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| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo

A perspectiva de que o julgamento do ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho seja marcado ainda para 2014 já o transforma em um dos principais eventos jurídicos do ano no Paraná. No mês passado, o Tribunal de Justiça do estado decidiu que o Carli vai a júri popular – terá a conduta avaliada por pessoas comuns, não magistrados –, acusado da morte de Gilmar Yared e Carlos Murilo de Almeida em um acidente de trânsito. À frente do processo estão dois dos mais conhecidos advogados do Paraná. René Dotti e Elias Mattar Assad, em lados opostos.

Veja a situação do caso de Carli Filho

Os argumentos jurídicos usados por defesa e acusação formam um capítulo à parte na novela que se tornou o caso. As imagens do sistema de segurança do restaurante, que mostravam Carli bebendo até quase cair, o velocímetro supostamente cravado em 190 quilômetros por hora e as dezenas de multas por excesso de velocidade que cassavam a habilitação do ex-deputado acirraram os ânimos. A pena considerada branda para casos de homicídio culposo – de no máximo 4 anos de prisão – é o pano de fundo da discussão. Até agora, prevalece a alegação de que se trata de homicídio com dolo eventual, quando se assume o risco de matar.

As teses jurídicas estão sendo construídas ao longo dos meses que antecedem o júri – que ainda pode ser evitado, já que a defesa tenta provar na Justiça que este não é um caso para avaliação de jurados. Abaixo, em espaços iguais, confira as alegações dos dois lados. Entenda como a acusação pretende provar que Carli queria "voar" com o carro, enquanto a defesa reconhece a responsabilidade do ex-deputado e pedirá a condenação dele, mas por homicídio culposo.

Defesa pedirá a condenação

Negar a culpa do ex-deputado Luiz Fernando Ribas Carli Filho não está nos planos do advogado René Dotti. Ele pretende pedir a condenação do seu cliente, mas argumenta que Carli Filho deve pagar pelo que realmente fez. Motorista acusado da morte de dois jovens em um acidente de trânsito em 2009, o ex-deputado estaria sendo julgado, na opinião de Dotti, com base em conceitos que escapam ao que está previsto na lei.

O advogado reconhece que Carli Filho estava embriagado e dirigia em alta velocidade, mas rechaça a tese do chamado dolo eventual – quando a pessoa assume o risco de matar. Na visão do criminalista, só em casos de racha ou roleta russa (em sinal vermelho) é que ficaria caracterizado, pela atual legislação, o dolo eventual. A defesa se apoia na tese de que se Carli estivesse disposto a matar é porque também teria assumido o risco de morrer. "Mas não há nenhum indício de que ele buscava a própria morte", comenta.

Preferencial

O advogado ainda reforça que, pelas leis de trânsito, não parar no semáforo intermitente é o mesmo que furar o sinal vermelho. Na opinião de Dotti, não se trata de culpar as vítimas. "Queremos apenas mostrar que os dois lados erraram", diz. Na prática, o argumento da defesa quer dizer que, se Carli estivesse sóbrio, mais devagar e mais perto do ponto de colisão, ainda assim poderia ter acontecido um acidente potencialmente fatal a partir do acesso não calculado a uma via preferencial.

Única testemunha ocular do acidente, o motorista de um carro que estava logo atrás ao das vítimas deve ser a principal arma tanto da defesa quanto da acusação. Em depoimento, ele disse que o carro em que estavam Gilmar e Carlos não parou e que, ao frear na esquina, viu a luz do farol do veículo que estava na pista principal. Dotti alega que o carro do ex-deputado estava entre 120 e 140 quilômetros por hora, bem acima do permitido no local: 60 km/h e abaixo do que diz a perícia, que aponta 173 km/h. "Mas dirigir em alta velocidade não significa consentir em matar alguém", finaliza.

Pena menor

Desde o mês passado, quando o caso foi analisado pelo Tribunal de Justiça do Paraná, o ex-deputado Carli Filho está sujeito a uma pena menor. Até então o processo estava sendo encaminhado como homicídio qualificado. Ao conseguir retirar a "qualificadora" do caso, que agora é tratado como homicídios simples, a defesa diminuiu o tempo máximo de condenação de 30 anos para 20 anos.

Para acusação, Carli agiu como piloto

Segundo o advogado Elias Mattar Assad, assistente de acusação do Ministério Pú­blico (MP), o ex-deputado não apenas guiava seu carro, mas pilotava de forma audaciosa e, por tentar uma manobra, sem importar-se com o resultado, Assad alega que Carli guiou seu Volkswagen Passat como se estivesse em uma pista de corrida, realizando um movimento típico de pilotos profissionais.

"Ele teve um cálculo matemático de piloto. Foi bem para esquerda. Ele pensou que, quando estivesse chegando ao ponto de inflexão da pista [entre o aclive e o declive da pista na Rua Monsenhor Ivo Zanlorenzi], teria de apontar o máximo para direita para dar um salto em linha reta", explica o advogado.

Com essa afirmação, o advogado tenta encerrar uma discussão pela qual tem lutado nos últimos anos. "Ele tentou saltar em linha reta para aterrissar mais adiante. Talvez, ele tenha feito um cálculo que jamais aterrizaria em cima [do veículo das vítimas], talvez ele tenha pensado que até poderia levar o carro pelos ares, por cima", comenta.

Para Assad, Carli Filho cometeu duplo homicídio com dolo eventual. De acordo com o advogado, a perícia realizada pelo Instituto de Criminalística tem um alto grau de exatidão. E explica que a velocidade faz parte de uma conjunção de fatores.

"Temos um fator, a velocidade bem acima do limite admitido por qualquer estrada no Brasil. Há ainda a confissão de que ele ingeriu vinho", explica. Para constatação do dolo eventual, há ainda a manobra, segundo Assad, que comprova que Carli Filho não se importou com o resultado "morte".

Quando o Honda Fit entrou na via rápida havia, naquelas esquinas, sinaleiros piscando a luz amarela. A rua em que o ex-deputado estava era preferencial, um dos argumentos da defesa. "Com o farol amarelo, piscando, não tem preferencial. Não existe preferencial para 173 km/h. Ninguém pode andar no Brasil em rodovia alguma nessa velocidade", reforça Assad.

Para Assad, o motorista do Honda Fit não viu os faróis xenon do veículo Volkswagen Passat, do ex-deputado. O advogado alega que a velocidade do deputado era tamanha que logo chegou próximo ao cruzamento, o que possibilitou que o motorista do veículo que estava atrás do Honda não seguisse adiante.

"Está provado por perícia que os rapazes entraram na via, não viram nada à direita e entraram. Depois, o motorista do segundo veículo olhou e viu o farol", comenta o advogado. Para ele, se o motorista que chegou atrás do Honda Fit na Rua Paulo Gorski percebeu o farol do carro de Carli Filho, é sinal de que o então parlamentar também poderia ter visto os faróis vermelhos do veículo das vítimas.

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