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Fotografia também ajudou Herica e Alexandra a perceberem que seus bebês haviam sido trocados. Exame de DNA confirmou erro | Bianca Marchini Garmatter/Folha do Litoral
Fotografia também ajudou Herica e Alexandra a perceberem que seus bebês haviam sido trocados. Exame de DNA confirmou erro| Foto: Bianca Marchini Garmatter/Folha do Litoral

Cor da pele fez mães desconfiarem do erro

O dia 1.º de maio não será apenas de lembranças felizes para duas mães de Paranaguá, no litoral do estado. Com diferença de 40 minutos, elas deram à luz no Hospital Paranaguá, mas os bebês foram trocados. Onze dias depois, o erro se confirmou com um exame de DNA. Alexandra Pereira Gomes e Herica Geraldo perceberam a falha por dois motivos: a cor da pele dos bebês e uma fotografia tirada por uma enfermeira durante um dos partos. Alexandra tem família predominantemente branca; já Herica tem traços característicos dos negros. A foto apenas tirou a dúvida.

Até a comprovação da troca, mães e crianças permaneceram no hospital. "No começo, o hospital quis cobrar pelo exame de DNA e informou que a troca não tinha acontecido. Mais tarde, quando o resultado do exame chegou, eles assumiram o erro", diz o mecânico Leonardo Murilo Garcia Gomes, ir­­mão de Alexandra. Segundo a instituição, houve uma falha humana. O hospital informou nunca ter registrado casos envolvendo troca de bebês em seus 32 anos.

Em entrevista ao Terra TV, a coordenadora da Câmara Técnica do Conselho Regional de Enferma­gem de São Paulo, Maria de Jesus Harada, disse que a carga excessiva de trabalho dos enfermeiros é um dos problemas que podem levar a trocas. "Não há falta de profissionais no mercado. O que a gente observa é um número reduzido de profissionais nas instituições, causando a sobrecarga", afirmou.

Procedimentos simples podem evitar o problema. O ideal seria a mãe receber pulseira com nome, data de nascimento e código de barras. Uma pulseira também seria colocada no bebê. "É importante que isso seja feito à frente de toda a equipe e que o lacre não seja violável", diz Maria de Jesus. A Federação Brasileira de Hospitais informa que não existem recomendações às instituições.

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Hoje, o filho de 8 meses de Vítor Hugo e Aline (nomes fictícios) finalmente voltará para casa. Durante dois meses, o casal participou de uma espécie de terapia para se acostumar com a criança e para que ela não estranhe os "novos" pais. A troca aconteceu em setembro do ano passado, no Hospital Mater­nidade Alto Maracanã, em Co­­lombo, e foi confirmada em fevereiro. Outros dois casos semelhantes marcaram o país. Em abril, duas famílias de Goiânia destrocaram bebês após a confirmação do DNA. E em 1.º de maio, no litoral do estado, o Hospital Paranaguá registrou uma troca, mas impediu a saída das mães e das crianças até a confirmação, no último dia 11.

Um acontecimento de tamanha importância não passa incólume à vida das pessoas, sobretudo das mães e dos pais. Em um primeiro momento, as mães rejeitam a possibilidade de troca, pois já se acostumaram com o temperamento da criança. A legislação, entretanto, exige a "devolução" quando a confirmação é realizada. Existe melhor maneira de lidar com a situação? Vítor Hugo, assim como psicólogos consultados pela reportagem, diz que o acompanhamento psicológico foi essencial, auxiliando na aceitação e na criação de vínculo afetivo com o bebê. "É uma situação muito complicada. O acompanhamento psicológico é fundamental", afirma ele.

O que está em jogo nesses casos é o vínculo de apego, mais importante muitas vezes do que a relação maternal/paternal. A fim de facilitar essa aceitação, os psicólogos trabalham, nesses casos, com o conceito de que um novo filho chega – não que o "antigo" parte. "Geralmente, essas mães falam que têm dois filhos. É importante que não haja uma substituição, mas a sobreposição do afeto. E a ajuda psicológica auxilia a entender esse processo", explica Berenice Morozowski, psicoterapeuta especializada em psicologia jurídica. Em Goiânia, apesar de a troca ter se realizado três dias após o resultado do exame de DNA, as famílias estão recebendo auxílio psicológico.

Com o apoio, a rejeição, reação comum por parte dos pais, diminui e se transforma em afeto. Foi assim com Aline e existe a tendência de que seja com a imensa maioria das outras mães. "Toda mãe projeta a imagem de um bebê idealizado na gestação e vê essa criança de forma diferente quando nasce. Por isso a troca é algo tão complexo", comenta Berenice. "Com o passar do tempo, as coisas vão se acomodando. Depois de um luto coletivo, os pais percebem que vão sobreviver, mesmo que a troca seja feita", afirma.

Efeito infantil

Ainda não existem estudos consistentes mostrando a consequência da troca de pais sob o ponto de vista infantil. Psicóloga do Hospital Pequeno Príncipe, Maria Consuelo da Costa esclarece que, quanto mais cedo for realizada, menores serão as consequências. Os efeitos vão depender do modo e da história que as mães vão contar no futuro. "Nossa memória se constrói a partir do que nos contam. Por isso, o sentimento da criança será semelhante à maneira como os pais lidaram com a situação no momento da troca", esclarece Maria Consuelo. As crianças, para ela, têm o direito de conhecer a sua história e, por esse motivo, não se deve omitir as informações.

"No acompanhamento psicológico, é importante trabalhar todas as dúvidas que surgem. Na medida em que se trabalha com essas questões, fica mais simples lidar com o conflito", diz Maria Consuelo. Com o apoio, existe a tendência de que os efeitos para a criança sejam menores. Na maior parte dos casos, as duas famílias criam vínculo afetivo e tentam se manter próximas. Dessa maneira, existe a possibilidade de a criança conhecer e estar ligada aos pais "falsos", facilitando a compreensão. "Não existe um estudo realizado a médio prazo para saber qual será o comportamento dessas crianças no futuro. E seria até invasivo realizá-lo", explica Berenice.

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