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Tenho lido alguns ótimos livros que tocam sempre nas mesmas teclas. Começou com Roman­­tismo – uma questão alemã, de Rudiger Safranski (Ed. Estação Liberdade), que especula o quanto o movimento romântico alemão do século 19 criou as raízes políticas do espírito nazista. Em suma, a ideia romântica de romper com a tradição, assimilar um individualismo radical e "criar um novo homem" estaria na base dos movimentos totalitários do século 20.

Outro livro, A beleza salvará o mundo, de Tzvetan Todorov (Difel), estuda três artistas como "aventureiros do absoluto": o inglês Oscar Wilde, o alemão Rai­­­ner Marie Rilke e a russa Marina Tsvetaeva. Se Wilde foi condenado à prisão por homossexualismo e Tsvetaeva sofreu na carne a ditadura soviética, Rilke é lembrado como alguém que considerava Benito Mussolini um líder que "modela a nação italiana da mesma maneira que ele próprio dá forma à língua ou que Rodin trabalha a argila". As opiniões de Rilke, um dos grandes poetas europeus, chegam a ser assustadoras para uma sensibilidade contemporânea, mas eram naturais no seu tempo. Um poeta deve ter direito ao "absoluto". Como morreu em 1926, não pôde conferir no que deu o "absoluto político".

Em Um coração inteligente, o filósofo Alain Finkielkraut (Civilização Brasileira) estuda nove autores marcantes do século 20, discutindo a fronteira moral entre indivíduo e Estado. São ensaios que extraem dos romances uma essência reflexiva, talvez sua vocação contemporânea. Que moral é possível em situações totalitárias? Analisando A brincadeira, de Milan Kundera, ou Tudo passa, de Vassili Grossman, Finkielkraut investiga a ética possível quando se vive sem liberdade. Em outro momento, compara as posições de Albert Camus e de Jean Paul Sartre, ícones populares do chamado movimento existencialista que marcou o pós-guerra. Enquanto Sartre transigia com a violência e o conceito de terror em nome dos valores maiores da revolução, Camus recusava-se em qualquer caso a aceitar o crime como meio político legítimo. Estivessem vivos hoje, Sartre diria que a execução de Kadafi foi um acidente irrelevante num quadro histórico maior, e Camus (por acaso, um argelino) que foi um ato irredimível de barbárie.

Enfim, em O mesmo homem, de David Lebedoff (Difel), uma ideia original se tornou um livro fascinante. Lebedoff compara as vidas de dois escritores ingleses absolutamente diferentes: Evelyn Waugh e George Orwell. O primeiro, um satirista de gênio, foi uma figura aristocrática convertida ao catolicismo; o segundo é o célebre autor de A revolução dos bichos e 1984, um socialista ateu, que, lutando contra Franco na guerra civil espanhola, viu-se condenado à morte pelos stalinistas, escapando por pouco. Mas ambos tinham em comum este ponto fundamental: recusavam o relativismo moral. O que continua sendo uma questão inescapável do nosso tempo.

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