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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

O assunto desta coluna me rondou a semana inteira. Na segunda, um colega fez um comentário sobre o efeito que a presença de alguém pode ter sobre uma pessoa próxima. Isso me lembrou um programa de rádio que ouvi anos atrás. O nome do programa era algo como "Uma pedra no lago", em referência aquele efeito que tem a pedrinha que a gente joga na água e que vai gerando círculos concêntricos a partir do lugar onde afundou. A cada dia colocavam no ar o depoimento de uma pessoa que falava sobre algo ou alguém que, em determinado momento de sua vida, inspirou-a a seguir um caminho, experimentar algum talento ou agir de determinada forma.

No dia seguinte, outro colega comentou comigo a desilusão que teve quando, repórter em início de carreira, concluiu que suas reportagens não tinham tanto efeito quanto esperava para mudar a situação de coisas que ele retratava. Desilusão comum entre jornalistas. Contra-argumentei que toda informação tem algum efeito: se não é tão forte quanto esperávamos, pelo menos sempre atinge alguém.

Aí vem meu filho me mostrar uma experiência que aprendeu na escola: pega uma caixa de areia do gato (limpa e vazia) e derrama leite e um pouco de Nescau; depois, pinga detergente. A mancha de detergente se espalha lentamente pelo leite causando um efeito bonito e surpreendente. "É isso que acontece com o nosso cérebro quando a gente pensa", diz ele. O pensamento (detergente) se espalha pelo cérebro (leite) de forma aparentemente mágica e vai modificando o meio que percorre.

Como acho que não fui muito convincente com o colega que não via repercussão em suas reportagens, talvez eu tente convencê-lo usando a caixa do gato. Era isso que eu queria dizer para ele — que uma informação nova sempre causa uma reacomodamento dentro do nosso cérebro. Talvez um pequeno reacomodamento, mas as coisas não ficam mais como estavam. É verdade que o fato de oferecermos uma informação (seja na forma de comentário, de texto de jornal, de e-mail ou de um livro que damos de presente) não significa que ela vai ser absorvida. Primeiro ela tem que ser percebida. Se for percebida, desconfio que não passe mais em brancas nuvens.

Esse mecanismo de recepção de informações é estudado à exaustão por pessoas mais bem equipadas que eu. Sou movida menos pelo conhecimento racional e mais pela vontade de acreditar que não falamos com as paredes a maior parte do tempo e que não estamos agindo em uma câmara escura, em que ninguém nos vê. Meu filho de dez anos, com sua experiência científica, foi mais longe e provou por A + B o que eu gostaria de dizer: informação é como detergente no leite achocolatado, como pedra no lago, como sinapse no cérebro. Depois da faísca inicial, nada será como antes.

Marleth Silva é jornalista.

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