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Motivações

Semelhanças e diferenças com os protestos atuais

Os protestos que tomaram as ruas do Brasil em 2013 também tiveram como estopim um aumento de taxas que afetaria o bolso da população. Tudo começou em São Paulo com o aumento de 20 centavos na tarifa do transporte coletivo. Porém, os protestos de 2013 não foram tão pontuais quanto os registrados no Brasil Imperial.

"Neste ano teve um leque muito mais amplo de reivindicações. Já as registrados no período do Império eram protestos bem mais pontuais, como o registrado em Curitiba contra o imposto estabelecido aos comerciantes", afirma o pesquisador Hilton Costa. Tanto é que tornou-se um dos lemas do movimento do século 21 a frase: "Não é só por 20 centavos". O que começou contra o aumento da passagem de ônibus transformou-se em um grito coletivo que tomou a Avenida Paulista e, posteriormente, invadiu as ruas de diversas cidades do Brasil – inclusive Curitiba e outras cidades do estado. Pedidos por uma reforma política, melhorias na saúde e educação, contra os gastos para a Copa do Mundo de 2014 e punição aos políticos corruptos foram alguns dos cartazes e gritos bradados em 2013.

Outra diferença pontual entre os períodos corresponde à liderança dos movimentos. Em Curitiba, Sérgio de Castro assumiu o posto de líder. Já na manifestação do Rio de Janeiro, a missão coube ao militante republicano, o médico e jornalista Lopes Trovão. "Nos protestos recentes não tivemos uma liderança, alguém que assumisse a responsabilidade pelas manifestações", salienta Costa.

Memória curta

Apesar de ter sido um evento importante para o Paraná, há pouca bibliografia sobre o "Motim do Vintém" nos livros que tratam da história do estado. O pesquisador e historiador Hilton Costa, que cursa doutorado na Universidade Federal do Paraná, relata que há pouca documentação sobre esses protestos dos comerciantes na capital do Paraná. "Esse evento foi pouco divulgado. Há algumas notícias em jornais da época, mas na maior parte das vezes, é tratado de uma forma mais superficial", completa o pesquisador.

Uma multidão toma as ruas de Curitiba em direção à sede do governo. Há enfrentamentos entre policiais e a população civil. Revoltosos são presos e feridos. Tiros são disparados para todos os lados. O cenário bem que poderia ser o dos protestos que tomaram o Brasil em junho deste ano, mas aconteceram durante o período imperial do país.

Entre os dias 27 e 30 de março de 1883, a capital da então província do Paraná virou uma verdadeira praça de guerra. A chamada "Revolta do Vintém" mobilizou a sociedade contra o início da cobrança de impostos sobre a renda dos comerciantes.

Ao perceber que a receita arrecadada pelo Paraná era inferior ao programado no orçamento, o então governador da província, Carlos Augusto de Carvalho, solicitou à Assembleia Provincial que votasse uma lei criando um imposto de 1,5% sobre as rendas. A medida enfureceu os comerciantes. No dia 27, data em que a cobrança entraria em vigor, o comércio curitibano fechou as portas e convocou a população para aderir ao movimento.

No salão Lindermann, situado na Rua São Francisco, houve uma reunião entre o líder do movimento, Sérgio de Castro, e o representante do governo, Manuel Eufrásio. Castro ressaltou que os comerciantes não aceitariam a imposição. Mas Eufrásio foi relutante. O imposto continuaria. "Os impostos variavam de acordo com a renda dos comerciantes e isso enfureceu os ânimos da categoria", salienta o pesquisador e historiador Hilton Costa.

Sem acordo, o governador Carlos de Carvalho ordenou que o 3.º Regimento de Artilharia, o 2.° Corpo de Cavalaria e a polícia provincial fizessem patrulhamento nas ruas da cidade para evitar qualquer incidente. No dia 30, após a realização de um comício, grande parte da população marchou em direção ao palácio do governo. Gritos de ordens ecoaram pelas vias provincianas de Curitiba.

O choque entre o aparato militar e os civis foi inevitável. Postadas à frente dos manifestantes, as forças policiais impediram a progressão da passeata. Mas os rebeldes não se intimidaram. Disparos de armas de fogo tornaram as ruas próximas ao palácio um palco de guerra. Incontáveis pessoas foram feridas e diversas, presas. Um dos detidos foi o líder do movimento. A situação se agravou ao constatar que muitos alemães ficaram feridos ou foram presos. Isso virou um verdadeiro atrito diplomático entre o Brasil e a Alemanha.

Mas, de nada adiantou os gritos contra o imposto criado por Carlos de Carvalho. "Apesar dos protestos que tomaram conta da cidade, o imposto foi mantido", ressalta Costa.

No entanto, o idealizador do imposto foi o grande derrotado da história. Antes, Carlos de Carvalho tinha forte apoio popular, mas a "Revolta do Vintém" foi determinante para que ele perdesse apoio político e a confiança da sociedade. Em maio, ele não aguentou a situação e entregou o cargo ao vice, Antônio Alves de Araújo.

Preço do bonde cria revolta popular no Rio

Antes mesmo da Revolta do Vintém em palco curitibano, um motim de mesmo nome – e que se tornou mais famoso nos livros de História – tomou conta das ruas cariocas. A série de manifestações ocorreu entre 28 de dezembro de 1879 e 4 de janeiro de 1880 contra o aumento das passagens de bonde no Rio de Janeiro. O novo valor correspondia a um acréscimo de um vintém – 20 réis – sobre o valor dos bilhetes do transporte público. "Por isso, transformou-se em Revolta do Vintém. O mesmo nome foi usado em Curitiba anos depois, apesar de no Paraná o aumento do imposto variar conforme a renda da população", explica o pesquisador Hilton Costa. Segundo ele, com um vintém na época era possível comprar 139 gramas de açúcar e 29 gramas de banha. "Não era muito, mas quem usava o bonde, na maioria das vezes, eram pessoas de baixa renda e qualquer elevação de preço já fazia diferença", explica Costa. Os protestos começaram logo após o anúncio do aumento e foram estimulados especialmente pelos republicanos, liderados pelo jornalista Lopes Trovão. Estima-se que cerca de 5 mil pessoas tenham participado dos atos. "Foram várias manifestações. Os revoltosos tombavam os bondes, arrancavam parte dos trilhos, matavam os burros e mulas que puxavam os bondes. Foram várias cenas de violência", relata o historiador. Também ocorreram diversos atos de confrontos com a polícia. O auge do motim se deu na rua Uruguaiana, onde a força policial se uniu ao Exército, e confrontaram-se povo e militares. Segundo a historiadora Neusa Fernandes, no artigo "A Revolta do Vintém", nesse episódio cerca de 4 mil pessoas foram surpreendidas com 600 soldados avançando para as barricadas populares, levantadas com os paralelepípedos das calçadas. "Tiros foram disparados. Houve três mortes e vinte feridos. A cidade do Rio de Janeiro viveu 12 horas de terror", escreveu. Ao contrário de Curitiba, onde o imposto foi mantido, a onda de manifestação fez com que a cobrança do aumento fosse revogada e os principais integrantes do governo ligados de alguma forma aos episódios foram substituídos.

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