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No capítulo dos Celtas, detalhe do caldeirão de Gundestrup, mostrando deus com chifres, autor desconhecido (século I a.C.) | Divulgação / Editora Contexto
No capítulo dos Celtas, detalhe do caldeirão de Gundestrup, mostrando deus com chifres, autor desconhecido (século I a.C.)| Foto: Divulgação / Editora Contexto

A separação da ciência e da fé

Somente no século 18 e principalmente nos dois séculos seguintes é que se começa a falar das explicações racionais para o mundo e de que ele não seria uma justificativa apenas da existência de Deus. "A separação de fé e ciência começa no iluminismo. É também neste período que aparece o ateísmo", explica o professor Pedro Paulo Funari. O filósofo iluminista francês Voltaire desafia a Igreja e seus dogmas e já em 1859, quando Charles Darwin publica a obra Origem das Espécies, a ciência começa a ganhar um espaço cada vez mais independente das crenças religiosas. Darwin descreve a evolução das espécies – como surgiram os animais e plantas e como eles evoluíram – sem mencionar Deus. As explicações científicas para a vida são cada vez mais frequentes a partir daí – não por acaso, surgem a Medicina, a Química e a Biologia. (PM)

O livro

Título: As Religiões que o Mundo Esqueceu

Editora: Contexto

Número de páginas: 224

Preço sugerido: R$ 39

Organizador: Pedro Paulo Funari

Autores: Júlio César Gralha, Luiz Alexandre Solano Rossi, Pedro Paulo Funari, Renata Senna Garraffoni, Paulo Nogueira, Júlio César Magalhães de Oliveira, Flávia Galli, Ana Donnard, Johnni Langer, Sérgio Feldman, Alexandre Guida Navarro, Leandro Karnal, Betty Mindlin.

  • No capítulo dos gregos há o Kylix ilustrando o encontro de Édipo com a Esfinge, autor desconhecido (440 a.C.)

Para as populações monoteístas, acreditar em um só Deus é algo natural, inquestionável. Mas a história mostra que nem sempre as religiões foram assim. Povos que cultuavam vários deuses e as suas divindades existiram desde os primórdios da humanidade e servem para mostrar que algo que hoje parece normal pode soar muito estranho para as religiões da Antiguidade. Os gregos tinham vários deuses e todos deveriam ser respeitados: Zeus era um ser supremo, assim como Afrodite ou Vênus, a deusa do amor. E o que dizer das figuras mitológicas dos celtas ou do próprio rio – que para os índios brasileiros, assim como para os astecas e maias, era um ser sobrenatural que tinha até alma. "A história nos mostra que as religiões também influenciaram umas às outras e foram responsáveis por extinguir outras tantas. Ou seja, é algo determinado e não natural", explica o professor Pedro Paulo Funari, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp. Ele e outros 12 pesquisadores lançaram nesta semana o livro As Religiões que o Mundo Esqueceu, uma obra que foi feita para explicar o surgimento de determinadas crenças e lembrar de outras muito interessantes que já desapareceram.

Existem, por exemplo, algumas versões do próprio cristianismo que sumiram com o passar do tempo, principalmente na época das Cruzadas da Igreja de Roma. O bispo católico Arrio – depois excomungado – pregava o arianismo e chegou a questionar a divindade de Deus quando a Igreja começou a falar que Ele era "uno e trino", ou seja, é Pai, Filho e Espírito Santo. Os gnósticos acreditavam em um mundo espiritual em que Jesus não poderia ter sido homem porque era inaceitável que ele tivesse sofrido e sido morto na cruz. Os albigenses, também do cristianismo, valorizavam o que Cristo havia feito e que a ressurreição e a salvação da alma poderiam ser alcançadas sem o intermédio da Igreja. O resultado de todas as seitas foi o mesmo, elas foram consideradas uma heresia.

Adaptações

O livro traz ainda a história das religiões que tinham características bem diferentes do atual monoteísmo. Astecas e maias (do México) e índios brasileiros diziam que os rios tinham alma e eram personagens mitológicos. "Quando a evangelização chegou à América, foi preciso adaptar determinadas crenças. No Brasil, por exemplo, no lugar onde os índios faziam seus cultos foram construídas as igrejas. É uma das maneiras de reprimir e depois fazer com que uma religião desapareça", explica Funari. Mas estes povos também contribuíram com o cristianismo. Como eles tinham o costume de cultuar os mortos, a festa acabou sendo incorporada na religião cristã: hoje a Igreja Católica comemora o dia dos Finados.

As religiões europeias também foram pesquisadas – principalmente a dos celtas e dos vikings. "Os celtas faziam sacrifícios e cultos em torno das árvores e acreditavam em poderes miraculosos. Temos isso bem exemplificado no desenho Asterix e a poção mágica", comenta Funari. A religião dos vikings era baseada em deuses que são guerreiros e fazia uma homenagem ao deus Thor, que mais tarde acabou sendo homenageado pelos americanos, que adaptaram o nome dele a um dos dias da semana, thursday (quinta-feira).

Há ainda os persas, que tinham características que foram adotadas pelo cristianismo: o zoroastrismo criou o Bem e o Mal e isso foi incorporado na forma de Deus e demônio.

Funari explica que não há como saber qual foi a primeira religião do mundo, mas fala que boa parte das gravuras e pinturas rupestres mostra cerimônias religiosas – em que aparece uma pessoa no meio (certamente um feiticeiro) e outras dançando em volta. "Tem ainda figuras de animais que são caçados, provavelmente eram pintados com a crença da força sobrenatural – uma espécie de vudu, onde você desenha o animal caçado para ter forças para conseguir exatamente isso", diz o pesquisador.

* * *

O que era cada uma

Veja abaixo um resumo das principais correntes religiosas citadas no livro As Religiões que o Mundo Esqueceu.

Egípcia

Era obcecada pela perpetuação da alma.

Sumérios

Criaram as primeiras histórias sobre o dilúvio.

Mesopotâmia

Havia a "prostituição" sagrada, onde uma mulher ou um homem ficava no templo dedicado àquela divindade: os crentes poderiam ter relações sexuais com ele ou ela.

Grécia

Os gregos tinham a fertilidade como algo sagrado e, portanto, deveria ser cultuada. Por isso a sexualidade era valorizada.

Maias

Criaram um calendário religioso a partir da observação dos astros e com cálculos matemáticos complexos. Os egípcios são similares aos maias neste caso, quando começaram a construir as pirâmides.

Versões do cristianismo que desapareceram

Gnosticismo

Acreditava apenas no mundo espiritual e enfatizava que Deus (Jesus) não poderia ter sido um homem, porque não se admite que ele tenha sofrido.

Albigienses

Seita medieval que foi considerada uma heresia, porque valorizava os feitos de Cristo, como a ressurreição, que era algo conquistado independentemente da Igreja, assim como a salvação da alma.

Zoroastrismo

É do povo persa e tinha como característica principal a concepção religiosa dualista, que separa o Bem do Mal.

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