatização e Parcerias, criada em 2019, será reforçada para alinhar a prefeitura de São Paulo à política estadual de privatizações e PPPs que é um dos carros-chefe da gestão de Tarcísio de Freitas. Subutilizada até agora, a secretaria será um dos pilares desta nova gestão municipal.
Entre os primeiros projetos está a privatização das ciclofaixas, implementadas em 2013 na gestão Fernando Haddad (PT), frequentemente criticadas por moradores e especialistas em mobilidade urbana. Também está prevista a terceirização de centros esportivos municipais.
Inspirado na iniciativa do governo de São Paulo para a área da educação, Nunes planeja delegar a manutenção e gestão administrativa das escolas municipais a empresas privadas, enquanto a gestão pedagógica permanecerá sob controle da prefeitura. Além disso, o prefeito planeja reduzir a máquina pública, começando pelo encerramento das atividades da SPTrans.
As funções de fiscalização dos contratos de concessão de ônibus serão transferidas para a Agência Reguladora de Serviços Públicos do Município de São Paulo (SPRegula). “A SPTrans é uma boa empresa, mas podemos aproveitar seus bons profissionais em uma estrutura mais enxuta, sem os custos elevados que temos hoje”, afirmou Nunes em declaração feita em novembro. O anúncio da mudançachega depois de ter vindo à tona a investigação que mira na interferência do crime organizado no transporte público de São Paulo.
Rodrigo Prando, cientista político e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, analisa os desafios das privatizações que estão no horizonte de Ricardo Nunes. “Reduzir o tamanho do Estado e buscar eficiência são ações positivas, mas é importante considerar as críticas feitas durante a eleição, especialmente sobre a concessão de energia e dos cemitérios”.
Cracolândia se mantém como cobrança a Ricardo Nunes
Sob pressão para apresentar soluções efetivas para a cracolândia, o prefeito Ricardo Nunes ergueu um muro de 2,5 metros de altura e 40 metros de extensão na Rua General Couto Magalhães, no bairro Santa Ifigênia. A barreira pretende separar usuários de drogas de moradores e comerciantes. A prefeitura afirma que o número de frequentadores da região caiu significativamente nos últimos anos, de cerca de 4 mil pessoas para 700 usuários, cálculo que é fruto de monitoramento diário com o uso de drones.
Uma tentativa de dispersar os usuários deslocou-os para ruas menos movimentadas, afastando-os de áreas comerciais e residenciais. A medida envolveu operações da Polícia Militar e da Guarda Civil Metropolitana. No entanto, os usuários retornaram rapidamente às regiões centrais, como os bairros da Luz e Santa Ifigênia.
Desde o início de 2024, ações conjuntas entre as forças de segurança municipal e estadual miram na redução do tráfico de drogas no perímetro. Apesar das prisões em flagrante e do patrulhamento em zonas periféricas, crack, cocaína e drogas sintéticas como a K9 continuam chegando em grande escala à região.
Nunes também enviou equipes de saúde e assistência social para abordar os usuários e oferecer tratamento voluntário em alojamentos municipais. Embora respaldada por especialistas, a adesão é baixa: de cada 10 abordagens, apenas uma ou duas pessoas aceitam ajuda, segundo apuração da Gazeta do Povo.
O vice-prefeito de São Paulo, Ricardo de Mello Araújo (PL), foi designado para liderar as ações na cracolândia e, segundo a gestão, faz visitas frequentes à região. Para o cientista político Rodrigo Prando, o problema da cracolândia exige mais do que medidas paliativas. “A questão é complexa e demanda tempo. Soluções como o muro são pontuais, mas representam uma tentativa, ainda que limitada, de oferecer uma resposta à sociedade paulistana”, avalia.
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Alinhamento à direita deve ganhar força em busca de sucessão a Tarcísio
Nunes busca consolidar sua posição no espectro da direita e da centro-direita após o apoio recebido de Tarcísio e do ex-presidente Bolsonaro na campanha pela reeleição. O prefeito pretende reforçar seu alinhamento político e distanciar-se de propostas associadas à esquerda.
Historicamente visto como um político de centro durante os dois mandatos como vereador, Nunes orientou seus secretários a evitarem projetos alinhados à esquerda. Apesar de críticas da direita sobre o espaço cedido na composição do secretariado, vereadores reconhecem como avanço a ausência de nomes ligados à esquerda, como a ex-secretária Marta Suplicy (PT) na gestão anterior.
Segundo apuração da a Gazeta do Povo, Nunes planeja se posicionar como principal sucessor de Tarcísio em 2030. Com dois mandatos como prefeito, ele acredita ser um nome forte para disputar o governo estadual, vislumbrando uma dobradinha com Tarcísio na Presidência e Nunes no Palácio dos Bandeirantes.
Para isso, o prefeito deve utilizar a base aliada para aprovar pautas ideológicas na Câmara dos Vereadores, como projetos pró-vida, repressão a conflitos de território, rejeição à ideologia de gênero e oposição ao uso de câmeras nos uniformes da GMC. Prando avalia que Nunes precisará intensificar o diálogo com o eleitorado de direita.
“Ele não é um bolsonarista raiz, mas deve acenar à direita para consolidar seu espaço. Um secretariado alinhado e posicionamentos sobre temas como câmeras corporais na GCM são passos nessa direção”, afirma o cientista político.
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