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Por uma questão de viagens e prazos que não vêm ao caso, estou escrevendo antes de saber quem é o campeão brasileiro de 2008. Seja qual for o vencedor, ele não servirá a nenhuma tese como as que dividiam o mundo do futebol até bem pouco tempo entre ofensivistas e defensivistas, e se pareciam em bizantinice com a antiga polêmica sobre a natureza dos anjos que dividia o cristianismo. Não se encontrava um técnico de futebol disposto a confessar que era, sim, retranqueiro, mas também não se sabia de nenhum técnico de futebol que cumprisse no campo uma declarada fé em jogar só para frente. Todos falavam um jogo e jogavam outro.

Hoje se fala e se joga o mesmo jogo e ninguém discute a necessidade de no mínimo quatro no meio-campo, cinco para garantir. Antes havia uma divisão entre torcedores apaixonados e analistas que "enxergavam" o jogo com suposta isenção científica e neste caso o paralelo que cabia não era o cristianismo, mas a religião muçulmana, que tem uma doutrina esotérica, chamada "batin", acessível apenas a uma minoria iluminada, e ensinamentos comuns acessíveis a todos os fiéis, chamados "zahir". No futebol, o "zahir" recomendava o evidente: com cinco centroavantes nenhum time precisa de meio-campo. Já a sabedoria do "batin" só fazia uma concessão: dois em vez de um na frente, desde que um volte para marcar. Hoje "zahir" e "batin" vêem quase o mesmo jogo sem discutir.

Como bem sabe o Francis Fukuyama, que anunciou o fim definitivo da História com a vitória do liberalismo sobre o dirigismo econômico justamente quando a História estava preparando o seu reentre, declarações deste tipo são temerárias, mas pode-se dizer que a velha cisão acabou e a doutrina agora é uma só. Ainda se usa eufemismos como "cuidados defensivos" para justificar um meio-campo superpovoado, mas a verdade é que o campeão brasileiro deste ano não jogou muito diferente do segundo colocado – ou do último.

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