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No apartamento de três dormitórios em um condomínio em Santo André, no ABC, o quarto de Henrique de Carvalho Pereira, de 22 anos, continua do mesmo jeito deixado pelo jovem na última vez em que esteve no local, há quase oito meses. Sua residência oficial passou a ser a Unidade de Terapia Intensiva do Hospital das Clínicas, mas a família ainda tem esperanças de que ele volte.

Henrique foi agredido com um taco de beisebol na cabeça dentro da Livraria Cultura do Conjunto Nacional em 21 de dezembro. O interrogatório do acusado será realizado na próxima segunda-feira (16), e o juiz responsável pode dar a sentença no mesmo dia.

A vida da família do jovem, que havia se formado há poucos dias em design, mudou completamente – a sensação de seus pais e do irmão é de que ela parou. A mãe, a professora Silvania de Carvalho Pereira, de 42 anos, segue em licença médica da escola onde trabalhava, e conta com a ajuda de uma psiquiatra e de medicação para conseguir visitar Henrique todos os dias no hospital.

"Hoje eu me sinto mais angustiada do que antes. As coisas parecem estar complicadas. Ele não consegue seguir em um caminho de melhora. São altos e baixos constantes. Tenho ficado menos tempo na UTI. Parece que quanto mais tempo você fica, mais angustiada você fica", diz ela.

O sentimento inicial da família em relação a Alessandre Fernando Aleixo, que agrediu Henrique, foi de ódio. Entretanto, dias após o crime, no Natal, o marido de Silvania reuniu a família e pediu uma mudança de postura. "Ele falou que não queria ninguém alimentando raiva, ódio, vingança, porque isso não vai ajudar o Henrique. Precisamos concentrar nossas energias em pensamentos positivos para ele", conta ela.

A família acompanha o andamento do processo. Elifas, marido da professora, deve ir à audiência marcada para segunda. Eles contam que nunca foram procurados pelos familiares do agressor.

"Eu também nunca quis saber. Acho que o Estado e a Justiça têm que fazer a parte deles. Ele não é uma pessoa normal – uma pessoa normal nunca faria isso. Espero que se faça justiça em relação a isso, porque ele precisa de tratamento, precisa ficar preso. Como pode deixar uma pessoa assim solta? Ele vai aprontar de novo", afirma Silvania. "É uma pessoa digna de dó. Ele estragou a vida do meu filho, mas também estragou a dele. Ele fala que escolheu o Henrique aleatoriamente, não tem sentido o que ele fez."

A defesa e a família do acusado, que continua preso, não foram encontradas para comentar o assunto. A audiência será realizada a partir das 14h desta segunda, no Fórum da Barra Funda, na Zona Oeste da capital paulista.

Evolução

Silvania leva cerca de duas horas para chegar ao Hospital das Clínicas para visitar o filho. São necessárias quatro conduções. Presente todos os dias na UTI, ela recebeu um privilégio – pode ficar com o filho entre 11h e 15h de quarta a domingo, além do horário de visitas, das 16h às 17h.

Henrique é o paciente mais antigo no local. Ele chegou ao Hospital das Clínicas ainda consciente, mesmo tendo levado diversos golpes na cabeça. O rapaz foi atendido rapidamente, mas, após exames, os médicos comprovaram a gravidade do problema. Ele passou por duas cirurgias na mesma noite, e nunca mais acordou. "No início, ele reagia mais, mexia a mão quando pedíamos, se emocionava com músicas. De uns dois meses para cá, eu sinto ele mais distante. Mas as enfermeiras dizem que ele fica mais calminho quando estou lá", diz a mãe.

Recentemente, os médicos fizeram um novo exame para verificar as reações cerebrais do jovem. O resultado abalou a família – nenhuma consciência foi encontrada. "A gente já sabia da gravidade, mas agora desabei", conta Silvania.

Os médicos também tentam fazer com que a válvula colocada na cabeça do paciente para drenar a água que se acumula em seu crânio seja adaptada – já foram quatro tentativas, sempre com problemas. "Essa parecia que ia dar certo, ele ficou uns 20 dias bem, mas agora voltou a entupir. Precisa esperar resolver esse problema para ele poder sair do respirador e ir para o quarto."

Futuro

Apesar da vontade da família de que Henrique saia da UTI – um ambiente agressivo no qual as visitas são restritas –, Silvania teme uma transferência de hospital. Segundo ela, nesses casos, os pacientes são levados para Suzano, na Grande São Paulo. "Não sei como vai ficar nossa vida, é muito longe. A gente quer ele aqui, mas se Deus o quiser, vamos ter que aceitar, e se ele tiver que ficar assim vamos cuidar com todo amor. Espero ter condições de acompanhá-lo."

Ver o filho deitado em uma cama de hospital sem parte do osso do crânio, com traqueostomia, muito magro e sem acordar há oito meses abala a professora, principalmente quando ela lembra do quão ativo Henrique era. "Ele era cheio de sonhos, tinha acabado a faculdade, queria vender um projeto dele. Ele estava fazendo toy arts para vender, queria viajar, fazer cursos. Enquanto estou em casa penso nele feliz, como ele era. É como se ele estivesse fora. No hospital, é a realidade dura e crua. Saio dali arrasada."

O símbolo do talento do designer – a "Vaca de Sampa", exposta na Cow Parade deste ano – é também parte do que o levou ao Conjunto Nacional no dia da agressão. Ele havia ido até a região da Avenida Rebouças para receber seu cachê pela obra e resolveu passar na livraria antes de voltar para casa.

Após a exposição, as peças foram leiloadas – a feita por Henrique foi comprada pela Livraria Cultura, que a doou para a família. O valor pago iria para a Fundação Gol de Letra, que abriu mão da doação e a destinou ao jovem. Agora, enquanto Henrique não acorda, a peça foi emprestada para exposições na faculdade onde o jovem estudou.

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