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Solenidade de lançamento de uma série de iniciativas voltadas às mulheres, no Dia Internacional da Mulher em 2022.
Solenidade de lançamento de uma série de iniciativas voltadas às mulheres, no Dia Internacional da Mulher em 2022.| Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

O primeiro debate presidencial realizado no dia 28 reacendeu críticas ao presidente Jair Bolsonaro por sua postura em relação às mulheres. Simone Tebet (MDB) e Soraya Thronicke (União), candidatas à Presidência, acusaram o atual mandatário de investir poucos recursos para ações voltadas ao público feminino e de desrespeitar mulheres.

"Ameaça jornalistas, comete misoginia, agride as mulheres brasileiras. (…) Candidato Bolsonaro, por que tanta raiva das mulheres?", questionou Tebet.

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Bolsonaro se defendeu dizendo que seu governo foi um dos que "mais sancionou leis a favor das mulheres", além de garantir o Auxílio Brasil para 15 milhões de beneficiárias. O presidente também destacou programas como o "Qualifica Mulher", que promove ações de qualificação profissional de mulheres em situação de vulnerabilidade social; e o "Mães do Brasil", que promove a saúde e o bem-estar das mães brasileiras. Ao mesmo tempo, o presidente tem repetido que não investe em políticas de promoção do aborto e outras pautas de esquerda.

Para verificar as afirmações dos dois lados, a Gazeta do Povo analisou alguns estudos e dados do Portal da Transparência para comparar as ações e os investimentos do atual governo com os realizados por gestões passadas, como as do PT. Os dados disponíveis, no entanto, são pouco conclusivos. O viés ideológico dos estudos existentes dificulta a análise, e as informações do Portal da Transparência esclarecem pouco a questão, já que nem todos os recursos indicados – tanto na administração de Bolsonaro como nas do PT – foram 100% utilizados. Além disso, as ações em prol das mulheres diferem bastante entre os governos do ponto de vista qualitativo, o que inviabiliza a comparação. Em termos quantitativos, ambos investiram centenas de milhões de reais nas políticas.

Boletim IPEA critica gestão Bolsonaro, mas apresenta viés ideológico

Um dos principais estudos voltados à questão das políticas para mulheres é o boletim IPEA, feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), um órgão governamental. O estudo compara governos e faz críticas à gestão atual da área, mas dá vários sinais de enviesamento ideológico.

Nos últimos 20 anos, segundo o Boletim de Políticas Sociais do IPEA, foram muitas as mudanças e os impactos nos programas voltados às mulheres, mas foi a partir de 2019 – na gestão Bolsonaro – que os maiores desafios se apresentaram, com uma baixa execução orçamentária e poucos resultados efetivos, na visão dos pesquisadores.

"Não apenas institui-se um movimento de desmonte das políticas ainda existentes como se inicia a construção de uma 'nova política para as mulheres', baseada em uma moralidade religiosa, na centralidade da família tradicional nuclear e heteronormativa, no resgate de valores tradicionais de gênero e no embate direto com as pautas e movimentos feministas", diz a pesquisa.

O estudo, que tem teor favorável a pautas do movimento feminista, apresenta os programas e projetos feitos na atual gestão da SNPM – como o Programa Mulher Segura e Protegida, Qualifica Mulher, Maria da Penha vai à Escola, entre outros –, mas diz que "se assemelham a iniciativas de gestões anteriores que possuíam, contudo, nomes distintos".

"É uma estratégia de desvinculação das gestões anteriores e do que estas gestões representaram em termos da moral à qual se deseja 'aderir', de proximidade com as pautas do feminismo e de abrangência das mulheres e de suas famílias", afirma a pesquisa.

Ainda no estudo, os pesquisadores do IPEA apontam que os valores investidos nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro foram os menores desde 2004. "Em 2019 e 2020 foram investidos, em ações especificamente voltadas para as mulheres, pouco menos de R$ 29 milhões em cada exercício. Em 2004, esse valor foi de R$ 22,3 milhões, tendo atingido valores superiores a R$ 100 milhões por ano, ao longo do período 2009-2014, com o 'recorde' cabendo ao ano de 2013, quando foram investidos mais de R$ 190 milhões", diz o documento.

Ao ser questionado sobre a pesquisa do IPEA, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), por meio da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres (SNPM), avaliou que a pesquisa citada, "contém informações incorretas e pouco contextualizadas".

"Os números reais, no entanto, contestam o discurso da pesquisa, considerando que a SNPM empenhou 98% do orçamento em 2020, valor, até então, superior aos 5 anos anteriores. Só no ano passado os investimentos que beneficiaram mulheres com políticas setoriais, de maneira transversal, alcançaram a marca de R$ 236 bilhões", explicou a secretaria.

A secretaria ainda lembrou detalhes de como funciona o processo de execução orçamentária, sobre as fases de empenho e do pagamento efetivo. Alguns entes, afirmou, só recebem o recurso após cumprir todas as etapas normativas previstas no convênio, contrato de repasse ou demais instrumentos legais disponíveis.

"O Ministério realiza o empenho e os parceiros executam as regras legais para recebimento do recurso. Nesse contexto, o MMFDH/SNPM realizou todos os trâmites a que lhe compete", disse.

Dinheiro foi aplicado de acordo com as prioridades de cada gestão

O governo de Bolsonaro diz ter repassado, em 2021, cerca de R$ 236 bilhões para ações voltadas às mulheres, segundo o relatório Mulher no Orçamento, do Ministério da Economia, incluindo dinheiro para igualdade de gênero destinado a outras áreas (saúde, educação, proteção social etc.). Esse valor é contestado pelos seus críticos, tendo em conta que apenas R$ 60 milhões teriam sido investidos exclusivamente pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH). O governo, em sua defesa, diz que sua visão sobre as mulheres é mais ampla do que as pautas concentradas na pasta.

No governo Dilma, os recursos destinados à Secretaria de Políticas às Mulheres no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) cresceram de aproximadamente 75 milhões de reais em 2012 para 182 milhões de reais em 2015. No governo Temer, o orçamento atualizado para as políticas de igualdade e enfrentamento a violência contra as mulheres foi de RS40,1 milhões. No Portal da Transparência não consta o orçamento atualizado de 2016 e 2017 para a Secretaria Nacional das Mulheres.

Sobre os orçamentos anteriores do governo Bolsonaro, o Ministério informou que, em 2019, o orçamento da SNPM, proposto pelo governo anterior, era em torno de R$ 30 milhões. Em 2020, houve um incremento oriundo de emendas que elevou o montante a R$ 126 milhões. "Em 2021, o orçamento foi de R$ 60 milhões, valor que representa o dobro do entregue à atual gestão", diz a pasta, justificando o gasto menor.

Apesar das indicações orçamentárias, o atual governo tem sido bastante criticado por entidades e grupos feministas por supostamente não aplicar os recursos aprovados nas políticas para mulheres. O governo, por outro lado, contesta também estudo realizado pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados, a pedido da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, que mostrava que apenas R$ 5,6 milhões de um total de R$ 126,4 milhões previstos na Lei Orçamentária de 2020 teriam sido efetivamente gastos com as políticas públicas para mulheres. Em relação à execução orçamentária de 2020, o ministério informou que "foi de 98% de um total de mais de R$ 126 milhões, o que corresponde a quase R$ 122 milhões e que em 2021 foi mantida a execução em 98%".

De acordo com a assessoria do ministério, o atual governo conta com dezenas de ações, programas e campanhas voltadas para o público feminino, como o fortalecimento dos canais de denúncias; a entrega de cestas básicas às mulheres vulneráveis; o programa Brasil para Elas que visa a inclusão produtiva da mulher, além do Auxílio Brasil de R$ 1200 para as mães solteiras na pandemia. Entre as ações, também consta a inclusão das operações de enfrentamento à violência contra a mulher no calendário de ações integradas e polícia do Ministério da Justiça. "Em 2022, a Operação Resguardo já efetuou um total de 133 prisões; 21 mandados de busca e apreensão; 607 solicitações de medidas protetivas de urgência; atendimento a 1.872 mulheres vítimas e conclusão de 1.334 inquéritos policiais", informou a assessoria.

Casa da Mulher Brasileira

Uma das ações voltadas para o público feminino de grande impacto tanto no governo petista como no governo Bolsonaro é a Casa da Mulher Brasileira: um centro de atendimento humanizado e especializado no atendimento à mulher em situação de violência doméstica, que reúne em um mesmo espaço vários serviços especializados e multidisciplinares.

A primeira unidade foi inaugurada pela ex-presidente Dilma Rousseff, em 2015, em Campo Grande (MS). Com gestão compartilhada entre a União, os Estados e os municípios, a Casa oferece serviços especializados para vítimas de de violência, com apoio de psicólogos, assistentes sociais, defensores públicos e outros profissionais.

Em entrevista à Gazeta do Povo, no mês de agosto, a diretora do Departamento de Políticas de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres do MMFDH, Grace Justa, informou que existem no Brasil 7 casas em funcionamento - Maranhão, Ceará, Mato Grosso do Sul, Paraná, Distrito Federal, Roraima e São Paulo. "Desde a gestão anterior havia uma tempo fixo de custeio das casas e quando encerra o convênio as casas precisam caminhar sozinhas - 30 casas em andamento e com obra iniciada outras 7", explicou.

Segundo o MMFDH, a Casa da Mulher Brasileira tem recursos empenhados e garantidos para as 30 casas que estão em implementação, somando R$ 101.515.335,97. Desde 2019, a Pasta informou que empenhou R$ 212,8 milhões.

Com base no Portal da Transparência, o orçamento na gestão anterior previsto para a Casa da Mulher Brasileira era de mais de R$144 milhões, sendo que só foram pagos R$24.441.201,60 e empenhados R$68.705.422.

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