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O filme Feitiço do Tempo, lançado em 1993, conta a história de um repórter de meteorologia designado para fazer uma reportagem em uma cidadezinha interiorana dos Estados Unidos sobre o Dia da Marmota – segundo a tradição, o comportamento desse roedor, ao sair da toca no amanhecer dessa data, indica se o inverno será mais longo ou curto. O jornalista cumpre sua pauta. Mas, nas manhãs seguintes, ele sempre acorda no Dia da Marmota, sendo obrigado a ter de repetir sua obrigação, condenado a passar pelos mesmos eventos indefinidamente.

Embora a tradição do Dia da Marmota seja norte-americana, quem parece viver a maldição do tempo contada no filme somos nós, os brasileiros. Vários problemas que nos afligem se repetem de forma indefinida, demonstrando a incapacidade de nossas autoridades e de nossa sociedade em encontrar soluções duradouras para os desafios que enfrentamos.

Dei-me conta disso ao buscar um fato para comentar hoje. A procura levou-me a um impasse: as principais notícias dos últimos dias reproduzem problemas que não conseguimos erradicar. E que, nos quase dois anos em que escrevo neste espaço semanal, de alguma forma já abordei.

Em 6 de janeiro, comentei sobre as mortes provocadas pelos deslizamentos de terra em Angra dos Reis – fruto da combinação de desrespeito às leis ambientais, descaso das autoridades e chuvas acima da média. O mês terminou com mais mortos devido aos temporais, mostrando que o país não está preparado para enfrentar as cada vez mais intensas tempestades causadas pelo aquecimento global – tema que já havia abordado na coluna de 30 de setembro do ano passado.

A manchete da Gazeta do Povo da última segunda-feira também traz um fato novo a respeito de um antigo problema: janeiro foi o mês mais violento dos últimos dois anos em Curitiba. Apesar de a segurança pública ser a maior preocupação da população há anos, nossos sucessivos governos não têm conseguido enfrentar a violência e dar tranquilidade aos cidadãos.

Nos últimos dias também viraram notícia os trotes violentos de veteranos em calouros universitários. Primeiro foi um caso aqui em Curitiba, na UFPR. Nesta semana, foi a vez de um estudante recém-admitido na Universidade Camilo Castelo Branco, no interior de São Paulo, ter sido obrigado por alunos mais velhos a ingerir álcool combustível. Esse tipo de trote, que acontece ano a ano, é uma barbárie que remonta ao período medieval e que nossa sociedade, em pleno século 21, não conseguiu superar – tema de minha coluna de 25 de fevereiro do ano passado.

Poderia ainda falar sobre a corrupção que não acaba, sobre as promessas dos políticos em ano eleitoral, sobre as deficiências do sistema de saúde, de educação e do transporte público. Mas aí eu já estaria me repetindo demais.

Em tempo: o Dia da Marmota é comemorado em 2 de fevereiro – neste ano, portanto, a festa ocorreu ontem. Espero que hoje, ao acordarmos, não estejamos presos a dilemas que se repetem no tempo.

Fernando Martins é jornalista

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