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Cidade de Boston foi um dos locais em que a pesquisa foi feita. Estudo indica que passageiros negros ficam mais tempo esperando por serviço | Robbie Shade/Creative Commons
Cidade de Boston foi um dos locais em que a pesquisa foi feita. Estudo indica que passageiros negros ficam mais tempo esperando por serviço| Foto: Robbie Shade/Creative Commons

Em Boston, passageiros com nomes comuns entre homens negros que solicitaram corridas pelo Uber vêm tendo suas corridas canceladas com uma frequência duas vezes maior do que outros passageiros. Negros em Seattle usuários do Uber e do Lyft também precisam lidar com tempos de espera notavelmente maiores para serem atendidos, se comparados com passageiros brancos. Essas descobertas fazem parte de um estudo publicado por pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology (MIT), da Universidade de Stanford e da Universidade de Washington.

“De muitos modos, a economia do compartilhamento é uma coisa pioneira”, disse Christopher Knittle, professor da MIT Sloan School of Management e um dos autores do estudo. “Muito disso é um processo de aprendizado, e não se pode esperar que essas empresas acertem tudo logo de primeira”.

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A nova geração de empresas de tecnologia começou agora a ter de enfrentar o problema de como minimizar a discriminação. O Airbnb recentemente publicou um relatório extenso que estuda a discriminação racial no site e propôs algumas mudanças em suas políticas de uso. A companhia, que oferece aluguel de imóveis, se comprometeu a oferecer mais treinamento aos seus senhorios e a contratar uma equipe de trabalho mais diversificada. Ela mandou e-mails para os clientes no fim de semana dizendo que, a partir do mês que vem, eles precisariam concordar em não discriminar os inquilinos. Mas o Airbnb resistiu às exigências de que fossem removidas da plataforma as fotos dos inquilinos e senhorios.

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No caso dos aplicativos de carona, os pesquisadores acreditam igualmente que os nomes e fotos são um problema. Tais informações dão aos motoristas os meios para discriminar possíveis passageiros. O Uber não mostra a foto dos clientes para os motoristas, mas o Lyft sim, ainda que os passageiros não sejam obrigados a fornecer foto. Ambas as empresas, sediadas em São Francisco, dão o nome dos passageiros aos motoristas.

“Temos um orgulho imenso do impacto positivo que o Lyft teve nas comunidades de negros e pardos”, disse Adrian Durbin, porta-voz do Lyft. “Por causa do Lyft, as pessoas em áreas negligenciadas – historicamente mal atendidas por serviços de táxi – agora têm acesso a corridas convenientes a preços justos. E nós fornecemos esse serviço ao mesmo tempo em que mantemos uma comunidade inclusiva e receptiva, e não toleramos nenhuma forma de discriminação”.

O estudo, conduzido em Seattle e Boston, incluiu quase 1,5 mil corridas. Ao longo de seis semanas, quatro assistentes de pesquisa negros e quatro brancos se dividiram igualmente entre carros solicitados por homens e mulheres. Todos utilizaram suas próprias fotos nos aplicativos. Um segundo teste foi feito em Boston com passageiros “cuja aparência lhes permita viajar como passageiro de qualquer uma das duas raças”, mas usando ou “nomes ligados aos afro-americanos” ou “nomes ligados a brancos”, segundo os pesquisadores. O estudo descobriu que os motoristas do Uber cancelavam desproporcionalmente as corridas dos passageiros com nomes que parecessem de negros, por mais que a empresa penalize motoristas que cancelem corridas demais.

“Os aplicativos de carona paga estão mudando um status quo de transporte cuja desigualdade vem perdurando há gerações, facilitando e tornando mais acessível o deslocamento das pessoas”, disse por e-mail a chefe das operações do Uber na América do Norte, Rachel Holt. “A discriminação não tem lugar na sociedade e tampouco no Uber. Acreditamos que o Uber ajude a reduzir as desigualdades no transporte no geral, mas estudos como este são úteis para pensarmos como podemos melhorar ainda mais”.

A pesquisa também observou a discriminação na indústria de táxi – um problema de décadas e bem conhecido. O artigo não compara as taxas de discriminação entre motoristas de táxi tradicionais ou de aplicativos. O Uber sugeriu que, apesar de muitos motoristas terem pedido que fosse implementado um sistema de gorjetas, eles não pretendem oferecer esse serviço pelo aplicativo, porque um sistema de gorjetas poderia introduzir mais problemas raciais.

O Lyft e o Uber têm questões diferentes diante de si. Apesar das descobertas dos pesquisadores sobre o tempo de espera perceptivelmente maior para os motoristas aceitarem solicitações de corrida de negros em ambos os serviços em Seattle, os tempos de espera totais no Lyft eram os mesmos para ambas as raças. No Uber, eles eram mais demorados para homens negros. Os motoristas que usam o Lyft não cancelam desproporcionalmente as corridas de passageiros negros, mas os pesquisadores afirmaram que, porque o Lyft já mostra os nomes e rostos dos passageiros, eles podem já evitar aceitar corridas de passageiros negros. O Uber não mostra nomes até o motorista aceitar a corrida. “No Lyft é possível discriminar sem precisar aceitar e depois cancelar”, disse Knittel.

Os pesquisadores propuseram as mudanças que tanto o Uber quanto o Lyft poderiam fazer para reduzir a discriminação, incluindo parar de identificar os passageiros por nome, apresentar restrições mais severas para motoristas que cancelarem corridas após aceitá-las e fiscalizar periodicamente o comportamento dos motoristas, procurando padrões racistas. Porém, Knittel reconheceu numa entrevista que há vantagens em se oferecer informações pessoais, como a criação de uma experiência mais amigável e mais eficaz. “Há uma troca aqui”, ele disse. “Há um benefício em mostrar os nomes e as fotos, e, sim, nisso eu acho que podemos concordar. As companhias precisam colocar esses dois efeitos na balança”.

Enquanto conduziam o estudo, os pesquisadores também observaram que passageiras mulheres por vezes eram levadas em rotas significativamente mais longas do que os homens. “Outras passageiras relataram motoristas mais ‘conversadores’, que seguiam por rotas extremamente longas e, em certas ocasiões, chegaram até a passar pela mesma esquina múltiplas vezes. Como resultado, as viagens adicionais às quais as passageiras são submetidas parecem ser uma combinação de exploração e flerte forçado”, escreveram os pesquisadores. O artigo propõe uma solução possível ao problema: calcular o custo da viagem de antemão – algo que o Uber já começou a fazer.

Os autores do estudo, além de Knittel, foram Don MacKenzie, professor assistente da Universidade de Washington; Yanbo Ge, aluno de doutorado da mesma universidade, em Seattle; e Stephen Zoepf, diretor executivo do Center for Automotive Research, em Stanford.

Tradução de Adriano Scandolara

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