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O engenheiro que deu a autorização de funcionamento ao parque em que a jovem Alessandra Aguilar, de 17 anos, morreu, em Vargem Grande, na Zona Oeste do Rio, prestou depoimento à polícia na tarde desta segunda-feira (15) e afirmou que ele não permitiria que seus familiares andassem nos brinquedos e nem ele próprio andaria, segundo informou a delegada da 42ª DP (Recreio) Adriana Belém, que investiga o caso. Ela disse ainda que o engenheiro já responde por uma morte em um outro parque, em Bangu, também Zona Oeste, em 2009.

"Ele disse que não viu nada de irregular. Aí eu perguntei 'o senhor andaria em um brinquedo desse?", ele disse que não. Eu perguntei 'o senhor permitiria que alguém da sua família andasse?' e ele disse que não", afirmou.

"Ele já responde a um procedimento por outro acidente ocorrido na área da 34ª DP, em Bangu, onde ele concedeu o mesmo parecer e houve uma letalidade, houve uma morte. Não é a primeira vez que ele emite um parecer e acontece uma fatalidade", completou.

Ele teria dito em depoimento que nunca respondeu a procedimento policial. De acordo com a delegada, ele afirmou que testou todos os brinquedos, e o problema teria se dado devido a um número maior de pessoas na festa. A autorização concedida pelos bombeiros era para 200 pessoas, mas a polícia afirma que havia cerca de mil pessoas no local.

O engenheiro, de 77 anos, saiu sem falar com a imprensa, pela porta dos fundos da delegacia. Segundo a delegada, ele afirmou que chega ao local com o laudo já pronto e testa tudo em um dia. O preço cobrado por cada laudo é R$ 450, segundo a polícia.

Ele pode responder por falsidade ideológica. "Se houver a constatação efetiva do perito da Polícia Civil de que aquilo não tinha condições, ele (o engenheiro responsável) certamente prestou declaração falsa. Não precisa nem ter habilitação técnica para ver que não tinha condições de funcionar".

Em relação ao caso de 2009, a delegada afirmou que ele deverá ser indiciado. "Creio que ele vai ser indiciado, já falei com a delegada de lá."Operador ouvido

O operador do parque também foi ouvido nesta tarde e, de acordo com a polícia, pode ser penalizado. A delegada contou que ele disse à polícia que foi treinado dois meses antes pelo filho da dona do parque. "Ele disse que recebeu orientações da dona do parque para que ele colocasse até cinco pessoas, quando a capacidade, que a até o engenheiro diz, é de 4 pessoas", explicou Adriana Belém.

Para Adriana, há um grande esquema de corrupção por trás de parques irregulares no Rio. "A leitura que a gente faz disso é que é um verdadeiro comércio. O dono do parque faz contato com o engenheiro e eu não sei como o Crea (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) não consegue fiscalizar uma pessoa que já responde a um procedimento. Ela não pode estar assianando laudos, tem que haver uma punição", disse a delegada.

A polícia afirmou ainda que foi constatado furto de energia no local.Promotores da festa

A polícia também ouviu os organizadores da festa que ocorria no local na hora do acidente. Segundo a delegada, os promotores, que não são da associação de moradores de Vargem Grande, alegaram que procuraram a associação para pedir as autorizações necessárias para a realização da festa. A delegada confirmou que a associação de moradores pediu a autorização para o evento tanto à polícia quanto à prefeitura e receberam permissão.

No entanto, ainda de acordo com a delegada, em nenhum momento os promotores disseram que a festa se daria dentro de um parque. Os promotores disseram que não informaram sobre o parque porque não sabiam que a festa seria no parque. E disseram que os próprios donos do parque teriam se comprometido a pegar as autorizações para a festa, mas não o fizeram.

A permissão foi dada para os quatro finais de semana de agosto. Segundo a polícia, os organizadores da festa também poderão responder pelo crime de falsidade ideológica. Eles afirmaram, ainda, a festa era de cunho social.

Depoimentos

No total, sete pessoas prestaram depoimento nesta segunda-feira. Além de três organizadores da festa, do engenheiro e do operador do brinquedo, a polícia também ouviu duas vítimas. Os feridos levaram mais de 10 pontos na cabeça e têm escoriações pelo corpo. Eles contaram que os próprios usuários do brinquedo que colocavam a tranca do carrinho e ainda que todos estavam sem cinto de segurança.

Oficiais do Corpo de Bombeiros estiveram na delegacia na tarde desta segunda para entregar um documento que retira a autorização emitida pela corporação no dia 3 de agosto.

Para Adriana Belém, o local não tinha condições de obter nenhum tipo de autorização. "Vamos questionar até determinadas autorizações", afirmou. A assessoria do Corpo de Bombeiros alegou que a vistoria do órgão foi feita com base em um laudo técnico realizado por engenheiros.

A delegada afirmou que o fato de o parque ter duas anotações criminais - uma de 2006, quando um jovem de 16 anos morreu, e outra de 2008, quando duas pessoas ficaram feridas - agrava a penalidade.

"Se agrava muito, até porque ela (a dona) prestou depoimento dizendo que nunca tinha havido fato daquela natureza (...) Ela vai ser penalizada por uma conduta mais grave. Eu entendo que ela assumiu o risco de acontecer uma morte, um fato mais grave, quando ela manteve um estabelecimento daquela forma", disse a delegada Adraina Belém.

Donos serão indiciados

A delegada Adriana Belém afirmou que vai indiciar os donos do parque por homicídio doloso, quando há intenção de matar. A decisão de mudar o indiciamento de homicídio culposo para doloso veio depois que uma vistoria feita nesta manhã apontou diversas irregularidades no parque.Irregularidades

Segundo um engenheiro mecânico do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio de Janeiro (Crea-RJ), o brinquedo Tufão, que causou a morte de Alessandra, era o que estava mais mal conservado. Um carrinho se soltou e atingiu Alessandra quando ela estava na bilheteria. Outras oito pessoas ficaram feridas.

Segundo o engenheiro, todos os outros carrinhos também estavam prestes a se soltar. "O carro quebrou. A base dele ficou fixa pelo suporte e ele quebrou por fadiga, por ruptura da parte de fibra de vidro, que nós verificamos em todos os carrinhos, que estão praticamente na mesma iminência desse rompimento que aconteceu", afirmou ele.

O especialista constatou ainda outros problemas, como a instalação elétrica do parque, feita de forma irregular. "Eles fizeram a alimentação da parte elétrica de todo o parque através de um quadro que foi conectado na rede de distribuição sem nenhuma caixa disjuntora, sem nenhum relógio medidor. Normalmente, nós chamamos isso de gato. Foi feita uma instalação improvisada que coloca em risco a segurança de todas as pessoas que estiverem no parque".

Em outro brinquedo, o engenheiro também verificou o desgaste do equipamento. Num terceiro brinquedo, destinado a crianças, o engenheiro também encontrou irregularidades. "Esse local onde as crianças sentam está fixado de forma precária e improvisada no que seria os chassis do veículo. Então, a qualquer momento, pode se soltar e as crianças podem cair, dependendo da velocidade, do peso e da aceleração do brinquedo. E todos os carrinhos estão nas mesmas condições, funcionando de forma precária", enfatizou ele.

Crea-RJ apura responsabilidades

Agora, a Comissão de Análise e Prevenção de Acidentes do Crea-RJ vai se reunir para apurar as responsabilidades pelo acidente. O Crea-RJ quer saber se o profissional que assinou a liberação do parque era habilitado para o serviço.

"Primeiro, vamos verificar se ele tinha habilitação para tal, se era engenheiro mecânico, que é a profissão que pode fazer uma autorização para o funcionamento do parque. Depois, vamos verificar se ele emitiu uma Anotação de Responsabilidade Técnica (ART). Tendo feito esses dois procedimentos, nós vamos seguir em uma investigação para apurar responsabilidade técnica. Ele poderá ser colocado na Comissão de Ética e ser responsabilizado se for apurada a responsabilidade dele por ter emitido a ART para o funcionamento do parque nessas condições que estamos verificando", ressaltou o engenheiro.

O Crea-RJ já sabe o nome do engenheiro mecânico que deu a autorização para o funcionamento do parque. A ART foi emitida no dia 28 de julho para o funcionamento do parque nos fins de semana de agosto. O parque havia funcionado no dia 5 e neste último fim de semana, quando ocorreu o acidente. O engenheiro que deu a ART vai ser ouvido para explicar por que deu a autorização. O parque também tinha uma autorização do Corpo de Bombeiros.EnterroO corpo de Alessandra foi enterrado nesta manhã no Cemitério de Inhaúma, no subúrbio. A mãe de Alessandra, Adriana Barreto da Silva, muito transtornada, gritava "Parque maldito, matou a minha Lelê".

Jovens dizem que 5 estavam em carrinhoDois jovens que estavam no brinquedo que despecou do alto foram ouvidos pelo G1 nesta manhã. Eles confirmaram que cinco pessoas estavam no carrinho. A delegada investiga se o excesso de peso causou o acidente. Segundo ela, o carrinho comporta quatro pessoas. Já ouvido pela polícia, um dos responsáveis pelo parque, afirmou que eram quatro no brinquedo.

"Éramos cinco no carrinho. Eu, o Leandro, o Marlon, o Romário e o Guarabira, que ainda tá internado. O funcionário pegou os ingressos e deixou a gente entrar numa boa. Ele não falou nada. Mudo estava e mudo ficou", contou o auxiliar administrativo Luciano Ferreira dos Santos, de 29 anos.

Com 26 anos, o auxiliar de pedreiro Leandro da Conceição também estava no carrinho. Ele diz que também ouviu um estalo antes de cair do alto. Segundo ele, em nenhum momento o funcionário do parque impediu os cinco jovens de entrarem no brinquedo. "Ele não falou nada".

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