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Ao todo, cinco mil tornozeleiras foram contratadas pelo estado a um custo total de R$ 14,4 milhões | André Rodrigues/Gazeta do Povo
Ao todo, cinco mil tornozeleiras foram contratadas pelo estado a um custo total de R$ 14,4 milhões| Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo

A falta de assistência adequada aos presos que utilizam tornozeleiras eletrônicas no estado levou recentemente o Poder Judiciário a interromper novas concessões desse tipo de equipamento, que permite ao detento cumprir pena fora das celas, sendo monitorado a distância pelas autoridades. Como consequência, o número de presos em delegacias e penitenciárias do Paraná vem aumentando. O problema foi detectado depois que o Departamento de Execuções Penais (Depen) do Paraná passou das mãos da Secretaria de Justiça (Seju) para a Secretaria de Segurança (Sesp), em setembro de 2014.

Monitoramento

O juiz Eduardo Fagundes Junior avalia que o monitoramento eletrônico foi bem-sucedido nos primeiros sete meses de implantação. Segundo ele, dos 839 presos com tornozeleiras, 50 teriam cometido algum crime novamente e regredido na pena. “O preso que recebe o equipamento já sabe que vai conseguir o alvará de soltura definitivo. O sistema pode, assim, respirar um pouco”, diz.

Segundo o juiz Eduardo Lino Bueno Fagundes Junior, da 1.ª Vara de Execução Penal (VEP) de Curitiba, cerca de 20% dos presos que usam tornozeleiras eletrônicas acabam buscando as varas especializadas por causa de dificuldades encontradas, principalmente no atendimento telefônico, que deveria ser feito pelo Depen. Entre essas dificuldades estão a resolução de problemas técnicos referentes aos equipamentos e assistência quanto a deslocamentos que os presos precisem fazer.

Sesp diz que ampliou serviços

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública e Administração Penitenciária (Sesp) informou que não houve redução do atendimento aos presos com o benefício das tornozeleiras. Ao contrário, houve ampliação.

Segundo o texto, o serviço “está sendo aprimorado conforme a quantidade de presos que estão sendo colocados sob monitoramento eletrônico”.

Segundo a Sesp, além dos dois telefones que já existiam quando o departamento era administrado na Secretaria de Justiça, com a mudança do Depen de secretarias houve aumento no número de colaboradores e mais uma linha telefônica foi implantada para o atendimento dos monitorados.

Sobre problemas técnicos, diz a secretaria, o sistema detecta em tempo real quando ocorre esse tipo de caso e que, assim que identificados os problemas, ocorrem substituições de equipamentos pela Central de Monitoração Eletrônica e as tornozeleiras com defeitos vão para posterior reparo pela empresa contratada. Ainda de acordo com a secretaria, tratam-se de “questões pontuais e que não têm relação com a transição do Depen para a Sesp”.

A secretaria também esclarece que alertas sonoros, vibratórios, luminosos e contatos telefônicos são emitidos aos apenados com equipamentos, “sendo obrigação do preso entrar em imediato contato telefônico diretamente com a equipe em caso de dúvida”.

“Decidimos suspender a concessão até que o Depen volte a atender o preso para que possamos dar as tornozeleiras com mais segurança”, explica Fagundes Junior. Segundo ele, o Judiciário pretende retomar a concessão nos próximos meses. Ao todo, cinco mil tornozeleiras foram contratadas pelo estado a um custo total de R$ 14,4 milhões. A concessão é feita pela Justiça e o Executivo monitora o preso através de uma empresa contratada para isso. Inclusive, o supervisor do grupo de monitoramento eletrônico, desembargador Ruy Muggiati, deve se reunir nas próximas semanas com representantes da Sesp para discutir melhorias no atendimento e acertar a volta das concessões.

Menos espaço

Segundo o site da Transparência na Gestão Carcerária, o número de detentos nas penitenciárias tem aumentado. O déficit de vagas cresceu no estado na comparação entre abril de 2014 e abril deste ano. No ano passado, em abril, faltavam 428 vagas nos presídios. No mês passado, o número saltou para 1.101. Já a quantidade de detentos nas delegacias caiu em um ano, de 10.087 (em abril de 2014) para 9.873 (em abril deste ano). Porém, ainda há superlotação, pois o número de vagas nas celas dos distritos policiais é de 4.279. Além disso, em geral, os presos não deveriam ficar nas delegacias. Durante o ano de 2014, inclusive, o governo do Paraná anunciou diversas vezes a retirada de todos os presos das delegacias e o fechamento das carceragens.

Na época da implantação das tornozeleiras, o equipamento era visto como forma de reduzir a superlotação nas delegacias e presídios, além de desafogar o sistema que depende da construção de novas penitenciárias.

Superlotação em delegacias chega a três vezes a capacidade

Além do problema que se desenha nas penitenciárias, as delegacias da Região Metropolitana de Curitiba seguem superlotadas. Levantamento realizado pela Gazeta do Povo mostra que, entre os dias 4 e 7 de maio, havia 322 detentos nas delegacias de São José dos Pinhais, Colombo, Campo Largo, Araucária, Pinhais, Piraquara e Fazenda Rio Grande. Porém, se somadas as capacidades das celas de cada distrito, caberiam apenas 124 pessoas, ou seja, quase três vezes acima da capacidade.

O problema mais crônico está em São José dos Pinhais, cuja delegacia comporta 105 detentos para um espaço de 24 presos. Na última semana de abril, uma fuga foi registrada em que 18 detentos escaparam da carceragem. Da mesma forma, quatro presos fugiram da Delegacia de Colombo, que, durante o levantamento, estava com 45 presos, para um espaço destinado a 24 pessoas.

Segundo a Sesp, por semana são abertas pelo menos 100 vagas no sistema penitenciário. Entretanto, os presídios não recebem presos apenas das delegacias, mas também da Polícia Federal (PF), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado). A secretaria ainda afirma que o sistema não recebe somente presos das delegacias da RMC, mas de todo o estado.

O critério para a retirada dos presos das delegacias, segundo a Polícia Civil, é a antiguidade, ou seja, os presos que estão a mais tempo nas celas vão para as penitenciárias e casas de custódia.

Uso de tornozeleiras não é consenso

A utilização da monitoração eletrônica não é consenso na opinião de membros de órgãos que lidam com a situação de apenados do estado. Enquanto a defensora pública e coordenadora do Grupo de Trabalho de Execução Penal, Renata Tsukada, vê má gestão nas penitenciárias, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PR, José Carlos Cal Garcia, crê que o equipamento é útil aos poderes Executivo e Judiciário.

Para Renata, além da falta de vagas e de estrutura adequada nos presídios, o estado carece de políticas públicas na área de execução penal, além de ser alto o índice de prisões preventivas decretadas pelo Judiciário. “Diante da incapacidade em permitir o cumprimento da pena com dignidade, o monitoramento eletrônico é utilizado como forma de “esvaziar” as unidades prisionais e “amenizar” os problemas do sistema carcerário. A monitoração eletrônica é uma saída cara e ofensiva aos direitos dos apenados”, opina.

Já na opinião de Garcia, conforme previsto no Código de Processo Penal, a Justiça pode adotar a monitoração eletrônica como medida cautelar, em casos em que a prisão não se faça necessária. É, segundo ele, uma medida menos invasiva para vincular o acusado ao processo e garantir que não haja fuga do local onde ele está sendo processado. Além disso, lembra, o custo dos equipamentos é dez vezes menor para o Estado na manutenção dos apenados, em comparação com prisões. “Sob esses aspectos, as tornozeleiras são muito importantes, portanto, tanto para o Judiciário quanto para o Executivo”, diz.

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