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Utilização de redes sociais

Ao multar Filipe Martins, Moraes deturpa regra ilegal que ele próprio criou

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Filipe Martins foi multado por Alexandre de Moraes em R$ 20 mil por aparecer nas redes sociais de seu advogado em outubro de 2024. (Foto: Montagem: Reprodução/Funag - Rosinei Coutinho/STF)

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A decisão de Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de aplicar uma multa de R$ 20 mil ao ex-assessor da Presidência Filipe Martins distorce o texto de uma medida cautelar que o próprio ministro havia criado.

Segundo Moraes, Martins teria descumprido medida cautelar ao aparecer em um vídeo publicado no Instagram por seu advogado, Sebastião Coelho. No entanto, a decisão original do ministro continha apenas "proibição de utilização de redes sociais" — e não que Martins fosse impedido de aparecer em postagens feitas por outras pessoas.

Para o jurista Fabricio Rebelo, Moraes está flexibilizando o alcance de uma regra que ele próprio criou – e que já é abusiva em si mesma. "A medida cautelar imposta a Filipe Martins foi a de proibição de utilização de redes sociais, e não há nada que aponte ter havido violação a isso, pois a postagem que está sendo utilizada para questionar sua conduta foi feita por terceiro, num perfil alheio a ele", diz.

No vídeo, publicado em 14 de outubro de 2024, Sebastião Coelho aparece ao lado de Martins em frente ao Fórum de Ponta Grossa e comenta as restrições impostas ao cliente. "O Filipe não pode se manifestar em absolutamente nada, ele tem que ficar nessa posição, não pode usar rede social, não pode sair de perto de casa, não pode trabalhar, é uma situação realmente absurda e revoltante", diz o advogado. Martins permanece calado durante toda a gravação.

Mesmo assim, o ministro entendeu que Filipe Martins desrespeitou a decisão judicial ao "contracenar" com seu advogado. Moraes sustentou que o vídeo configura "utilização de redes sociais", e aplicou a multa prevista, além de determinar que Martins preste esclarecimentos em 24 horas, sob pena de conversão da medida cautelar em prisão preventiva.

A interpretação já seria discutível mesmo se a medida cautelar fosse legal. Mas o problema é mais grave: a própria proibição imposta por Moraes – o veto ao uso de redes sociais – é vista por juristas consultados pela Gazeta do Povo como inconstitucional, porque viola garantias fundamentais como a liberdade de expressão e de imprensa.

Segundo Rebelo, a multa a Filipe Martins também desrespeita um princípio básico do direito penal: "Há no Brasil o princípio da intranscendência, que impede alguém de ser responsabilizado pelo que outra pessoa fizer, e isso parece estar sendo flagrantemente desconsiderado neste caso".

A decisão de Moraes também ignora o fato de que nenhum cidadão tem controle sobre o que terceiros publicam nas redes sociais. Sob essa lógica, Martins só pode permanecer em liberdade se não aparecer em nenhum conteúdo postado por terceiros – o que configuraria uma espécie de medida cautelar indireta, que depende dos outros para ser cumprida.

Além disso, o vídeo usado para justificar a multa foi publicado há cerca de seis meses, mas só gerou reação do Supremo às vésperas de um momento importante para a defesa de Martins nos EUA, o que, para Rebelo, levanta suspeitas. "Isso surge meses depois da publicação, justamente às vésperas da oitiva do multado perante a Justiça norte-americana, em um processo que se apura a falsificação de seus registros de entrada no país, exatamente do que se originou sua prisão preventiva", diz o jurista. "Isso torna inevitável se conjecturar sobre a existência de razões não jurídicas para tudo o que vem sendo adotado."

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