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Postes são objetos banais. Poucos lhes dão grande valor. Mas sustentam luminárias, a fiação elétrica e telefônica e sinais de trânsito. E, assim, ajudam a iluminar, a aproximar os distantes e a guiar os desorientados. O país acaba de deparar com um poste no caminho: aquele ao qual foi preso um adolescente nu no Rio de Janeiro. Nele, simbolicamente há uma luz que pode ser acesa ou apagada, uma placa que indica dois rumos e uma oportunidade de abrir ou encerrar o diálogo de soluções factíveis. O caso do jovem carioca colocou a nação diante dessas encruzilhadas.

Em 31 de janeiro, o adolescente foi espancado por justiceiros, que o acorrentaram ao poste com uma tranca de bicicleta – supostamente por ter cometido crimes. Foi levado a um hospital e, depois, a um abrigo público para jovens em situação de risco. Fugiu no dia 11. Na semana passada, foi detido em Copacabana após assaltar turistas. Acabou sendo contido por banhistas, que lhe deram tapas. O garoto sacou, então, a arma que tinha em mãos, a notoriedade: "Eu sou o do poste! Parem de bater". Foi atendido. Levado à delegacia, se apresentou a um policial: "Você sabe com quem está falando? Eu sou o menor da tranca".

As declarações do jovem mostram que a sua consciência de que a lei o protege é usada para evitar as consequências de seus atos. Não é de hoje que há na sociedade brasileira uma grave distorção entre direitos e deveres. Todos querem benefícios, mas muitos relutam em cumprir normas. A começar pelas altas autoridades, que rotineiramente gozam dos privilégios ao mesmo tempo em que se omitem de suas obrigações – tal como garantir a segurança pública e a efetiva ressocialização de jovens delinquentes.

A omissão do poder público, aliás, tem sido argumento para dar razão à lógica da justiça com as próprias mãos. Porém, o justiçamento nem sequer é eficaz. O caso do adolescente do Rio é um indício disso. As agressões que sofreu não o impediram de cometer novos delitos – do mesmo modo que as mortes de marginais em confronto com a polícia não conseguem conter a escalada da criminalidade. O justiçamento ainda implica a adesão à violência como método. Nesse sentido, não há muita diferença entre os justiceiros e os black blocs. E, onde impera a força, inexiste o diálogo – base da convivência social.

A truculência leva a um beco sem saída, a uma espiral de conflito. A outra trilha, mais longa, conduz à solução coletiva, pactuada, que passa pelo Estado. Nação nenhuma conseguiu se desenvolver prescindindo do aparato estatal. O debate nacional deveria estar centrado na omissão do poder público e nas estratégias para superá-la: pressão popular, voto consciente e vigilância constante da sociedade sobre as autoridades.

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