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A recente polêmica sobre a aprovação automática de estudantes nas escolas públicas paranaenses, sem que tenham conhecimento suficiente para passar de ano, é um debate que transcende o campo da educação. De certa forma, a discussão reproduz um embate entre a esquerda e a direita, ideologias antagônicas que não raramente produzem resultados negativos à sociedade quando se transformam em dogma e passam, portanto, a ser impenetráveis à luz da razão. Transcender o dogmatismo dos dois modelos pode ser a saída para nossa educação pública.

Historicamente, o sistema educacional foi construído para formar mão de obra – uma motivação, obviamente, capitalista. Reproduzindo a concepção do mercado de trabalho, o mérito tornou-se o elemento chave desse modelo: os que apresentam os resultados esperados ou os superam, tanto nas empresas quanto na escola, crescem e avançam.

Mas o sistema educacional de di­­reita, ao longo do tempo, mostrou deficiências. Crianças e jovens que não conseguem acompanhar o ritmo de seus colegas vão ficando pa­­ra trás e, desestimulados pelas re­­provações, abandonam a escola. Es­­sa realidade atinge sobretudo os fi­­lhos das famílias menos abastadas e acaba reproduzindo a pobreza geração após geração, o que é ruim para a sociedade como um todo.

Não é surpresa nenhuma o aparecimento de um modelo de ensino alternativo, à esquerda, baseado na igualdade e na solidariedade, e não no mérito "capitalista". Alunos que não têm desempenho para serem aprovados passam de ano do mesmo jeito que os demais (o princípio da igualdade) e, depois, devem receber aulas de reforço para recuperar o conhecimento não assimilado (a solidariedade).

É sob essa concepção que se assenta a educação do país atualmente. Mas o modelo não foi implantado em sua plenitude no Brasil. Uma das pernas do sistema de ensino público – o apoio para que o aluno recupere o conteúdo perdido – está longe de funcionar. Temos uma educação manca, que está forjando alunos sem preparo e desacostumados à ideia do mérito pessoal – sem a qual enfrentam enormes dificuldades para se adaptar ao competitivo mercado de trabalho.

Tudo isso é reforçado ainda pe­­la concepção genérica, também de inspiração esquerdista, de que a es­­cola deve formar cidadãos e não mão de obra para o mercado – embora a realidade insista em mostrar que é pelo trabalho que se conquista a cidadania plena. Vi­­ve­­mos, portanto, no pior dos mundos: um sistema de esquerda pela metade, que não prioriza o mérito e a educação voltada ao trabalho, numa sociedade capitalista em que os mais aptos é que sobrevivem.

Saber reconhecer as falhas e méritos de cada modelo, sem se apegar às ideologias, é a única forma de tirar a educação brasileira do atoleiro em que se encontra.

Fernando Martins é jornalista.

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