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Crianças em um abrigo em Curitiba: Lei de Adoção privilegia a reinserção à família natural | Marcelo Elias/ Gazeta do Povo
Crianças em um abrigo em Curitiba: Lei de Adoção privilegia a reinserção à família natural| Foto: Marcelo Elias/ Gazeta do Povo

Descompasso

Exigência de famílias com relação a perfil da criança dificulta adoção

Além do rigor nos processos de destituição do poder familiar, a demora no processo de adoção também tem como motivo a discrepância entre o perfil das crianças disponíveis e as expectativas das famílias. A maior parte dos pretendentes procura crianças pequenas, da cor branca e sem irmãos. Dos 28 mil candidatos a pais incluídos no Cadastro Nacional de Adoção, 35,2% aceitam apenas crianças brancas e 58,7% buscam alguma com até 3 anos. Enquanto isso, nas instituições de acolhimento, mais de 75% dos 5 mil abrigados têm entre 10 e 17 anos, faixa etária que apenas 1,31% dos candidatos está disposto a aceitar.

Uma barreira difícil de ser superada ainda é a adoção de irmãos. Apenas 18% aceitam adotar irmãos e 35% dos meninos e meninas têm irmãos no cadastro. A lei determina que, caso a criança ou adolescente tenha irmãos também disponíveis para adoção, o grupo não deve ser separado. Os vínculos fraternais só podem ser rompidos em casos excepcionais, que serão avaliados pela Vara da Infância.

Outros fatores são entraves para que uma criança ou adolescente seja adotado, entre eles a presença de algum tipo de deficiência física ou doença grave, condição que atinge 22% dos incluídos no cadastro.

Prazo de 2 anos de permanência é descumprido

A demora na tramitação dos processos, até que a família biológica perca a guarda e a criança seja habilitada para adoção, reduz as chances de acolhimento em um novo lar.

A Lei Nacional da Adoção, aprovada em 2009, fixou em dois anos o tempo máximo de permanência da criança ou do adolescente em um abrigo. Mas, na prática, a demora da Justiça para analisar e decidir cada situação faz com que esse prazo seja extrapolado na maioria dos casos. Muitos adolescentes ficam nas instituições de acolhimento até os 18 anos, quando devem sair para construir as próprias vidas.

A lei também estabeleceu que a cada seis meses a situação da criança que vive em um abrigo deve ser revisada. A instituição produz um relatório sobre a condição das famílias e as tentativas de reintegração com os pais biológicos, avós ou tios e indica se ela deverá ser encaminhada para adoção ou pode voltar para a família de origem.

Apesar de 39.383 crianças e adolescentes viverem em abrigos à espera de serem adotadas, apenas 5.215 estão habilitadas para adoção. Isso representa menos de 15% do total, ou apenas um em cada sete meninos e meninas nessa situação. Isso acontece porque a Lei Nacional de Adoção, de 2009, enfatiza que devem ser esgotadas todas as possibilidades de reintegração com a família natural antes de a criança ser encaminhada para adoção.

Entretanto, a busca pelas famílias e as tentativas de reinserir a criança no seu lar de origem podem levar anos. Segundo juízes, diretores de instituições e outros profissionais que trabalham com adoção, isso faz com que a criança perca oportunidades de ganhar um novo lar. As informações são da Agência Brasil.

"É um engodo achar que a nova lei privilegia a adoção. Em vez disso, ela estabelece que compete ao Estado promover o saneamento das deficiências que possam existir na família original e a ênfase se sobressai na colocação da criança na sua família biológica. Com isso, a lei privilegia o interesse dos adultos e não o bem-estar da criança", avalia o supervisor da Seção de Colocação em Família Substituta da 1ª Vara da Infância e da Juventude do DF, Walter Gomes.

Mas as críticas em relação à legislação não são unânimes. O juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça Nicolau Lupianhes Neto avalia que não há equívoco na lei ao insistir na reintegração à família natural. Para ele, a legislação traz muitos avanços e tem ajudado a tornar os processos mais céleres, seguros e transparentes. "O primeiro direito que a criança tem é nascer e crescer na sua família natural. Todos nós temos o dever de procurar a todo momento essa permanência na família natural. Somente em último caso, quando não houver mais solução, é que devemos promover a destituição do poder familiar", defende.

Destituição

O primeiro passo para que a criança possa ser encaminhada à adoção é a abertura de um processo de destituição do poder familiar, em que os pais poderão perder a guarda do filho. Antes disso, a equipe do abrigo precisa fazer uma busca ativa para incentivar as mães e os pais a visitarem seus filhos, identificar as vulnerabilidades da família e encaminhá-la aos centros de assistência social para tentar reverter as situações de violência ou violação de direitos que retiraram a criança do lar de origem. Relatórios mensais são produzidos e encaminhados às varas da Infância. Se a conclusão for que o ambiente familiar permanece inadequado, a equipe indicará que o menor seja encaminhado para adoção, decisão que caberá finalmente ao juiz.

Uma das novidades introduzidas pela lei – e que também contribui para a demora nos processos – é o conceito de família extensa. Na impossibilidade de a criança retornar para os pais, a Justiça deve tentar a reintegração com outros parentes, como avós e tios.

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