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 | Foto: Rodolfo Büher / Ilustração: Felipe Lima
| Foto: Foto: Rodolfo Büher / Ilustração: Felipe Lima

De tão curta, a Rua Madre Maria dos Anjos – uma picada de três quadras e meia – confunde até taxistas dos tempos do chofer de praça. É "aquela que começa na Chile e acaba dentro do campo do Atlético", diz-se. Se o sujeito for da Água Verde, com todo o respeito ao Furacão, prefere simplificar informando que é "a rua onde mora o Cláudio – aquele que tem um monte de irmãs".

Segundo o último censo mu­­nicipal, o cidadão Cláudio Mo­­raes e Silva, 57 anos, conta com nove irmãs e um irmão de criação, sendo que nenhum signo do zodíaco ficou descoberto nessa odisseia demográfica. São elas Sueli, Dulcineia, Nanci, Neusa, Lígia, Célia, Cláudia, Odileia e Car­­mem. Todas têm segundo nome, mas esqueçam. O mano é o Júlio, Don Juan que tirou sossego de muitos pais e irmãos da redondeza. Qualquer cabeça a mais nessa conta, firme-se que são primas, amigas, sobrinhas e simpatizantes da grande família.

Para quem acha que uma irmã já dá trabalho – que dirá nove, todas tricotantes – Cláudio informa que é uma questão de organização e método. Ele mesmo aprendeu aos poucos a administrar o RH dos Moraes & Silva Ltda. Seu treinamento começou quando tinha 10 anos de idade, ocasião em que tirou da garagem o Fordeco do seu Joaquim, o pai, e foi buscar uma parteira, "para ontem". Pegou jeito, mas nunca se deixou levar pela rotina escorchante de fraldas e cueiros no varal.

Quando Carminha, a derradeira, nasceu, Cláudio era um ho-­mem feito e tinha mais o que fazer: co­­lo­­cava as manas num Fuque e as levava às matinês da So­­cie­­dade Dom Pedro II. Fazia tudo sem chiar, debaixo dos odores do laquê e com cuidado para não esbarrar num dos 45 dedinhos com esmalte ainda por secar.

Como é um bom cara, dançava com todas para só depois de pelo menos 900 rodopios sair para namorar. Apesar do organograma pouco recomendado pelos ex­­perts do mercado amo­­­roso, casou-se com Sandra, para quem passear de Volks­­wagen com as cunhadas deve ter sido uma experiência extrassensorial.

Joaquim Moraes e Silva trocou alianças com Julieta Colli quando ambos, para os padrões da década de 40, já estavam prometidos a Deus. Mas que nada. Visionário, o aprendiz de químico virou um pequeno industrial. Além de patentear os cafés Liberty e Kiko, inventou temperos instantâneos de fundo de quintal, o Alhomassa, o Sal­­pim e o molho Kit. Os negócios nem sempre iam bem, mas da porta para dentro havia superávit.

Mesmo com idade de corte acima da média, o marido decidiu que teria 12 rapazes – um time de futebol, com reserva – de preferência para jogar no Atlético. Julieta trabalhou pesado pelo progresso esportivo da Nação: amamentou até quase completar 50 anos e chegou a pensar em descer o machado nu­­ma mesa para fazer lenha. Pudera: um cafezinho da tarde em sua casa nunca sai com menos de 40 pães tipo francês.

Embora não tenha dado à luz um craque, merecia ser condecorada pelo Dunga. E pelo ministro Haddad: povoou o mundo de edu­­cadoras. Sete das nove Mo­­raes e Silva trabalharam ou ainda trabalham no Colégio Sion. São moças de fino-trato. Mas não são de ferro. Em dias de jogo na Baixada, acotovelam-se na sacada de um dos seis apartamentos que ocupam no mesmo prédio. Rubro-negras puro-sangue, urram como se fossem os piás sonhados do velho Joaquim.

Bom – o pai se foi em 2001. Julieta, aos 86 anos, nem parece. Ainda fuma seu cigarrinho na janela, "sem tragar". Quanto a Cláu­­dio, andou sem emprego. Foi nada. Deu de olhar a correria das gurias atrás do ônibus. Como nos tempos das matinês, ofereceu-se para levá-las e se tornou motorista oficial de las hermanas Moraes. Começa às 7 horas e não tem hora para acabar. Elas pagam como querem. O ponto é na Rua Madre Maria dos Anjos onde, dizem, agora é Zona da Fifa.

Quero só ver.

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