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No início da década de 80, o El Niño deixou estragos no Vale do Itajaí, em Santa Catarina, e mexeu com o destino da física Alice Grimm. Diante da imagem da casa de sua família destruída, em Rio do Sul, a então pesquisadora de Ciências Geodésicas decidiu que estudaria o clima a partir dali. Foi longe. Sua pesquisa sobre calor tropical recebeu honras na Universidade de São Paulo e consagrou a cientista.

Hoje, à frente do Laboratório de Meteorologia da UFPR, seu posto de trabalho há cerca de 15 anos, Alice não só "exporta" conhecimento sobre El Niño e La Niña – suas especialidades – como é habituée em publicações científicas internacionais, a exemplo do conceituado Journal of Climate. Seu nome voa. E desembarca em lugares como o Interamerican Institut for Global Change Research (IAI), com o qual tem parceria.

A globalização de sua pesquisa não pára de lhe reservar surpresas. Dia desses, recebeu mensagem de um produtor de açúcar da Austrália, de olho na possibilidade de tirar proveito dos termômetros enlouquecidos e do tobogã a que está sujeita a produção de cana no Brasil. Curiosamente, são raras as propostas de dobradinha com órgãos públicos e com a iniciativa privada paranaense.

Seria caro? Alice nem pestaneja. "Não. Claro que não." Às vezes, conta ela, uma parceria pode ser feita com doação de computadores para os estudantes ligados ao setor. Ou com troca de bolsas de iniciação científica, de graduação, mestrado e doutorado, em valores que variam de R$ 300 a R$ 1,3 mil. A sala pequena e abafada que a cientista ocupa, sem ar-condicionado e apinhada de material, atesta a simplicidade do projeto e escancara um dos fracos das políticas de redução do aquecimento global: elas simplesmente viram as costas para o saber universitário.

Há pesquisas que não vão para a frente simplesmente porque muitas vezes os governos ou parceiros se negam a pagar uma passagem aérea e hospedagem para um pesquisador. "Estudos de variação climática têm de ser intensivos. Caso contrário, corremos o risco de chamar de efeito estufa qualquer ondinha de calor", brinca a física.

A explicação dada por Alice sobre o fenômeno do aquecimento global bem poderia ser transmitida para escolas, empresas ou quem mais tenha ficado com o cabelo em pé ao saber das conclusões do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática. Em mapinhas que deixam leigos no assunto nas nuvens, dá para ver amostragens sobre ondas de calor, chuvas e frio em diversos pontos da América do Sul. Cada imagem é resultado de um modelo de cálculo diferente, do qual resultam as variações médias de temperatura previstas pelos cientistas – no caso, a elevação de 1,8ºC ou 4 ºC em 2100.

O interessante é que são dezenas de modelos e cálculos possíveis. "Esses números não são exatos, dependem do desenvolvimento socioeconômico. Podem ser catastróficos. E nem sempre dá para afirmar que o homem é responsável. O clima tem flutuações muito grandes, inclusive em épocas anteriores à Revolução Industrial. Uma previsão pode não se realizar", explica. Mas, como se sabe, com fogo, não se brinca. (JCF)

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